Luciano Hortencio
Música e literatura fazem parte do meu dia a dia.
[email protected]

Do lerê, com corimbas e jongos, se fez a voz de J.B.Carvalho

J. B. de Carvalho – Pequena Amostra de um Grande Artista

J. B. de Carvalho, registrado como João Paulo Batista de Carvalho, fez sucesso por mais de cinco décadas. Umbandista, gravou macumbas, corimbas e jongos durante toda a sua prolífica carreira, porém não ficou por aí. Gravou com sucesso outros ritmos, tanto de suas composições quanto de outros compositores seus contemporâneos. Anexo aqui a matéria publicada pelo Dicionário Cravo Albin de Música Popular Brasileira sobre nosso homenageado, a fim de que todos conheçam a extensão de sua carreira artística. Viva Aruanda!

J. B. de Carvalho

João Paulo Batista de Carvalho
 26/4/1901 Rio de Janeiro, RJ 
 24/8/1979 Rio de Janeiro, RJ

Notabilizou-se como cantor de corimas e pontos de macumba. Iniciou a carreira artística em 1931, liderando o Conjunto Tupi na extinta Rádio Cajuti, e interpretando corimás, músicas cantadas durante os rituais de macumba. Dirigiu durante anos o conjunto Tupi que teve entre seus integrantes o cantor e compositor Herivelto Martins. Foi o pioneiro na apresentação de pontos de umbanda em programas de rádio. Consta que o grupo, que fez apresentações em quase todas as emissoras de Rádio cariocas no início da década de 1930, sofria frequentes interrupções da polícia pois as pessoas entravam em transe ao ouvir as músicas. Foi preso diversas vezes e dizia que sempre era solto devido à sua amizade com o presidente Getúlio Vargas.

Lançou seu primeiro disco solo pela Victor em 1931, interpretando os batuques “E vem o sol” e “Na minha terrera”, de sua autoria. Em seguida, gravou na Parlophon a marcha “Isto é azar” e o samba “Gente faladeira”, obras de Maximiliano F. da Costa. Ainda em 1931, paralelamente à sua carreira solo também fez gravações com o Conjunto Tupy dirigido por ele e que seria integrado entre outros por Herivelto Martins e Francisco Sena, que posteriormente sairiam do conjunto formando a dupla Preto e Branco, embrião do lendário Trio de Ouro.

Nesse ano de 1931 o Conjunto Tupi lançou o batuque “Cadê Viramundo”, de sua autoria, que se tornaria seu maior êxito como compositor, sendo anos depois regravada pelo músico mexicano Xavier Cugat, o cateretê “Bambaia”, com P. Nascimento; os sambas “Foi sem querer” e “Fica no mocó”, o jongo “Palavra caboclo” e a canção “Chegou o fim do mundo” todas de sua autoria. No ano seguinte, gravou a toada “Saudade do vaqueiro”, com Paulo Nascimento, que somente seria lançada três anos depois.

Também nesse ano, fez novas gravações com o Conjunto Tupi que registrou de sua autoria a canção “Minha cabocla serrana”; o batuque “Saci Pererê”; os sambas “O destino há de falar” e “Isto é que é”; o jongo “Quando o sol sair”; a toada “Depois daquela montanha”, e o samba-canção “A palavra adeus”, além da macumba “Mironga de moça branca”, com Gastão Viana, e a marcha “Da cor do meu violão”, com Herivelto Martins. Essa marcha na verdade era somente de autoria de Herivelto Martins que ainda em começo de carreira cedeu-lhe a parceria em troca da gravação.

Em 1933, contratado pela Odeon gravou o samba canção “Quetuba da Ita”, com Maximiliano F. da Costa, e a rumba “Cadê o craveiro”, de sua autoria. Como era comum naquela época artistas lançarem discos num mesmo ano por gravadoras diferentes, gravou pela Columbia o samba ” Vivo tristonho”, de César da Silva e o batuque “Vê se é”, de sua autoria. Ainda em 1933, o Conjunto Tupi gravou seus batuques “Lá no horizonte”, “Rei coroado” e “Rompendo a madrugada”, e a canção “Boiadeiro”.

Em 1935, já com o Conjunto Tupi tendo encerrado as atividades, voltou a gravar na Victor e registrou a macumba “Meia noite”, com J. Piedade; a toada-cateretê “Sinhá Maria Rosa”, de Roberto Martins e Ataulfo Alves; as marchas “Criança louca”, de Sátiro de Melo, e “Flauta de bambu”, de Sátiro de Melo e J. Bastos Filho, e os sambas “Se você não quer saber de mim”, de Sátiro de Melo, e “Nosso amor”, de Sátiro de Melo e Jorge Nóbrega. Nesse mesmo ano, registrou na Columbia os sambas “Nega reúna” e “Canta meu pandeiro”, parcerias com J. Piedade. Em 1936, lançou os jongos “Pomba girá”, com Jorge Nóbrega, e “É timbetá”, de Getúlio Marinho; os sambas “Eu nunca pensei”, de Paquito e Miguel Baúso; “Esta mulher me provoca”, com Cândido Vasconcelos, e “Falso amor”, com Osvaldo Silva, que fez bastante sucesso, e a marcha “Alô boy”, de Kid Pepe, J. Piedade e Homero Ferreira.

Em 1937, gravou as macumbas “Caboclo do mato” e “No fundo do mar” de autoria de João da Baiana e Getúlio Marinho; o batuque “Vem baianinha”, de Max Bulhões e Constantino Silva; as batucadas “O batuque começou”, de Peterpan e Oscar Lavado, e “Foste embora”, de Djalma Esteves, Carlos Almeida e Raul Rezende; os sambas “Bateu cinco horas”, de Haroldo Lobo e Milton de Oliveira; “Eu era bem feliz”, com J. Nóbrega; “Só um novo amor”, de Max Bulhões; “Juro”, de Haroldo Lobo e Milton de Oliveira; “Julgou ser feliz”, de Valdemar Silva e C. Vasconcelos, e “Não sei se chorei”, de Peterpan e M. Robledo, e a marcha “Vaca preta”, com Jorge Nóbrega.

Em 1938, gravou mais oito disco na Victor registrando as marchas “Tereré não dá camisa a ninguém”, de Valfrido Silva e Antônio Almeida; “Americana”, de Tio Sam, e “Dona Laura”, de Arlindo Marques Jr. E Roberto Roberti; os sambas “Mulher sem dono”, de J. Piedade e Torres Homem, “Minha vida é cantar”, de Peterpan e J. Portela; “Gostei do teu olhar”, de Armando Marçal e Antônio Soares; “O coração ordena”, de Alvaiade e Paquito; “Deve ser amor “, de Nelson Trigueiro e Paquito; “Despedida”, de Haroldo Lobo e Milton de Oliveira, e “Princípio de amor”, de Amado Régis; os cateretês “O rancho de sapé”, de sua autoria, e “Na boca da noite”, de João Maia e Pedro Paraguassu; o jongo “Suará”, com Jorge Nóbrega; o maracatu “Bagé”, de Odilon Carvalho e Raimundo Ferreira, e o batuque “Melodia africana”, com Ilca Airosa e Durval Fernandes, em gravação feita em dueto com a cantora Odete Amaral.

No ano seguinte, lançou um último disco pela Victor com o ponto de macumba “Meia noite”, de Antenor Borges e Príncipe Pretinho, e o samba-canção “Grande mágoa”, de Raul Marques e J. Miranda Pinto. 

Em 1939, foi para a Odeon e gravou os sambas “Em sonhos te beijei”, de Djalma Esteves e Milton de Oliveira; “Quando o meu amor morreu”, com arranjos seus, de Djalma Esteves e Milton de Oliveira, para a melodia do fox “My love parade” adaptada para ritmo de samba, “Foi num sonho”, de J. Cascata e Roberto Martins; “Me deixa em paz”, com Paulo Rodrigues; “Noite de lua”, de Max Bulhões e Felisberto Martins; “Com a vida que pediste a Deus”, de Ismael Silva; “Dormindo sonhei”, de Paquito, Chico Cuíca e Ernâni Dias; “Te encontrei no abandono”, de Kid Pepe e Germano Augusto, e “Sonhou”, de Haroldo Lobo e Milton de Oliveira, e as marchas “Descança palhaço”, com Nicola Bruni; “Mulata nacional”, com Manoel Ferreira, e “Touradas na avenida”, com Felisberto Martins.

Tendo atuado numa época em as gravações eram difíceis é de se notar a quantidade de gravações que chegou a fazer lançando seis disco em 1939 e mais oito no ano seguinte quando gravou as batucadas “Poeira”, de J. Santos e Abigail Moura, e “Ciúmes de Pai João”, de Fausto Vasconcelos e Felisberto Martins; os sambas canção “Era eu”, com Amadeu Veloso, e “Suas lágrimas”, de Paquito e Henrique de Almeida; os sambas “Beira-mar”, de Paulo Rodrigues e Pedro Carvalho; “Falsa jura”, de Paulo Rodrigues e J. M. Hermida; “Se ela perguntar”, de Amado Régis e Zé Pretinho; “Saudade de um batuqueiro”, de A. Alexandrino, Max Bulhões e Elpídio Viana; “Não há quem possa”, de Edgard Freitas e Sá Róris; “Partiu… Para onde não sei…”, de Henrique Mesquita e Felisberto Martins, e “Essa sopa vai acabar”, de Lázaro Martins e Pedrito; o samba jongo “Iaiá, ioiô e a cuíca”, de Fausto Vasconcelos e Felisberto Martins, que foi gravado em dueto com a cantora Nena Robledo, e as marchas “Pó de mico”, de Haroldo Lobo e Milton de Oliveira, de grande sucesso no carnaval daquele ano; “A mulher faz o homem”, de Nelson Teixeira e Alberto Homsi; “Aguenta o galho Carolina”, de Paulo Rodrigues e Custódio Fontes, e “Esta noite tive um sonho”, com Kid Pepe.

Ainda em 1940, registrou o batuque “Ponto do caboclo Rompe Mato”, com Nelson Trigueiro, em gravação na qual cantou em dupla com a cantora Eladir Porto, e o samba “Espero não zombar de mim”, de Lázaro Martins e Pedrito.

Em 1941, gravou os sambas “O patrão está com a palavra”, de Paquito e Artur Vilarino; “Reportagem carnavalesca”, de Moreira da Silva e Davina Anita Pentone, e “Só eu”, de Orlando M. Braga e Pedrito; a batucada “Bota a canoa no mar”, de sua autoria; a marcha-rancho “Lenda da rosa vermelha”, de Amado Régis, e o samba-canção “Só você”, de O. M. Braga, Henrique de Almeida e Nelson Trigueiro.

Em 1942, gravou as macumbas “Pai Xangô”, com Henrique de Almeida e Estanislau Silva, e “São Jorge guerreiro”, com Amado Régis. Em 1945, gravou pela Continental os sambas “Pra que esse abandono?” e “A estrela brilhou”, parcerias com Amado Régis; a marcha “Margarida”, de Lauro Maia e Humberto Teixeira, e o samba “Não vejo lágrimas”, de Mendonça de Souza.

Depois de alguns anos sem gravar foi contratado pela gravadora Todamérica em 1951 e, seguindo o sucesso do baião, lançou o que seria um novo gênero, o macumbaião gravando “Segura o boi” e “Saravá”, parcerias com Paulo Rodrigues. No ano seguinte, gravou as macumbas “Salve Ogum” e “Pedra rolou”, de sua autoria, o baião “Na encruzilhada”, com César Cruz, e o samba “A baiana chegou”, com João Dias. Em 1953, gravou mais quatro macumbas “Cangira”, de Paulo Rodrigues e Valdir Machado; “Pena verde”, com Ângela Dantas; “Ogum Megé”, com Paulo Rodrigues; “Mãe d’água” e “Doum, Cosme e Damião”, com Amado Régis, e “São Benedito”, com Rossini Pacheco e Valdir Machado; os batuques “Ê-rê-rê (Caboclo 7 flechas)” e “Ogum meu pai”, de César Brasil e Otávio Faria; a marcha “Mei-noite”, de Wilson Batista, Brasinha e J. Batista, e o samba “Vai pra casa do teu pai”, de Paulo cardoso.

Em 1954, regravou seu batuque “Cadê Viramundo”, além de registrar também o batuque “São Jorge Guerreiro”, de Antônio Almeida; as macumbas “Santo Antônio caminhou”, com Ari Rebelo; “Pena branca”, com Ângelo Dantas; “Ponto de aniversário (Cosme e Damião)”, “Oxumaré” e “Tranca rua” as três com Otávio Faria; “Beira-mar”, com Otávio Faria e Amado Régis, e “Congo é”, com Ângelo Dantas; os sambas “Penei”, com Elpídio Viana e Ângelo Dantas, e “Papel de palhaço”, de Abílio de Oliveira, e o baião “Rojão do Lampião”, de sua autoria. Em 1955, lançou mais quatro disco com composições de umbanda: as macumbas “Ogum Iara”, “Pai Xangô”, “Cabolco da cachoeira”, “Cabocla Jurema” e “Caboclo do mato”, todas de sua autoria, e “Dia das crianças (Cosme e Damião)”, com Rossini Pacheco; a “Capoeira”, com Valter Tourinho e Guará, e a marcha “Bilhete à São João”, com Dias de Oliveira e Mauro Miranda.

Em 1956, gravou com o grupo J. B. de Carvalho e Seus Caboclos as macumbas “Ogum Megê meu pai” e “Exu tranca rua das almas”, ambas com Álvaro F. Gonçalves. Em 1957, gravou na RCA Victor o samba “Saudação a São Jorge”, de sua autoria e os pontos “Ogum Megé”, com Zé Ferreira; “Saudação a Cosme e Damião”, com Jarbas Assad, e “Saravá Inhançã”, de César Cruz e Silvinha Drumont.

Em 1960, gravou com o grupo J. B. de Carvalho e Seu Terreiro os dois últimos discos pela Todamérica interpretando as macumbas “Vencedor de demanda” e “Tala talá”, as duas com Delmiro Ramos; “Ogum Sete Ondas”, com Pedro Nascimento, e “Estrela Dalva”, de sua autoria. Em 1961, dezessete de seus discos em 78 rpm foram relançados numa série da gravadora Continental. Lançou ainda com sucesso diversos LPs entre os quais “Terreiros e atabaques” pela Todamérica, e “Batuque”, pela Philips muito vendidos em casas de artigos de umbanda.

No fim da década de 1960, retirou-se do Rádio, mas retornou logo depois, em 1971, quando passou a dirigir na Rádio Carioca o programa “A Carioca dos Terreiros” no qual contou com a presença do locutor Moreira e de J. B. Júnior, que era seu filho e pandeirista e compositor da Portela. Esse programa atingiu grande audiência na época.

Sua longa carreira artística atravessou quase cinco décadas tendo lançado mais de 70 discos entre 78 rpm e LPs pelas gravdoras Odeon, Victor, Columbia, Continental, Parlophon, Todamérica e Philips deixando seu nome gravado na história da música popular não apenas pelo pioneirismo de levar pontos de macumba para o Rádio, já que no disco nomes como João da Bahiana e Getúlio Marinho também o fizeram na mesma época, mas pela continuidade de gravar esses pontos até o final da carreira.

 

Luciano Hortencio

Música e literatura fazem parte do meu dia a dia.

11 Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

  1. Certamente, influenciou os

    Certamente, influenciou os baianos do Tincoãs. Interessante como ficamos tão conservadores em certos aspectos. Tudo que é relacionado às religiões está ‘banido’ da mídia se não for católico,pentecostal ou evangélico. Imaginar que havia um cantor de pontos de umbanda e um programa de rádio. Hoje, a governabilidade que domina o Brasil, nos ‘impõe’ apenas a liberdade dos católicos e evagélicos de divulgarem seus cantos nas rádios e tv’s. 

      1. Legal, Luciano. Venho te

        Legal, Luciano. Venho te acompanhado um pouco à distância há já um bom tempo. Seu acervo é muito valioso. Gosto muito dos seus posts. 

  2. Parabéns pela matéria, mas

    Parabéns pela matéria, mas pena que no universo da Umbanda a memória se perca. Não consigo acesso ao acervo do J.B de Carvalho, ficou perdido nas noites da história….

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador