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O dia em que Chico Buarque errou, mas já passou. Por Rui Daher

Chico Buarque, na época, caiu na armadilha ao anunciar que, a pedido de mulheres (quais?) não irá mais cantar “Com Açúcar, Com Afeto”

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O dia em que Chico Buarque errou, mas já passou.

Por Rui Daher

Poucos anos atrás, o compositor, cantor, escritor Chico Buarque de Holanda precisou das redes sociais para saber que não era a aclamada unanimidade nacional.

Não creio que seus olhos verdes verteram lágrimas. Nem que seu intelecto admitiu a má qualidade de suas música e poética, já transmutadas à eternidade da cultura popular brasileira.

Poderia, mas não o fez. Preferiu atribuir o ego desgostoso aos subdelegados de quem, hoje em dia, na presidência da República, afronta a veracidade das urnas que o elegeram, em 2018. Ogros.

Países, para se entenderem como democráticos, rendem-se a conviver, até mesmo patrocinarem, movimentos identitários que recomendam produtores de cultura e cidadãos comuns afrontarem segmentos da população não adequados às maiorias brancas ocidentais, principalmente, aqueles que, em diferentes intensidade e crueldade foram vitimizados por dominação, colonização e imperialismo.

Ou não? Vá você, hoje, retireiro de leite, que mora numa casinha à luz de lampião e velas em um hectare de latifúndio no semiárido nordestino, em barraco vizinho a um bar de chacina do complexo do Alemão, no Rio de Janeiro, nas taipas ao lado de esgoto a céu aberto que margeiam as magníficas avenidas das orlas de grandes cidades litorâneas ou, mesmo, “deplomados”, que moram nos guetos de luxo paulistanos ou diplomados que moram nas três torres, divididas em mil cubículos, piscina, quadra de tênis e, quarto de empregada, dirigir-se a grupos estigmatizados e fodidos pela história ou maldade humana como “japinha”, “negão”, “gostosa”, “judeuzinho”, “turco da 25 de março”, “baiano”, “gordão”, “carcamano”, “bicha”, “sapatona”.

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O cardápio é vasto e o revide imediato.  Diante disto, o Chico como, provavelmente, outros grandes escritores, escolheu arregar ao politicamente correto, embora empobrecendo a língua portuguesa.

E, olhem, saudosos leitores e leitoras, que este ínfimo blogueiro está desde cinco de novembro de 2021 sem publicar neste BRD, sem saber se vivos estão.

 Não que eu esteja repetindo o parolado por tantos. As posições pró-identitárias criam, ao revés, um racismo de negros contra brancos. Não creio. Dou a mínima. Metaverso, Deus me livre.

A língua e a literatura portuguesas, em suas vertentes lusófonas, formigueiro de gírias, são fortes o bastante para deixar o papo rolar livre. Viu mano, parça, tá ligado, chapa, mina (obrigado, Emicidas, Browns).

Chico Buarque, na época, caiu na armadilha ao anunciar que, a pedido de mulheres (quais?) não irá mais cantar “Com Açúcar, Com Afeto” (1967) por ser uma canção machista.

Na época a própria Nara pediu que Chico compusesse para ela “uma música de mulher sofredora”.

Ele cumpriu. A seguir seu “arrependimento”, metade do cancioneiro brasileiro que fala de mulheres sofredoras teria que ser banida da cultura popular. Não só. De homens sofredores também.

O País se embrutece e emburrece. Há pouco tempo, certa cantora sertaneja, falecida em acidente aéreo, foi aclamada como a “Rainha da Sofrência”, pois defendia ser ela, e não machos, quem decidia amor e sexo em motéis de limitado luxo e canções de pequena extração sertaneja de raiz (caipira, cf. Antônio Cândido, in “Parceiros do Rio Bonito”).

Ao ceder, Chico comete, antes de tudo, um desrespeito com Nara Leão, que estaria completando 80 anos de idade (ver documentário). No mais, um atentado contra tudo o que se escreveu na língua portuguesa, fossem em prosa ou poesia, realidade ou ficção, que implique em relações de amor.

Retomo o último tema aqui escrito. Como datado. E se não mudar de ideia e a cervical permitir, volto a falar da “Sofrência” feminina. Mas a de Elza Soares.

Inté!

Rui Daher – administrador, consultor em desenvolvimento agrícola e escritor

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3 Comentários

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  1. Talvez Chico não quisesse entrar em bola dividida, dar pano pra a manga à patrulha, como também em vez de interpretar interpretar o personagem criado, cantar na própria pele o que pensa. Se entre o ataque e a retranca, preferiu o meio de campo, o cabeça da área não evitou o gol contra para a alegria da torcida que festeja o quepe na primeira divisão enquanto o timão vai pro rebaixamento…

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