Do blog de Rui Daher, no Terra Magazine
Casas de espetáculos: música ou comilança?
O Credicard Hall, casa de espetáculos em São Paulo, dependendo do evento, pode abrigar até 7.000 pessoas. Imagino que confortavelmente e com segurança.
Os preços cobrados pelos tickets, estacionamento e produtos da lanchonete assim o permitiriam.
Para os, talvez, quase 3.000 que lá estiveram, ontem à noite, para assistir à apresentação de Herbie Hancock, posso dizer que o espaço bem serviu.
O show ficará gravado na minha memória como insuperável. Hancock é um jazzista da legenda clássica, hoje com 73 anos, que não se intimidou com os avanços tecnológicos dos meios de produção musical.
Enfrentou-os, dominou-os e nos entrega referências afro-jazzísticas de total genialidade, misturadas a momentos delicados de sofisticadas reflexões musicais.
Foi acompanhado por baixista, baterista e um tocador de tabla de tirar o fôlego. Nosso e, pela movimentação, acredito que o dele.
Ah, na abertura a cantora Céu fez um show saboroso e competente.
Paro por aqui. Há nas folhas e telas cotidianas, e especialmente em Terra Magazine, gente muito melhor do que eu para tratar de música e de Herbie Hancock.
Se os deixei com água na boca, sinto. A não ser que possam estar no Rio de Janeiro amanhã, quando Herbie faz seu último show no Brasil.
Foi tudo maravilhoso? Não. Talvez por conta de um ancião inconformado com o fato de que plateias brasileiras atuais são incapazes de passar duas horas sentadas sem comer ou beber.
Lembrei-me de um fenômeno do cotidiano do interior de São Paulo, que acredito não mais ocorrer. O “footing”. Alguém aí se lembra?
Mocinhos e mocinhas, pré ou pós-sessão de cinema se postavam na rua principal da cidade ou no Largo da Matriz, e ficavam andando pra cima e pra baixo, esperando encontrar seus objetos de desejo amoroso.
Foi o que vi ontem nos corredores e passarelas do Credicard Hall. Procissões contínuas de pessoas atrás de pipocas, hot-dogs, cerveja, vinho, espumante, salgadinhos, chocolates.
Não se tratava certamente das certeiras e justificáveis necessidades fisiológicas. Se não pra quê a volta com as encomendas? Incomoda, pois não para. Sempre haverá alguém em busca do apetite recuperado.
Depois não venham reclamar quando chegarem ao grau de obesidade dos norte-americanos. Duas horinhas sem deglutir ou sorver dá pra aguentar.
Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.
Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.