Urariano Mota
Escritor, jornalista. Autor de "A mais longa duração da juventude", "O filho renegado de Deus" e "Soledad no Recife". Também publicou o "Dicionário Amoroso do Recife".
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No Dia da Mulher, para a brasileira Dilma Roussef, por Urariano Mota

 

Nestes dias de incerteza, de assalto contra o futuro do Brasil, e na vizinhança do Dia Internacional da Mulher, penso que a presidenta Dilma é uma pessoa que bem lembra os dois momentos: as horas de instabilidade e de homenagem.

Escrevi uma vez que havia uma foto de Dilma em que a imagem era bela porque era, e continua a ser verdadeira. Para falar daquela foto seriam necessários muitos artigos definidos em textos, poemas e palavras de ardor e reflexão. Pois na imagem de óculos pesados, em preto e branco, Dilma se unia a outras mulheres que vimos nos malditos tempos de 1970. Eram mulheres de tal altura, que ficamos à beira de cair em novo paradoxo: o de querer que voltem suas pessoas daqueles anos, mas sem a infâmia das circunstâncias e pesadelos daquele tempo. Dilma, em lugar da pura orquídea pura pétala, de cor fresca e fugaz, a Dilma naquela foto real remetia mais à pessoa mesma, de carne e luta, determinada em alcançar um mundo além dos interesses de mocinhas bonitas da classe média, uma superação daquele  que se podia resumir em três cês, como o velho CCC: Carro, Casa e Carreira.  Em preto e branco, como um filme de roteiro de Jorge Semprún, víamos uma Dilma que vislumbramos em 1970, multiplicada em outras à sua imagem e semelhança, que cresciam como guerreiras, e por isso se tornavam mais femininas e apaixonantes.  

Naquele momento em que víamos mulheres à imagem e semelhança de Dilma, nós não podíamos prever, sequer sonhar com o Brasil em que uma delas subiria para a presidência da república. E menos ainda, delírio do sonho dos sonhos, que ela fosse reeleita. Pois como podíamos prever o pássaro que canta agora no jardim, em 1970? Sentíamos apenas os abalos que nos davam pessoas desse fogo, e não sabíamos interpretá-las, porque em nós se misturavam admiração, amor e força além dos limites da própria covardia.

Aquela Dilma em preto e branco, de óculos pesados, era a pessoa e mulher com quem todos crescemos. Ela é uma sobrevivente, como todos nós, como, enfim, todo o povo brasileiro. Como não salvá-la de todos os assaltos das múmias da ditadura? Como não guardá-la, como um bem precioso, contra os velhos de todos os preconceitos de classe? Fazemos isso não por dever, mas por uma defesa da cidadania do nosso sonho.

É nestas circunstâncias que a reencontramos hoje nestes dias de angústia, com uma carga maior de responsabilidade e exigência que os daqueles anos de luta clandestina. Assim imagino e penso. 

Eu já disse uma vez que Dilma era a mulher mais bonita da república do Brasil. Passado o entusiasmo eleitoral, afirmo que ela é uma das mais bonitas.

Então eu falo que Dilma ainda é uma das mulheres mais bonita da República, pois a memória recupera o Brasil dos anos da ditadura como uma superação. Dilma confirma a sua beleza quando afirmou com voz embargada no palanque no bairro de Brasília Teimosa, no Recife:

“Não desisti do Brasil nem quando fui presa e torturada, porque este País é muito maior que um bando de ditadores. Não mudamos de lado, nem de compromisso.”

Lembro também que na fase dura das eleições, quando havia ameaças claras de golpeá-la e de golpear a vontade do povo brasileiro, no Recife as pessoas gritavam, cantavam “Dilma, eu te amo”. Na Avenida Conde da Boa Vista, contente com o engarrafamento de carros que se formava em razão da caminhada com Dilma, o  motorista de um ônibus largou o volante e subiu para o teto. Para quê? De lá de cima, com uma bandeira vermelha, ele dançava ao som de “Dilma, coração valente”.

Naquele dia, Dilma falou na abertura do discurso:

– Eu amo vocês, esta é a primeira coisa que eu queria falar. A segunda coisa é que eu nunca vi na minha vida um ato tão bonito, tão alegre, tão carinhoso como este.

Mas ela poderia falar o que quisesse. Poderia cantar “o cravo brigou com a rosa”, e todos aplaudiriam. Poderia ficar diante do microfone repetindo “sapo-sapo-sapo-sapo”, e o povo iria ao delírio. Diriam, “como ela fala sapo-sapo-sapo muito bem!”. Sabem aquele afeição conquistada, que vê em tudo quanto vem da pessoa amada a coisa mais linda? Mas a presidenta, em lugar de palavras sem nexo, falou:

– Vamos mostrar que este país tem coluna vertebral, tem mulheres de coragem e fé.

Todos a compreendíamos. E respondíamos a ela na língua de imbu, mangaba, graviola, cajá, azeitona, pitomba, abacaxi, goiaba, maracujá, manga, cana doce, numa fala de salada do Nordeste. Mistura de tudo, naqueles dias, que parecem agora tão distantes. Como se fossem e outro século.   

Terá tudo passado e escorrido em vão? Terá toda ternura transitado talvez?

No Dia Internacional da Mulher, neste março mês difícil,  cheio de tormentas, quando o futuro do Brasil balança, mas não como nos extraordinário versos de Castro Alves:

“Auriverde pendão de minha terra,
Que a brisa do Brasil beija e balança,
Estandarte que a luz do sol encerra
E as promessas divinas da esperança”

Não nesse significado, porque o Brasil balança sob o fogo da velha tradição que conspira contra a nossa riqueza material e vontade popular. O Brasil oscila também no movimento para esta direção: presidenta Dilma, nós a queremos de volta. Divida conosco a sua imensa carga. Queremos tê-la como uma ressureição da mulher valente, do coração maior que a razão. Não a queremos na razão que tudo abençoa, porque a coragem já teria sido derrotada.  

E assim termino a tentativa de homenagem, com estas linhas que poderiam ter sido escritas no verso daquele retrato 3x 4 em preto e branco: para  Dilma, digna representante da mulher brasileira, com um forte abraço e admiração.

Áudio na Rádio Vermelho http://www.vermelho.org.br/noticia/260023-35

Urariano Mota

Escritor, jornalista. Autor de "A mais longa duração da juventude", "O filho renegado de Deus" e "Soledad no Recife". Também publicou o "Dicionário Amoroso do Recife".

11 Comentários

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  1. Dia 08, grandes Lutas e grande vitórias.

    História do 8 de março

     

    No Dia 8 de março de 1857, operárias de uma fábrica de tecidos, situada na cidade norte americana de Nova Iorque, fizeram uma grande greve. Ocuparam a fábrica e começaram a reivindicar melhores condições de trabalho, tais como, redução na carga diária de trabalho para dez horas (as fábricas exigiam 16 horas de trabalho diário), equiparação de salários com os homens (as mulheres chegavam a receber até um terço do salário de um homem, para executar o mesmo tipo de trabalho) e tratamento digno dentro do ambiente de trabalho.

     

    A manifestação foi reprimida com total violência. As mulheres foram trancadas dentro da fábrica, que foi incendiada. Aproximadamente 130 tecelãs morreram carbonizadas, num ato totalmente desumano.

     

    Porém, somente no ano de 1910, durante uma conferência na Dinamarca, ficou decidido que o 8 de março passaria a ser o “Dia Internacional da Mulher”, em homenagem as mulheres que morreram na fábrica em 1857. Mas somente no ano de 1975, através de um decreto, a data foi oficializada pela ONU (Organização das Nações Unidas).

  2. blog vai de mal a pior na

    blog vai de mal a pior na marcha da insensatez desespero de causa perdida…

    manipula, pra cima da consciência e inteligência dos “homens de bens comuns”, o dia internacional da mulher, para pregação ideológica do fascista “culto da personalidade stalinista” quando no poder político, nas terras brasilis…

    sem chance!

  3. admirável texto, que

    admirável texto, que simboliza o meu desejo e de muitos

    brasileiros que ainda não perderam a ternura.

    pois é difícil conceber que em menos de tres

    meses tudo tenha se revertido só porque alguns querem…

    e esquecem que há um histórico de doze anos de sucesso

    do projeto de inclusão social que precisa ser respeitado.

    sob pena de voltarmos aos tempos trogloditas em que sequer

    tínhamos o encaixe da boca para dizer alguma coisa.

    1. Admirável e emocionante!

      Parabéns ao Urariano, no belo texto que cala na alma de todos aqueles que conhecem a história, a tenacidade e a lisura dessa bela senhora que é nossa Presidenta!  Essa bela e dígna senhora que há muito luta por todos nós, trabalha muito, e jamais participou do medíocre espaço da Câmara. É um exemplo para todas as Brasileiras nesse dia em que se consagra o Dia das Mulheres. Com certeza, Dilma representa tudo aquilo que se espera das grandes mulheres. Sou DILMISTA com muito orgulho e muito amor!  E que os brasileiros aproveitem a oportunidade única de ter uma pessoa honrada no comando desse nosso país. Com certeza é a primeira e última vez! E repito a frase usada em Pernambuco: DILMA EU TE AMO!  Feliz dia das Mulheres minha PRESIDENTA!    

  4. me lembra uma crônica de Alex (Jornal do Comercio-Recife)

    curta e muito linda. Falava n’ O Dia que não é de Ninguém”, pegando como pretexto o Dia das Mães.

    E um dia será de todos.

    Concordo que o artigo-título acima, desculpa Urariano. Alex morreu há poucas semanas quando foi demitido e foi pra Folha de Pernambuco, que, nalguns aspectos, é o melhor dos 3 jorais de Recife. Já teve o melhor caderno cultural e de entretenimento. Mas a FolhaPE ainda se salva, mesmo … sendo a de menor preço (mais acessível). Tem aas vezes reportagens menos parciais.

  5. A Dilma enquanto mulher e

    A Dilma enquanto mulher e cidadã brasileira merece toda a admiração do mundo. Uma sobrevivente. Nenhum desses coxinhas faz a menor idéia do que é cair nas mãos daqueles sádicos torturadore da ditadura militar. E ele está aí, firm e forte apesar de tudo.

    Na verdade ela está sendo obrigada a achar nela mesma qualidades que ela não tem, isso devido às circinstâncias. A unica coisa que se pede é que mesmo que ela não consiga, que tente. Isso, apesar da teimosia, tenho certeza que fará

    1. Juliano, não chovamos no molhado. Fábula do Elefante.

      evite-se termos como coxinhas (por que não “jovens”, misturados com gente de boas intenções com outros nem tanto?).Termos como este (trol, infiltrado (grupo tão fechado, assm, que afugenta renovação, potenciais participantes). Se forem trolls, que deixem, o pessoal nem liga, nem deve ligar com termos surrados, e, pior, deleitam-se com fáceis apelidos, adjetivos). O pessoal já sabe disso tudo. Bato na mesma tecla com que bati noutras seções: Impedems ou dificultaam, inibem potenciais novos participantes (nem falo nos que jamais NUNCA se manifestam, só assistem, alguns – já vi e já ouvi – até um visitante publicamente me disse pra não entrar em discussões, assistem, ora espantados, ora vendo infantilidades” palavra daquele visitante. de comentários, às vezes muuuitos comentários que nada ou quase nada são pontos-de-vista diferenciados (exceções confirma regra, e são a cereja no bolo, pose pra sermos  democrático, dar um tom do contraditório. Parece uma beatice (termo do Gunter Zibbel) ou Irmandade (termo que uso, e que NÃO são ofensivos, mas apenas gracejos (que nem sempre são entendido assim…). Falta humor no Posts do Dia, a sisudez é confundida com seriedade, ou e às vezes 1 ou 2 comentários – o resto é variação que abunda. Gracejos, deboches, e só ver sob 1 ou 2 ângulos, é como aqulea fábula dos cegos diante de um elefanta, cada um avaliando de uma maneira parcial

        1. escrevo depressa, já comentei isso algumas vezes.

          (não reviso, mesmo se depois me arrependo de revisar, nem deleto. Reconheço que essa pressa é um defeito meu – diferente quando estou noutro momento). O esencial é que me importa.

  6. MINHA HOMENAGEM

     MINHAS HOMENAGEM A DILMA E  A TODAS MULHERES  DE FIBRA E DE CORAGEM. 

    “Frequentemente é necessário mais coragem para ousar fazendo o certo do que temer fazer errado”.

    (Abraham Lincoln)

  7. Acalanto para Dilma

    Bonito Urariano, és um homem sensivel e inteligente. Homenageia todas nos brasileiras, através de nossa presidente. Sei que a presidente precisa dar um passo adiante neste momento e superar as adversidades, que não são poucas. Em todo caso, tenho muito apreço por essa que aprendi a conhecer e desejo toda sorte para ela recuperar seu Governo e mudar de vez o Brasil. 

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