A geração de 68, desde 1868

 Prezados geonautas,

Comentário ao artigo de Fernando Nogueira da Costa: Revisão da Geração 68

Prezado Fernando,

Houvi no início dos anos 80, de meu professor na aula de meio ambiente, a primeira definição da palavra engenharia (era os ingleses copiando os enciclopedistas franceses):

“A engenharia é a arte de dirigir as grandes fontes de energia, para uso e conveniência do homem” (1˚ Enciclopédia Britânica, fim do séc. XVIII/ início séc. XIX). 

A frase ficou no orgulho da memória do jovem, mas o sentido mais amplo da definição, eu só fui entender depois de formado, pela história, pois não era uma frase de engenheiros, ou só de engenheiros, mas uma construção do pensamento iluminista, desde o Renascimento, ou como diz Oswald de Andrade, “a dívida -letra de cambio – foi inventado na Babilônia” (“A Crise da Filosofia Messiânica, 1950). Vídeo J. Miguel Wisnik: http://vimeo.com/54139929#

Para discutir a geração de “68”, embora ainda não tenha visto nenhum comentário sobre o texto, creio também ser importante trazer a luz o ensaio de Bento Prato Junior, A EDUCAÇÃO DEPOIS DE 1968, OU CEM ANOS DE ILUSÃO – CADERNOS DE DEBATE 8, Editora Brasileirense (1980) , na qual ele faz a crítica na esquerda cartesiana (e medíocre) tupiniquim e procura situar a importância de setores ligado a igreja na luta contra a ditadura, como Dom Paulo Evaristo Arns. Ele volta na verdade em “maio” de 1868, com Renan, “Questões Contemporâneas”, e Nietzsche, “Schopenhauer Educador” (1871), e a crítica de Nietzsche as instituições escolares do século XIX na Alemanha.

Ano passado, numa palestra na FEA-USP, 31-07-2012, com o engenheiro Daniel Shechtman, Nobel de Química de 2011, “Conferência: Desafios da Educação no século XXI”, que tem como projeto, diz ele, 

Daniel Shechtman: “Comecei um projeto em Haifa [Israel] para ensinar ciência a crianças com idade entre cinco e seis anos. Treinaremos professores para ensinar pensamento lógico e racional, métodos de quantificação, transformações da matéria e leis de Newton na prática. Os pais de cada criança também estarão participando do processo, recebendo dicas para abordar esses temas com seus filhos.”

Perguntei-lhe: 

O pensador francês, Edgar Morin, diz, “a escola não produz apenas conhecimento e elucidação, mas produz também ignorância e cegueira” (Sete Saberes para Educação do Futuro, 2000). A Alemanha, terra de grandes figuras conhecidas mundialmente, como Kant, Goethe, Beethoven, Einstein, Wagner,…., no final do século XIX, era um país que praticamente não tinha mais analfabetos, e na década de 1920 era o país que mais lia livro no mundo, no entanto, produziu o nazismo e o holocausto, ou seja, o homem não é só ciência, mas principalmente cultura. O que você teria a dizer sobre o assunto?

Ele, evidentemente, não gostou nada da pergunta, e claro, a maioria ficou constrangido com a pergunta, e sua resposta caminhou para a questão política dos estados totalitários, Hitler na Alemanha, Stalin na URSS e não debateu propriamente as questões entre ciência e humanidades, natureza e cultura.

No livro “Admirável Mundo Novo” (1932), o escrito Aldous Huxley narra um hipotético futuro onde as pessoas são pré-condicionadas biologicamente e condicionadas psicologicamente, na qual uma das situações sugerida por ele, ensinar sexo para as crianças, o engenheiro Judeu deseja ensinar ciência para as crianças. A vida imita a arte.

Criei uma proposta tão radical quanto à de Daniel Shechtman, mas em outra direção: ensinar antropologia para “os animais que logo somos”.

Bento Prado Junior lembra-nos, 

“Antonio Candido resume o estrito caroço dessa plataforma político-pedagógica em três parágrafos cuja luminosidade exige uma citação integral”: 

“A partir do século 18 as ideologias do progresso forjaram a imagem de um homem perfectível ao infinito graças à faculdade redentora do saber. Era como se a mancha do pecado original pudesse ser lavada e o paraíso, em vez de ter existido no passado, passasse a ser uma certeza glorioso do futuro. O século 19 se embalou na ilusão de que quando a instrução fosse geral acabariam os “males da sociedade”, – como se ela pudesse substituir as reformas essenciais na estrutura econômica e social que, estas sim, são requisito para se tentar a melhoria da sociedade, e, portanto dos homens.

Essa visão liberal (que se comunicou ao socialismo e ao anarquismo) permeava toda a educação e informava a idéia da escola. Há meio século, nós ainda decorávamos no curso primário um poema de Valentim Magalhães, onde um velho criminoso empedernido, olhando pelas grades de sua prisão, vê saírem as crianças alegres de uma escola em frente e murmura: ‘Eu nunca soube ler’. Chama-se ‘Os dois edifícios’ e exprimia de maneira exemplar a utopia educacional que vai da Revolução Francesa até a Primeira Guerra, e mesmo um pouco mais tarde.

No Brasil, a idéia dominante dos liberais, entre as duas guerras, era que a instrução universal e obrigatória ampliaria ao máximo o corpo de votantes e que, uma vez instituído o voto secreto, ele estaria livre das manipulações oligárquicas e poderia, instruído e independente, levar o país a grandes destinos. Esta teoria generosa e ingênua pressupunha uma população homogênea redimida por aquelas panacéias (Professor, Escola e Associações Docentes, publicado em Almanaque, Cadernos de Literatura e Ensaio, n:11, Ed. Brasiliense).”

Celso Furtado, “A responsabilidade dos cientistas” (Essencial Celso Furtado, p:489 – Discurso de Posse na ABL, 04 de julho de 2003), olhando no horizonte de duas a três décadas, já vislumbrava e alertava-nos. sobre o futuro, entre Ocidente e o Oriente:

“O interesse crescente pelos trabalhos científicos e suas aplicações tecnológicas é traço marcante da civilização ocidental. As grandes civilizações orientais haviam amealhado uma massa enorme de conhecimentos, mas não chegaram a captar as complexas relações entre conhecimento ordenado (ciência), a riqueza ordenada (bens e serviços), e a faculdade normativa de exercer o poder. Hoje, esse quadro já não é mais o mesmo: as posições de vanguarda do Ocidente na ciência e em suas aplicações, que o singularizaram até o fins do século XIX, esvaneceram-se nos últimos decênios do século XX. Com efeito, as projeções mais recentes a respeito da distribuição espacial dos frutos do desenvolvimento, tanto econômico como científico, indicam que nos próximos dois a três decênios o mundo Oriental terá alcançado, ou mesmo superado, o Ocidente.”

Caro Fernando, quando você diz,

(…) “Se falamos tanto em autonomia e em criatividade, devemos demonstrar em nossas estratégias, de uma maneira exemplar, nossa capacidade, no movimento social, de criar indivíduos autônomos.”

Eu, sinceramente, gostaria de acreditar nesse “criar indivíduos autônomos”, mas o iluminismo prometeu o mundo e o fundo e não entregou quase nada.

Minha experiência nos últimos anos, levou-me por outros caminhos, e a crítica é dura, a  universidade brasileira é uma ilha da fantasia, com algumas ilhas de excelência – falo das instituições e não de pessoas – por um lado não tem quase nada sobre a realidade do povo brasileiro, e por outro, a relação entre tese e patente no Brasil é 20 vezes menor que a relação entre tese e patente na Coreia do Sul, nem vamos citar países ocidentais, Japão e China. Paulo Francis tinha percepção da realidade, “a universidade no Brasil, pensa mal”:

O ‘Brasil Nação’ hoje é a Alemanha de Friedrich List em 1841 (04-04-2013)

E la nave va.

Sds,

Luis Nassif

0 Comentário

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador