Morte às mulheres, viva à fome, por Homero Fonseca

Cartaz aparentemente insano portado por mulher em manifestação direitista contém uma lógica implacável.

Reprodução

Morte às mulheres, viva à fome

por Homero Fonseca

Anda circulando a imagem de uma mulher segurando um cartaz, onde se lê: “Feminicídio, sim! Fomenicídio, não!”

Trocando em miúdos: “matem-se mulheres, não se mate a fome”.

A foto é de 2015, mas a cena caberia perfeitamente nas atuais manifestações golpistas às portas dos quartéis. Os dizeres chocantes refletem a cabeça das pessoas que – com ou sem noção – engrossam o cordão do fremente fascismo brasileiro.

À parte alguma intenção de humor (macabro), há no cartaz ingredientes típicos: irracionalidade, fanatismo, ódio e culto à morte. Mas há também uma lógica, a terrível lógica da exclusão.

A mulher que defende o feminicídio acredita que ela nunca será uma vítima, pois está ao lado dos machistas – potenciais assassinos de mulheres. As vítimas serão as outras as feministas, as petistas, as comunistas. Então, matar (essas) mulheres pode. “Nós” (mulheres conservadoras, brancas, privilegiadas) estamos fora dessa cota.

Já “fomenicídio”, não. A fome não existe, como garantiu Bolsonaro. E, se existe, está entre “eles”: os pobres, os negros, os índios. Que são pobres porque são preguiçosos, querem viver mamando nas tetas do governo (com dinheiro “nosso”, dos impostos que sonegamos, ops fala baixo). Portanto, nada de “fomenicídio”, ou seja, políticas públicas contra a fome. Neoliberalismo em estado puro.

Há menos loucura nas manifestações fascistas do que imagina nossa vã filosofia.

Homero Fonseca é pernambucano, escritor e jornalista, formado pela Universidade Católica de Pernambuco. Foi editor da revista Continente Multicultural, diretor de redação da Folha de Pernambuco, editor chefe do Diario de Pernambuco e repórter do Jornal do Commercio. Foi também professor de Teoria da Comunicação e recebeu menção honrosa no Prêmio Vladimir Herzog de Direitos Humanos do Sindicato dos Jornalistas de São Paulo. Atualmente, dedica-se à literatura e mantém um blog em que aborda assuntos culturais.

O texto não representa necessariamente a opinião do Jornal GGN. Concorda ou tem ponto de vista diferente? Mande seu artigo para [email protected].

1 Comentário

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  1. Mulher que não se acha vulnerável, negro que não se vê discriminado , homossexual que não se vê ameaçado, são apenas cidadãos plenos que sofrem da “síndrome do escolhido”.

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