Wilson Ferreira
Wilson Roberto Vieira Ferreira - Mestre em Comunição Contemporânea (Análises em Imagem e Som) pela Universidade Anhembi Morumbi.Doutorando em Meios e Processos Audiovisuais na ECA/USP. Jornalista e professor na Universidade Anhembi Morumbi nas áreas de Estudos da Semiótica e Comunicação Visual. Pesquisador e escritor, autor de verbetes no "Dicionário de Comunicação" pela editora Paulus, e dos livros "O Caos Semiótico" e "Cinegnose" pela Editora Livrus.
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Filme “Fonte da Vida” Supreende ao utilizar Simbologia Gnóstica e Alquímica

 

Fonte da Vida (The Fountain, 2006) surpreende ao apresentar a jornada de elevação espiritual com simbolismos do Gnosticismo Hermético e Alquimia, diferenciando-se dos clichês dos filmes de espiritualismo New Age e de Auto-Ajuda. 

 

Não conhecia esse filme. Zapeando a TV de madrugada, minha esposa descobriu o filme “A Fonte da Vida” em um desses “corujões”. Sabendo das minhas pesquisas em torno das representações da religião e espiritualidade no cinema (Grupo de Pesquisas CNPQ pela Universidade Anhembi Morumbi-São Paulo) , ela falou: “eu acho que esse filme é gnóstico!”. Confesso que assisti ao filme com um pé atrás: achava que um filme com esse título só poderia ser mais um filme New Age sobre espiritualismo, autoconhecimento, auto-ajuda… Mas acabei sendo surpreendido. Darren Aronofsky, diretor e autor da estória, trabalha com profundos simbolismos gnósticos e alquímicos, tornando um filme diferenciado em relação à onda atual de filmes “espiritualistas”.

O filme se inicia com uma citação da bíblia, uma epígrafe relativa à árvore do conhecimento e à árvore da vida.

O enredo se desenvolve em três épocas, sem definição nítida de limites entre realidade e ficção. Na Espanha do século XVI, o conquistador Tomas Creo parte para o Novo Mundo em busca da lendária árvore da vida que salvará a a rainha Isabel da fúria do Inquisidor da Igreja que vê heresia nessa busca.

Nos tempos atuais a mulher do pesquisador Tommy Creo (Izzy) está morrendo de câncer, mas ele procura desesperadamente a cura. Sua esposa, fascinada pela civilização maia, está escrevendo um manuscrito que conta a história de Tomas Creo e da Rainha Isabel.

Uma terceira história une as duas primeiras: no século XXVI, o astronauta Tom finalmente consegue a resposta para as questões fundamentais da existência.

O astronauta realiza durante sua jornada diversas posturas de meditação associadas às práticas de Yoga e pratica Tai Chi Chuan.

Toda a jornada espiritual do protagonista é estimulada é dirigida pela rainha Isabel e pela esposa Izzy de uma forma paradoxal. Se no século XVI a rainha da Espanha comete heresia contra a Igreja ao enviar seu “conquistador” para a América Central para buscar a mítica árvore da fonte da vida para alcançar a imortalidade (para o Inquisidor devemos morrer para nos libertarmos dos grilhões do corpo), nos tempos atuais, ao contrário, Izzy tenta convencer se marido Tommy de que a fonte da vida é a morte, que devemos aceitá-la em paz para conseguirmos a ascensão espiritual. Inconformado, e usando todos os recursos da Ciência, Tommy acredita que a morte é uma doença, precisa ser “curada”.

Esse paradoxo está relacionado com um profundo simbolismo que o filme trabalha: o “casamento alquímico”. Tanto a Rainha Isabel como Izzy revelam a Tomas/Tommy que no final (ao encontrar a árvore da vida ou após a morte) se unirão em um casamento eterno.

Matéria e espírito, indivíduo e totalidade não são colocados no filme como opostos ou em um nível hierárquico. No final, ambos se casam, a matéria é redimida e não simplesmente liquidada. O processo de evolução espiritual não é um simples processo de descarte do corpo em busca da Totalidade, mas de elevação no corpo, a partir de todas as suas experiências sensoriais.

Casamento Alquímico

O que é o simbolismo do “casamento alquímico”? Alquimistas medievais e renascentistas basearam suas idéias na tradição gnóstica, porém com uma diferença: enquanto os antigos gnósticos queriam transcender a matéria os alquimistas queriam redimi-la. O processo alquímico clássico envolve a dissolução de elementos até o caos para, por meio desse estado, separar massas indiferenciadas em espírito e matéria, unindo essas oposições em uma espécie de casamento alquímico – do qual surge a pedra filosofal. Essa atividade alquímica reencenaria a atividade de Deus que separou o caos em elementos distintos para, mais tarde, reunificar essas antinomias na Revelação. Estes aspectos simbolizariam o processo através do qual o adepto consegue refinar a sua alma.

Temos aqui os passos para a transformação psicológica por meio da narrativa mítica da transformação por meio de uma jornada cíclica: Plenitude gnóstica, Queda e Retorno; Matéria Primal, a Divisão e o Casamento. Não há transcendência sem a redenção da matéria.

Magistralmente, “Fonte da Vida” desenvolve esses aspectos. E, mais do que isso, o filme trabalha o profundo significado do personagem gnóstico de Sophia. Contraponde-se ao conhecimento da Religião e da Ciência (que estruturam o cosmos material que aprisiona o protagonista) Sophia/Rainha Isabel/Izzy oferece um outro conhecimento: a gnose. O protagonista aprenderá que a matéria/corpo não deve ser negada ou descartada (como quer a Religião – corpo como grilhão – ou como quer a Ciência – corpo que necessita de uma cura para escapar da morte). A verdadeira elevação espiritual está no aprendizado com o corpo e a matéria, tanto no caos, prazer e morte. A elevação através de experiências que somente a existencial material pode proporcionar.

 

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Wilson Ferreira

Wilson Roberto Vieira Ferreira - Mestre em Comunição Contemporânea (Análises em Imagem e Som) pela Universidade Anhembi Morumbi.Doutorando em Meios e Processos Audiovisuais na ECA/USP. Jornalista e professor na Universidade Anhembi Morumbi nas áreas de Estudos da Semiótica e Comunicação Visual. Pesquisador e escritor, autor de verbetes no "Dicionário de Comunicação" pela editora Paulus, e dos livros "O Caos Semiótico" e "Cinegnose" pela Editora Livrus.

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