Urariano Mota
Escritor, jornalista. Autor de "A mais longa duração da juventude", "O filho renegado de Deus" e "Soledad no Recife". Também publicou o "Dicionário Amoroso do Recife".
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O futuro neste ano que se inicia, por Urariano Mota

por Urariano Mota

Para que lado sopra o futuro? Essa pergunta não é vã nem abstrata. Ela quer apenas dizer, na inquietação de cada um de nós: qual será o nosso destino nos dias que ainda não vivemos? 

Houve um tempo em que o futuro era a paz idílica, sentimental, onde todas as feras passeavam ao lado de mansas ovelhas. Esse futuro passou. Houve um tempo em que o amor era a resposta certa para toda baixeza humana.  Passou. Houve um tempo ainda em que a simples visão da flor, da orquídea, da cornucópia de pétalas nos jardins, deixava o peito cheio de um sentimento de felicidade, a ponto de suavizar o semblante, de amolecer os músculos, de fazer úmidos os nossos olhos. Esse tempo se foi.  Então, que futuro nos resta? Que paraísos são possíveis? Ou para que inferno o vento sopra?

Os jovens mais sensíveis e angustiados nos perguntam sempre: o senhor acha que ainda é possível uma ditadura de generais no Brasil?  – Não sei, não sabemos, é o que nos vem. Quem sabe é o vento, dá vontade de responder. Mas só o dizer “não sei” para eles é motivo de espanto. Entendemos a razão. Os jovens confundem cabelos brancos com sabedoria. Talvez nem saibam que os idiotas também amadurecem, sem crescimento da experiência. Talvez nem percebam que esse pesadelo do golpe militar nos acompanha todas as noites, como uma amada de sinal invertido.

Quem sabe? As possibilidades por vezes se transformam por obra de um absurdo acaso. Dizem os incrédulos: nenhum homem é serpente, o animal que adivinha terremoto com antecedência de 5 dias. Pois lhes respondo, para melhor fortalecimento do diagnóstico de loucura: o homem é mais fino e arguto que as serpentes, até no veneno. Olhem por quê.

A depender do que se deseja no mundo, o futuro é bem conhecido. Por exemplo, um político esperto, pragmático, não se pergunta para que lado sopra o futuro. Ele se diz, “gozemos o presente”. Agora, carpe diem, porque o amanhã é hoje. Muito melhor dizendo, o futuro será aquilo que ele consiga arrancar do poder neste momento, em todos os momentos. Ou em linguagem mais vulgar, o futuro é a construção do seu patrimônio, agora.

Porém há os mais sensíveis que as melhores serpentes. Estes se perguntam qual a tendência, para que melhor se preparem e venham a subir na crista da onda. O futuro para estes – observem a medida do ofídio – varia no intervalo de breve tempo.  Para onde vai o mar, que onda se anuncia ou se forma sob a superfície no horizonte? Que ideias e bandeiras estarão em voga nesse futuro? Eles se perguntam, perscrutam o tempo, e a resposta nem sempre é certa, porque o movimento que se apresenta aos olhos nem sempre mostra o subterrâneo, que virá com força adiante. Então vem esta lição. Lembram-se do cardeal Richelieu, que mandou dobrar os sinos ao fim de uma revolta, sem saber para quais vitoriosos tocava? O vencedor, não importava quem, pensaria que os sinos o saudavam.

No entanto nós,  sem o talento dos adivinhadores das tendências do poder que virá, desejamos da realidade futura algo diverso e de menor peso. Queremos apenas saber como o nosso destino será inscrito no destino de toda a humanidade nos próximos dias. Se o futuro que se quis se faz no presente, se o futuro imediato se faz ao fim deste presente fugaz, então o mais longe, que bem desejamos, não será feito sem a intervenção da nossa vontade. Vontade ativa, que vai além do perguntar à rosa dos ventos para que lado sopra o futuro.

Nós já estamos na humanidade. Iremos para onde ela for. Para nossa desgraça ou felicidade, nem tão rápido, nem tão prematuro. Quem sabe, talvez com um sentimento de alegria a perturbar nosso íntimo, mais uma vez, se encontrarmos o perfume do jasmim em novo dia.

Publicado no Diário de Pernambuco http://www.impresso.diariodepernambuco.com.br/app/noticia/cadernos/emfoco/2017/01/02/interna_emfoco,160663/o-futuro-neste-ano-que-se-inicia-o-que-nos-resta.shtml

Urariano Mota

Escritor, jornalista. Autor de "A mais longa duração da juventude", "O filho renegado de Deus" e "Soledad no Recife". Também publicou o "Dicionário Amoroso do Recife".

4 Comentários

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  1. o futuro…..

    caro sr. o futuro é aquilo que não existe. Espera por ser criado. E estamos na pátria que vive do passado, não aprende com ele e quer levá-lo ao futuro. Até alguns meses não exisitia Lava Jato. Hoje parece que toda história brasileira está determinada numa única Vara Judicial de um único juiz. Até alguns anos não existia mundo digital. Agora parece que até os septuagenários só chegaram até aqui graças à internet. Somos realmente a nação do cachorro atrás do rabo., Criamos labirintos novos a cada ciclo de problemas novos que nos apresentam. Enquanto isto o planeta vende soluções que serão nossos novos problemas. O Brasil se explica. Queremos construir 2017 com o que sobrou de 1964.   

  2. Ótimo o comentário de
    Ótimo o comentário de Uraniano,apenas lembrando a ele que a boa educação sopra para um lado só,seja no passado,presente ou futuro.

  3. Ainda nos meus verdes

    Ainda nos meus verdes anos,escutava em um radio Telespark que Papai tinha,para ouvir os jogos do Fluminense,e o madrugador O Trabuco,com Vicente Leporace,sobre quem dizia:”Esse Leporace é um sujeito porreta,e esse Bretas(Geraldo Bretas,comentarista esportivo,entrava no meio do Tabuco),um perfeito e acabado idiota”,nada alem disso.Assim que Papai tomava o rumo do seu Colegio da Fraternidade(Igualdade e Liberdade tambem compunham o nome),eu corria a deslocar o “cordão” do radio até a Radio Jornal do Comercio de Recife,Pernambuco .O que mais nela me extasiava era quando o locutor abria o peito e deblaterava,cheio de gás “Radio Jornal do Comercio,de Pernambuco falando para o mundo”.Se meu amigo Uraniano Mota não fez parte do “cast” da Radio Jornal,minha avó é uma bicicleta.São nordestinos,mas se acham holandeses.Quer um teste de fogo Nassif?Chame Noblat de Ricardo José Delgado,para você ver com quantos paus se faz uma jangada.O bicho vira fera.

  4. Peço sinceras desculpas a

    Peço sinceras desculpas a Urariano Mota,reserva moral do blog,por ter gravado seu nome de forma equivocada.Um erro meu. 

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