Por Maíra Vasconcelos
Voltei. Ainda mais volúvel e cheia do que ontem. Vinda pela flor que tenho e perdura e se aprimora em minhas mãos. Eu a fiz, moldada pela morte de ontem. Apalpei afofei nutri a terra e assim vi renascer em meus ossos fundos outra flor. Estou cheia de água e luz. Também preciso descansar: numa variação terei mais e menos flores, menos e mais flores. Posso voltar ao ar, atirá-las e matá-las: e novamente vê-las renascer. Ciclos. Minhas flores jamais acabarão e isso é uma das verdades duras do meu colorido viver. Ergo flores estilhaçadas aos raios de sol para cumprir homenagens e devoção. À vida. E a natureza agradece quando sabemos viver para além de nós mesmos. Sabendo que nos bebemos todos juntos: eu e a natura. Buscando a medida coincidente das nossas falas, mesmo que uma pétala desenhe meu peitoral e respire tão alto.
Na hora do jantar, quando sinto falta de plantar e pegar na terra, ignoro a vida no apartamento do terceiro andar. Então, matar a flor que te tece reveste é ter e conspirar por mais força: nada mais franco do que saber-se também pela morte. Reviver pode ser cotidiano. A demonstração de força é fundamental no correr dos dias das águas das enchentes que prevalecem, e prevalecem sem que exista na suposta claridade da razão um por quê. É assim. Ficamos divididos pela necessidade do corpo em receber as diferentes nascentes. Em épocas de seca perdidos estamos da paixão e o heroísmo vem da ganância pela água desgovernada que nos percorre o corpo.
A noção do mar fundamenta cada palavra que se quer viva e rodante. Rodando chegando até a mesa do escritório de quem lê essas crônicas esperando um dia ter em mãos um livro dessa mesma autoria. Agradeço a confiança em meu mundo fantástico e no desenvolvimento artístico humano. Pela possibilidade de expor tais criações dou mais um passo e fico mais alegre todos os dias, quando enfim perduro viva no claro-escuro claro-escuro. Estou menos arredia: dou-lhe uma pétala, meu amor.
E se o mar morrer em meus olhos, talvez esse seja o prenúncio do fim, quando as palavras não mais se agitem, não mais se regurgitem, não mais desenhem paisagens na areia criativa dos meus dias: seria isso a representação da morte da paixão em meus olhos. Secos. Até minha saliva sem para o quê existir. Quando estou viva e a morte passa diante dos meus olhos: eu fico seca por aquela vida que não tenho mais, como se não mais escrevesse o que é o meu viver salvo pela palavra em mar que se enjoa e se excita.
Depois de tanto revirar-se, aprende-se a viver de todo bem que nos mantêm, mesmo que a destruição seja inerente latente e tão exaustiva na fresta da minha janela. Ter a si mesmo constantemente purificado é mesmo um sonho meditado, como se a palavra escrita desejasse do meu corpo fazer parte arte metrificando, até o último dos meus dias, as variações do claro-escuro claro-escuro. Mas a presença dessa variação é extremamente acusatória do meu modo desnivelado de viver os dias. Com muitas flores tudo é claro demais, com flores ao chão tudo é tão escuro. Eu reconheço as tantas luzes.
Curar preservar alentar todas as águas de si é a forma do meu viver. Tantas vezes poderei transbordar e a impressão de que o mundo se encurta e se apequena todo em meu corpo, deixando-me um mísero espaço, essa sensação passará depois de muito respirar e aceitar abraçar cuidar a força da inundação de todas as palavras em meu viver.
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A correnteza que lava meus olhos.
A correnteza do rio vai levando aquela flor…
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Oxum lava meus olhos
Oxum minha emoção
Oxum flor das águas
Lava meu coração
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