Wilson Ferreira
Wilson Roberto Vieira Ferreira - Mestre em Comunição Contemporânea (Análises em Imagem e Som) pela Universidade Anhembi Morumbi.Doutorando em Meios e Processos Audiovisuais na ECA/USP. Jornalista e professor na Universidade Anhembi Morumbi nas áreas de Estudos da Semiótica e Comunicação Visual. Pesquisador e escritor, autor de verbetes no "Dicionário de Comunicação" pela editora Paulus, e dos livros "O Caos Semiótico" e "Cinegnose" pela Editora Livrus.
[email protected]

Platão e Gnosticismo para jovens no filme “Cidade das Sombras”

 

Depois do gnosticismo pop buscar o público adulto através de filmes como “Show de Truman”, “Matrix” e “Vanilla Sky”, agora se volta para o público adolescente. É o exemplo do filme “Cidade das Sombras” (no Brasil veio direto como DVD e atualmente é exibido em canais por assinatura) que faz um notável mix entre o platonismo e o fervor místico do Gnosticismo: da alegoria da caverna de Platão à salvação pelo arrebatamento místico.


O filme “Cidade das Sombras” (City of Ember, 2008) do diretor Gil Kenan (da animação “A Casa Monstro”) e do roteirista Caroline Thompson (de animações como “A Noiva Cadáver” e “O Estranho Mundo de Jack” e o filme “Edward Mãos de Tesoura”, todos do diretor Tim Burton) é surpreendente: a princípio parece que estamos diante de mais uma aventura com heróis adolescentes que desafiam vilões adultos com muita ação e mistério. Mas a narrativa, baseada no livro homônimo de Jeanne Duprau, vai muito mais além. Primeiro pela estética (lembra muito as ficções distópicas do diretor Terry Gilliam como “Brazil, o Filme”). Segundo, e principalmente, pelos simbolismos que vão sendo desenvolvidos pela estória: aqui e ali alusões a filosofia platônica, neoplatonismo e gnosticismo.


Para começar, o próprio argumento do filme, explicitamente inspirado na alegoria da caverna de Platão, tal qual descrita na obra “A República”, um exemplo de como o homem pode se libertar da sua condição de escuridão e alcançar a luz da verdade.


Mas antes, uma breve sinopse: diante de um iminente apocalipse, cientistas e intelectuais constroem uma cidade subterrânea, iniciando-se uma nova geração de pessoas a residir sob a terra, longe das catástrofes. Depois de 200 anos, um dispositivo alertará os habitantes de como voltar à superfície. Mas as gerações se passam e a verdade (e o dispositivo) se perde. Todos esqueceram o propósito daquela cidade e porque vieram parar ali. Para eles, Ember é a única realidade e para além das suas fronteiras só existem trevas.

 

 


Orgulham-se das suas luzes (colocadas ali pelos “construtores”, tidos por eles como espécies de deuses de origem desconhecida). Mas, depois de tanto tempo, os geradores começam a falhar ameaçando condenar Ember à total escuridão. Dois adolescentes, Doon Harrow (Harry Treadway) e Lina Mayfleet (Saoirse Ronan), vão procurar a resposta por conta própria, já que o prefeito corrupto (Bill Murray) só pensa em roubar os escassos alimentos da cidade. Aos poucos vão desvendando os mistérios e, principalmente, a saída de Ember.


A cidade de Ember, cercada pelas trevas e as luzes artificiais produzidas por máquinas à beira do colapso de tão velhas, é a própria atualização da caverna platônica. Os moradores tomam as luzes das lâmpadas como a única verdade e ignoram a natureza não autêntica das suas vidas e simplesmente colocam o destino dos geradores nas mãos dos deuses “construtores” (“Eles saberão o que fazer, nunca nos faltaram”).


Ember é uma cópia imperfeita, caricata do que fora um dia a humanidade. Um simulacro do passado. Tal como em Platão, os cidadãos de Ember (a humanidade) tomam o simulacro como a realidade. Toda a memória do passado foi perdida, sobrando apenas reminiscências (a caixa com as instruções para retornar à superfície e um livro escondido pelo prefeito corrupto com a história da cidade). Tudo foi perdido, assim como em Platão que julga a humanidade igualmente prisioneira na caverna do mundo das aparências sensíveis, restando à Filosofia o trabalho de relembrar às conexões perdidas com o mundo das Idéias.

 

>>>>>>>>>>>>>>> Leia mais

Wilson Ferreira

Wilson Roberto Vieira Ferreira - Mestre em Comunição Contemporânea (Análises em Imagem e Som) pela Universidade Anhembi Morumbi.Doutorando em Meios e Processos Audiovisuais na ECA/USP. Jornalista e professor na Universidade Anhembi Morumbi nas áreas de Estudos da Semiótica e Comunicação Visual. Pesquisador e escritor, autor de verbetes no "Dicionário de Comunicação" pela editora Paulus, e dos livros "O Caos Semiótico" e "Cinegnose" pela Editora Livrus.

0 Comentário

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador