Espelho meu, quem é mais politicamente correto que eu?

(Nota: 1 – o autor deste comentário é integrante da “célula máfia gay da unidade de patrulha da ditadura do politicamente correto”. Não avance na leitura se isso for considerado ilegal ou inapropriado no seu grupo de pensamento. 2 – o mesmo texto, apesar da eventual redundância, está no Fórum, onde longos debates são mais prováveis e também há outros comentaristas, sob a url: http://bit.ly/zgnubr )

Algo que recente e continuamente vem perpassando a internet (em continuidade a coisas antigas da TV, jornais e revistas) é uma atribuição de valores negativos (“ditadura”, “censura”, “patrulha”, “chatice”, “mau-humor”) a uma construção subjetiva, o “politicamente correto”, que por sua vez é associado a valores positivos (justiça social, redução de preconceitos, preocupação com coletividade, multiculturalismo.)

Isso é uma contradição por si só, pois os valores positivos colocados como exemplo dependem justamente de um ambiente de liberdade, de disseminação de conhecimento e, por que não, também alto-astral e bem humorado.

Eu tenho pra mim que “politicamente correto” é algo “pra cima”, “legal” (e/ou “cool”…), agregador. Mas possivelmente estou enganado – e muito isolado na minha opinião, posto que quase só vejo críticas, e pouquíssimas defesas, a essas duas palavras colocadas juntas.

O que eu acho que aconteceu…

Penso que tudo o que se fez nos últimos 50 anos contra o racismo, o machismo, a xenofobia, a intolerância religiosa, a homofobia, a crueldade com animais, a destruição do ambiente (e da saúde das pessoas), a censura, o monoculturalismo, o colonialismo, o preconceito classista, o conservadorismo, etc era (e ainda é), na minha definição e talvez somente nela, politicamente correto, mas sem se declarar assim. Seria libertarianismo, afirmação, liberdade, justiça ou o mais moderno “bom combate”.

Mas tudo isso, possivelmente não com má intenção, mas apenas para fazer troça dos “tempos passados”, foi alcunhado de “politicamente correto” por tablóides e vários meios dos anos 1980. Uma redução para agregar todas as mais variadas militâncias, talvez. E a partir daí foi sendo reproduzido, agora sim não com boas intenções, como piada para desmoralizar e desqualificar qualquer atitude “do bem”. E, se eventualmente há uma ou outra atitude “politicamente correta” tola ou contraditória (isto é, por sua vez incorreta), parece haver muito mais, porém, quem só critique para não se sair do lugar.

Penso que há uma definição, em curso e implícita, de politicamente correto que é justamente uma armadilha. É muito comum humoristas conservadores divulgarem essa versão para poderem obter um álibi e expressar seu humor preconceituoso e arrogante sem freios. Daí que temos que prestar atenção a quem faz o discurso e ver a intenção. Um dos meios atuais que mais se debate contra o “politicamente correto” não por acaso é a revista Veja. Em algumas edições (eu leio ou pelo menos folheio a revista para ver o que se passa) há até 3 menções de jornalistas diferentes, isso é certamente mandado assim.

Para mim, ao contrário do que muitos dizem, “politicamente correto” não é doutrinação, não é repressão. É, antes, a busca da verdade, da reflexão, do questionamento, mesmo que isso incomode os antigos detentores da verdade constituída. Não vejo existir uma pessoa, grupo ou ong que se auto-intitule, aos brados, “PC” (até pela desconstrução feita dessa expressão.) Não se vê um site com “index”, como alguns dizem haver. O que existe, por outro lado, é um sem-número de reacionários que, incomodados com o fim do pensamento único, que lhes era muito favorável, lutam ativamente para se manterem preconceituosos, ou no mínimo em suas zonas de conforto.

A confusão foi feita, o mal-entendido estabelecido e, nos anos mais recentes, como dito no início, bobagens do passado passaram a ser replicadas na internet também. Para usar agora esses termos em uma conversa torna-se portanto imprescindível defini-los (ou redefini-los.)

Quando eu digo que eu sou “politicamente correto assumido” isso é, claro, uma expressão de humor também, um modo de fazer a tréplica (isto é, o processo de modo simplificado seria: a) ação de muitos por uma sociedade livre, justa e pensante > b) réplica na forma de discurso politicamente incorreto travestido de liberdade de expressão, mas mais propriamente, em geral, trata-se de libertinagem na expressão de preconceitos e idéias prontas > a tréplica em questão, momento atual.)

Provavelmente eu serei muito mal-sucedido na tentativa de ajudar a estabelecer uma re-visão da expressão politicamente correto, não vou receber apoio (quase) nenhum. Não importa, me divirto fazendo isso, mas também me sinto muito bem e participativo. É o meu modo de fazer as coisas, de estar no mundo.

Então, lá vai o trabalhinho de definições…

 “politicamente correto”, a meu ver, é/pode ser…

– o combate diligente a manifestações preconceituosas que fazem com que a sociedade sem se aperceber as absorva e as reproduza no cotidiano. A percepção de que a linguagem é um dos mecanismos para isso;

– a defesa das liberdades e dos direitos individuais e sociais, especialmente quando necessários para compensar desigualdades herdadas;

– a consciência que liberdade de expressão é para idéias socialmente, eticamente e filosoficamente válidas, não para defender retorno a noções e conceitos superados pelas ciências exatas, naturais ou sociais. Principalmente não para conceitos antissociais que busquem perpetuação de injustiças ou da ignorância;

– o exercício do bom humor, mesmo da ironia, da sátira e da crítica, mas atribuindo-se limites de civilidade e respeito para não incorrer nos mesmos erros daquilo que se considera errado;

– a desconstrução da ditadura da maioria, isto é, todo pensamento monolítico, inutilmente restritivo e coercitivo;

– a divulgação e exploração ao máximo das diferenças, variantes e alternativas culturais, religiosas e comportamentais que a riqueza do pluralismo humano pode proporcionar, de modo a que todos possam aprender mais e mais com os outros, sem prejuízo para a liberdade e direitos de indivíduos ou grupos;

– o debate, o conhecimento cumulativo, a divulgação de experiências e de interpretações como bases constituintes da construção da sociedade humana.

 “politicamento correto”, ainda a meu ver, não é/não seria:

– o exercício puro e simples de boas maneiras, pois isto pode facilmente resvalar para a falsidade (o que não seria nada correto). Não obstante, boas maneiras consolidadas pela sociedade podem muito bem ser por si só um resultado de sua evolução. O repúdio à agressividade gratuita, sem benefício para ninguém, por exemplo. A divulgação da “inverdade” (a “trollagem”) é uma maneira inadequada;

– a censura do contraditório. Ao contrário, se algo é tido como politicamente correto por seus detratores muito frequentemente é justamente por ser o contraditório a uma “verdade estabelecida” anterior. A busca da liberdade, da justiça e da evolução depende essencialmente do constante questionamento;

– discursos maniqueístas sobre saúde ou ecologia. Eles são frequentemente reducionistas e mal-fundamentados, muitas vezes usados para disseminar manipulações por medo, portanto não são corretos em nenhuma visão. Mas denúncias sobre desastres ambientais e omissões de empresas e governos são bem corretas sim.

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Mas eu posso (sempre) estar completamente equivocado e estou disposto a aumentar meus conhecimentos a respeito. Este tópico, inclusive, pode ser reescrito e editado. Mas para isso preciso da ajuda de comentaristas e colegas. E discussão parece ser um bom meio. De repente nem tudo que parece “PC” é, nem tudo que parece “PI” é. Eu, por exemplo, acho que cartoons como “American Dad” e “Os Simpsons”, são corretos.

Para isso peço que @s amig@s exponham:

– Qual a definição ou conceito que faz de “politicamente correto”? Quais atitudes ou pensamentos podem ser associados a isso?

– Qual a definição ou conceito que faz de “politicamente incorreto”?

– Por que, na sua opinião, muitas pessoas atribuem valores negativos a “politicamente correto”?

– Exemplos de atitudes, cobranças (“patrulhas”), posicionamentos que você considera simultaneamente “politicamente corretos” e inapropriados.

– Exemplos de pensamentos, piadas, que você considera que seriam “politicamente incorretos” mas que, em nome da liberdade de expressão ou do bom humor mereceriam ser encorajados e divulgados.

Redação

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