Wilson Ferreira
Wilson Roberto Vieira Ferreira - Mestre em Comunição Contemporânea (Análises em Imagem e Som) pela Universidade Anhembi Morumbi.Doutorando em Meios e Processos Audiovisuais na ECA/USP. Jornalista e professor na Universidade Anhembi Morumbi nas áreas de Estudos da Semiótica e Comunicação Visual. Pesquisador e escritor, autor de verbetes no "Dicionário de Comunicação" pela editora Paulus, e dos livros "O Caos Semiótico" e "Cinegnose" pela Editora Livrus.
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O “Jazz” das Religiões

 

Certa vez Louis Armstrong disse a um jornalista: “Cara, se você for perguntar o que é o Jazz, então nunca saberá”. Algo semelhante ocorre com termos como “Gnosticismo” ou “Gnose” na história das religiões: devem ser mais experimentados do que compreendidos. Pelas suas próprias origens sincréticas (uma fusão de platonismo, neo-platonismo, estoicismo, budismo, antigas religiões semíticas e cristianismo), o Gnosticismo poderia ser facilmente comparado ao Jazz que, pelas suas origens, também foi resultante de intensas misturas e adaptações.

 

O que é Gnosticismo? Seja pelo ponto de vista histórico (conjunto de seitas sincréticas de religiões iniciatórias e escolas de conhecimento nos primeiros séculos da era cristã) ou pelo ponto de vista dos renascimentos na era moderna (grupos e, por analogia, a todos os movimentos que se baseiam no conhecimento secreto da “gnose”) são definições que podem levar à generalização e confusão.

Mesmo com a descoberta, em 1945, de textos gnósticos do século IV em Nag Hammadi (Egito), muitos concordam que o tema ainda continua com muitos pontos dúbios.

Hoeller e Conner preferem abordar o Gnosticismo como uma “atitude da mente” ou uma “predisposição ideológica” que surge em ambientes de grande agitação artística e cultural. “Se você é um artista sério, já é meio gnóstico”, afirma Conner. Nessas condições, o Gnosticismo está fadado a um novo renascimento.

Mas há um consenso: o Gnosticismo e seus derivados esotéricos nunca fizeram parte da cultura sancionada pelas instituições. Desde o triunfo do cristianismo ortodoxo após Constantino, a tradição gnóstica entrou para o subterrâneo dos movimentos sociais. Bem sucedido em seus canais subterrâneos, eventualmente ofereceu a pensadores revolucionários e artistas subsídios importantes para críticas aos sistemas opressivos políticos, sociais ou culturais.

É por esse caminho que Miguel Conner (escritor norte-americano de sci fi e editor/apresentador do programa radiofônico “Aeon Bytes Gnostic Radio” – programa de debates e entrevistas semanais sobre temas do Gnosticismo, literatura e cultura pop) vai focar o Gnosticismo ao compará-lo ao Jazz no campo musical. Impossível de ser definido, o Jazz escapa a qualquer descrição ou análise mecanicista. Para Conner, o Gnosticismo se enquadraria nessa mesma natureza. Pelas suas próprias origens sincréticas (uma fusão de platonismo, neo-platonismo, estoicismo, budismo, antigas religiões semíticas e cristianismo), o Gnosticismo poderia ser facilmente comparado ao Jazz que, pelas suas origens, também foi resultante de intensas misturas e adaptações.

Para corroborar com essa ponto de vista, Conner faz uma referência a um texto do escritor de sci fi norte-americano Philip K. Dick sobre “Os Dez Princípios da Revelação Gnóstica”. 

Reproduzimos abaixo essa análise de Miguel Conner.


QUAIS SÃO OS PRINCÍPIOS DE UM CRISTÃO GNÓSTICO?


Tentar explicar o Gnosticismo é como tentar explicar o Jazz. Ensinar toda a história, tradição e  mecânica do Jazz é ficar apenas na superfície. Para realmente apreciar essa forma de arte, é necessário que o coração e a mente estejam imersos na música.  Só assim poderemos não apenas entender o Jazz, mas experimentá-lo.

O escritor Philip K. Dick 
escreveu
“Os Dez Maiores Princípios da
 Revelação Gnóstica”
 

Gnosticismo é o Jazz de todas as religiões. São igualmente individualistas, embora sua disseminação seja coletiva; extrovertidos e selvagens nas suas mais íntimas paixões, embora aparentemente contidos em contextos surreais; propensos à adaptações e, dependendo do público, tendem à apropriações para melhorar suas performances. Jazz e Gnosticismo sempre vicejaram nas nevoas, nos cantos escuros da sociedade, assim como nos locais de explosão artística.

Quando pensamos que encostamos os dedos no Gnosticismo ou no Jazz, fogem do nosso toque para reaparecerem em outra divertida manifestação, porém em tons graves e reflexivos provenientes das suas sombrias origens.

No livro “The Gnostic Religion”, Hans Jonas escreveu que para entender o Gnosticismo é necessário uma espécie de ouvido musical que deve ser continuamente treinado.

Não é fácil viver em um mundo onde a fé dominante requer pessoas que executem as regras de um mecânico Salieri ao invés de um etéreo Mozart, tal como apresentado no filme “Amadeus”. Fica difícil compreender uma religião esotérica em um mundo desatento que sempre busca coisas de fácil digestão.

Mas se buscamos uma definição de Gnosticismo, pode vir muito bem de uma pessoa cuja primeira paixão foi a música – Philip K. Dick, considerado por muitos o último e maior bandleader do Gnosticismo.

O Gnosticismo visionário de K.  Dick é bem conhecido em seus livros “Valis” e “The Divine Invasion” e nas adaptações cinematográficas como “Blade Runner” e “Minority Report”. Ainda que K. Dick tenha gasto a maior parte da sua vida expressando suas descobertas místicas em seu “Exegesis”. Embora “Exegesis” seja um trabalho pesado, K. Dick acabou conseguindo produzir uma sintética de princípios do Gnosticismo que pode atender às necessidades daqueles que querem aprimorar o ouvido musical.

Wilson Ferreira

Wilson Roberto Vieira Ferreira - Mestre em Comunição Contemporânea (Análises em Imagem e Som) pela Universidade Anhembi Morumbi.Doutorando em Meios e Processos Audiovisuais na ECA/USP. Jornalista e professor na Universidade Anhembi Morumbi nas áreas de Estudos da Semiótica e Comunicação Visual. Pesquisador e escritor, autor de verbetes no "Dicionário de Comunicação" pela editora Paulus, e dos livros "O Caos Semiótico" e "Cinegnose" pela Editora Livrus.

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