Wilson Ferreira
Wilson Roberto Vieira Ferreira - Mestre em Comunição Contemporânea (Análises em Imagem e Som) pela Universidade Anhembi Morumbi.Doutorando em Meios e Processos Audiovisuais na ECA/USP. Jornalista e professor na Universidade Anhembi Morumbi nas áreas de Estudos da Semiótica e Comunicação Visual. Pesquisador e escritor, autor de verbetes no "Dicionário de Comunicação" pela editora Paulus, e dos livros "O Caos Semiótico" e "Cinegnose" pela Editora Livrus.
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Góticos e Darks Vagam em Shoppings

Diante do racionalismo, o impulso pelo Sagrado é neutralizado. O poder dos símbolos e divindades pagãs é estetizado, por exemplo, através do imaginário dark, gótico ou de todo um “sub-zeitgeist” que fascina sucessivas gerações de jovens e adolescentes. É o reflexo do anseio jovem pela “experiência religiosa imediata”.

 Nesta semana os alunos da disciplina de Estrutura de Roteiro do curso de graduação em Comunicação da Universidade Anhembi Morumbi produziram seus primeiros Argumentos e Sinopses, apresentando oralmente suas produções para a classe. Uma característica recorrente nos argumentos das narrativas apresentadas me chamou a atenção: de 14 estórias apresentadas, quase a metade se inseriam em um imaginário gótico e místico, recheado de simbologias alquímicas, protagonistas esquizofrênicos que não distinguem ilusão de realidade, lugares subterrâneos e mundos paralelos atacados por vampiros etc.

Estórias cujos protagonistas em geral adolescentes, que levam uma vida normal até descobrirem que têm estranhos poderes e que são observados secretamente por entidades sombrias. Por que jovens com idades em torno dos 20 anos são fascinados por esse imaginário dark, com tonalidades ao mesmo tempo depressivas e épicas?

 

É marcante o constante revival entre jovens deste universo que ao longo das décadas assume diversos rótulos. Nos anos 70 tivemos o “rock horror” e “glam rock” dos anos 70. Seus ícones foram a androginia do personagem Ziggy Stardust de David Bowie (com a emblemática música “Rock and Roll Suicide” e a relação do jovem com a morte – “Você está velho demais para perdê-la, muito jovem para escolhê-la”) e todo o universo trash e underground urbano sintetizado no filme “Rock Horror Picture Show” – 1975). Nos anos 80 temos o “Dark” sintetizado em ícones como Robert Smith do The Cure e Peter Murphy da banda Bauhaus. Músicas cujas letras se inspiram no universo gótico da literatura romântica dos séculos XVIII e XIX. Replicantes melancólicos (no filme “Blade Runner” – 1982), amores platônicos e a sensação de uma geração ter alcançado a adolescência e juventude no final da festa (daí a nostalgia pós moderna pela década de 50 na moda, arquitetura e filmografia). Nos anos 90 o “Dark” é reciclado pelo “Gótico” e a literatura romântica é substituída pelos contos de terror. Jovens cuja aspiração é a de se tornar seres da noite, com longas capas pretas e lentas de contato especiais que alteram a cor dos olhos. Nesse final da primeira década do século XXI temos o filme Crepúsculo e o imaginário musical “Emo” destilando essas tendências depressivas em jovens e adolescentes.

Tendências depresivas nos jovens

Já nos anos 70 os pesquisadores alemães Dieter Prokop e Lakaschus (veja a coletânea de textos “Dieter Prokop” da coleção “Grandes Cientistas Sociais” da Editora Ática) abordavam como a cultura midiática lidava com essas tendências depressivas, principalmente em jovens. Eles analisavam como a cultura de massa criava uma espécie de “esportividade” na relação dos jovens com conteúdos da mídia: por um lado o jovem procura elementos estimulantes, vitalidade artística, que combata a sensação de ausência de conteúdo na existência. Mas, por outro lado, esse público não quer que sua paz ou rotina sejam desestabilizadas pelos verdadeiros conteúdos latentes nesses elementos que possam colocar em xeque toda uma totalidade de ordem.

De qualquer forma, o momento de verdade nessa ideologia está no autêntico desejo por transcendência ou ruptura presente no jovem, muitas vezes envolta em torno de simbologias e arquétipos do Sagrado e do Religioso. Com o esvaziamento da mitologia política (Che Guevara, Comunismo, Marxismo etc.), temos agora o Sagrado e o Religioso como um novo imaginário para canalizar a angústia por transcendência do jovem (muito embora podemos encontrar o mesmo componente religioso e escatológico na utopia política do Comunismo no passado).

Como afirma Victoria Nelson, na cultura racionalista ocidental esse impulso pelo sagrado (ou mais precisamente, a crença num cosmos multifacetado entre o sensível e o invisível, a vívida presença de Deus ou do macrocosmo em cada um de nós – a gnosis) é transformado e confinado na estetização da arte e literatura e subjetivado por meio da psicologia e psicanálise.

 

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