São Paulo, um estado da moral e dos bons costumes

 

 

“Primeiro, eles vieram atrás dos comunistas.

E eu não protestei, porque não era comunista.

Depois, eles vieram pelos socialistas

e eu não disse nada, porque não era socialista.

Mais tarde, eles vieram atrás dos líderes sindicais.

E eu calei, porque não era líder sindical.

Então, foi a vez dos judeus.

E eu permaneci em silêncio porque não era judeu.

Finalmente, vieram me buscar.

E já não havia ninguém para protestar.”

Martin Niemoller, pastor protestante alemão, sobre os nazistas durante a Segunda Guerra Mundial. 

 

O texto acima parece absurdo para ser usado com o fim de ilustrar a relação entre o governo e os cidadãos do Estado de São Paulo e da cidade de São Paulo. Parece mas, na minha opinião não é. É talvez antecipado, mas o próprio deixa claro que a dominação vem aos poucos. 

Que o estado, e particularmente a cidade, vivem um surto de autoritarismo é fato.

Mas quanto isso é percebido pelos seus cidadãos? Quanto é fruto de uma autorização tácita dada ao governo por uma sociedade conservadora e preconceituosa?

Quanto é fruto de um projeto de dominação apoiado e operado pelos senhores da mídia; que perceberam que nada como amedrontar uma sociedade para que ela repasse autorização para que agentes públicos, em nome de restituir a segurança, na verdade, atentem contra direitos civis?

A grande mídia, que chamamos PIG, mas que é muito mais que isso, tem um objetivo de poder através da dominação. Definir o que você deve comer e o que deve dar a seus filhos para comer; como você deve falar ou se vestir; em quem votar. Dominando o seu querer, esse grupo se apropria de um bem valioso que pode ser vendido a quem precisa da sua boa vontade.

E que também pode ser utilizado para instrumentar a ira santa popular contra aqueles que tentarem contra esse poder.

Os meios de comunicação como forma de legitimação do poder, o moralismo como mensagem, o governo como instrumento e os interesses desse grupo como fim.

O conservadorismo americano e seu Tea Party são emblemáticos, mas São Paulo está sendo um laboratório muito interessante também.

Poderia aqui falar das passeatas dos cansados, sempre abrilhantadas pela presença de senhoras louras, verdadeiras ou falsas, da sociedade paulista e paulistana. Poderia aqui falar dessas ridículas marchas de burgueses, os tais protestos de fins de semana contra a corrupção. Mas eles são ridículos o suficiente para se auto-limitarem. Foram balões de ensaio no melhor estilo “se-colar-colou”. Não colou.

O que me preocupa e leva-me a este post é uma notícia lida hoje na Folha de São Paulo, que apresento ao final, mas que é mais uma ação de interferência do poder público em questões privadas. Sempre recheadas desse do que eu chamo de “totalitarismo do bem”. Perigosíssimo, pois cerceiam seu direito mas dizem que é para sua segurança.

Alguns aspectos dessas ações:

Lei anti-fumo – quem não se lembra do estardalhaço feito em torno da sua implantação? O governador fazendo blitz, fiscais e coisa e tal? Por mais benéfica que seja, há um aspecto pouco falado nessa lei. Ela se aplica aos condomínios residenciais. Mas condomínios residenciais, ainda que sejam espaços coletivos, são particulares, não são públicos. Caberia aos condôminos decidirem se permitem ou não o fumo em locais de uso coletivo. O governador tem o direito de legislar sobre costumes em espaços particulares? Não sei, mas legislou.

Venda de álcool para menores – essa ridícula lei do Alckmin que regula o já regulado. Mais blitz de governador na TV Globo, agora é moda. Há na lei outro aspecto a ser notado. Se um pai decidir dividir um copo de cerveja com o filho menor, o dono do bar será multado. Ora, não me parece que facilitar o contato de filhos com bebida alcoólica seja uma educação familiar muito apropriada, porém, respeito todos os argumentos em sentido contrário. Agora, realmente, não creio que o governador tenha qualquer direito de legislar sobre isso, quanto mais punir. Creio até que nem o ECA adentra tal assunto.

A polícia e a questão social – é preocupante como em São Paulo a questão social é cada vez mais tratada como caso de polícia.

A USP foi uma aula de democracia para o governador, que, aliás, cabulou a última, dada no vão livre do MASP. 72 meninos e meninas deixaram nua a intolerância de um reitor sabidamente intolerante. Mas como foram apresentados? “Maconheiros, vagabundos”, “delinqüentes mimados”, segundo Gilberto Dimenstein. E lá estava a polícia para resolver uma questão de governança acadêmica. Obviamente pendendo para o lado da “lei e da ordem”.

A repressão ao movimento sindical dos professores no governo Serra e a truculência na repressão à “marcha da maconha” não foram mais do mesmo? Gás lacrimogênio e bala de borracha são respostas aceitáveis para reivindicações políticas e salariais? 

Militarização da administração pública – Não vou aqui tratar da insanidade que é permitir guarda municipal armada ou fazendo rondas. Trato aqui de um aspecto “curioso” da gestão Kassab. Desde que assumiu, Kassab nomeou 80 oficiais da Polícia Militar para cargos da administração municipal, cerca da 40 oficiais ocupam cargos na chefia de gabinetes e coordenadorias e das 31 sub-prefeituras, 16 estão sob o comando de coronéis aposentados da PM. Kassab é conhecido pela truculência com que reage à manifestações públicas. De protesto individuais à venda de CDs independentes pelas ruas do centro, lá estam o prefeito e a polícia, garantindo a “lei e a ordem”.

Agora o fato que levou-me a este post.

É um caso onde o “inspetor de quarteirão” decide definir as regras de “moral e bons costumes” para a vizinhança. Quando chegamos a esse ponto, todos estamos em risco.

São conhecidos no estado os casos onde prefeitos do interior adotam “toques de recolher” para jovens. Se têm poderes para isso, não sei? Creio que não. A constituição ainda garante o direito de ir e vir e quem deve cuidar da educação dos filhos são os pais. Eles podem não estar conseguindo, mas isso não dá ao prefeito e à polícia o direito de substituí-los.

Pois, agora em São Paulo, a PM e a prefeitura caçam estudantes que não comparecem às aulas. Não, o termo utilizado na reportagem da Folha é esse mesmo, PM caça estudantes. E é fidedigno. Uma força-tarefa formada por funcionários da prefeitura, policiais militares, guardas civis e conselheiros tutelares faz ronda nos parques da zona leste e prendem estudantes (parece que preferencialmente as meninas) que faltam às aulas.

Nem na época da ditadura militar lembro disso.

Aliás, é da ditadura que me lembro quando penso sobre o momento que estamos vivedo em São Paulo. E sei como termina esse sufoco e esse arbítrio.

Com o povo na rua e um pé na bunda dos dominadores.

Mas até lá, “güenta” paulistano de merda que vota em boneco inflável e em picolé de chuchu.

É para sua segurança, entendeu panaca.

http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/11262-pm-e-prefeitura-vao-a-caca-de-estudantes-que-matam-aulas.shtml

http://psol50.org.br/blog/2011/01/27/sp-coroneis-ja-chefiam-16-das-31-subprefeituras/

http://ultimosegundo.ig.com.br/politica/kassabismo+paulista+tem+militares+engenheiros+e+procuradores/n1300049115829.html

 

 

Redação

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