Academia como antídoto à radicalização política das redes sociais

Brasilianas: Universidades tornaram-se centrais na promoção do diálogo, prejudicado pelas “bolhas digitais” da modernidade líquida
 
O que falta às redes sociais é papel central das Universidades: promoção do diálogo e do debate
Graffiti: Banksy / Imagem: Gustavo Balduíno, secretário-executivo da Andifes 
 
Jornal GGN – Um dos grandes problemas sociais da atualidade é o impacto das Redes Sociais nas relações humanas, especialmente na criação de “bolhas” que dificultam, cada vez mais, o diálogo entre pessoas ou grupos com posições filosóficas ou políticas diferentes. Quem observou esse fenômeno com profundidade foi Zygmunt Bauman. 
 
Em entrevista ao El País em janeiro de 2016, um ano antes de falecer, o sociólogo e filósofo responsável pelo conceito de “modernidade líquida” reforçou suas críticas às plataformas da internet. 
 
“As redes sociais não ensinam a dialogar porque é muito fácil evitar a controvérsia… Muita gente as usa não para unir, não para ampliar seus horizontes, mas ao contrário, para se fechar no que eu chamo de zonas de conforto, onde o único som que escutam é o eco de suas próprias vozes”, disse.  
 
Nesta mesma entrevista, Bauman destacou que as habilidades sociais são desenvolvidas “ao encontrar gente com quem se precisa ter uma interação razoável”. “O diálogo real não é falar com gente que pensa igual a você”, completou. 
 
No Brasil, a popularização das redes sociais acorreu junto à radicalização política, dentro da última década. “As redes sociais trouxeram um grau de virulência e de radicalização muito grande”, pontuou Luis Nassif, coordenador da Plataforma Brasilianas, durante a Abertura do “Fórum Brasilianas Desenvolvimento Produtivo e a 4ª Revolução Industrial”, realizado na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) em parceria com a Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), no dia 21 de maio.
 
Leia também – Brasilianas: uma política para 4ª Revolução Industrial, por Luis Nassif
 
O secretário-executivo da Andifes, Gustavo Balduíno, também presente na mesa de abertura, completou à essa análise que as Universidades Públicas, gratuitas e de qualidade favorecem a pluralidade do debate.  
 
“Não podemos perder de vista [essa função das Universidades], de alcançarmos essa facilidade [do diálogo] e a condição política de ouvir o outro que pensa diferente”, completando ser o espaço acadêmico propício para desenvolver “paciência, tolerância, compreensão, mente e coração abertos para ouvir o contraditório, mesmo que esse contraditório seja bem contrário ao que pensamos”.  
 
Balduíno pontuou, ainda, que como “locus do debate acadêmico” a Universidade pública, gratuita e de qualidade, é, em realidade, estratégica para o desenvolvimento do país. 
 
“Esta Universidade tem a capacidade de ajudar no debate, porque massa crítica não se inaugura. Debate acadêmico qualificado não se teletransporte. Não é uma fábrica que você pode tirar de um país e colocar em um outro”. 
 
Isso explica, portanto, porque a discussão em torno da consolidação ou redução de Instituições de Ensino Superior diz respeito à soberania do país. “Massa crítica não se inventa, se constrói paulatinamente, continuamente, incrementalmente e em uma velocidade que é dada pela prioridade que a sociedade dá ao conhecimento e à soberania. Se a sociedade não prioriza isso, certamente essa velocidade é mais lenta”, disse. 
 
Infelizmente, nos últimos anos se intensificou nos principais meios de comunicação do país análises de que as Universidades Públicas brasileiras sofrem problemas de gestão, portanto saem caro à sociedade, justificando a redução de recursos federais.
 
Para Balduíno, essas avaliações são precárias provando, pelos números registrados nos últimos anos, que as Universidades públicas brasileiras demonstram eficiência, mesmo sob contingenciamento.
 
“[Há 15 anos] nós tínhamos em torno de 500 mil alunos. Hoje temos mais de um milhão e cem alunos. Nós tínhamos cerca de 40 universidades, hoje são 68. Tínhamos em torno de 40 campus, hoje são mais de 300. Em 15 anos nós fizemos nesse país o que se levou 490 anos para fazer antes”, acrescentando que a ampliação aconteceu aumentando unidades de ensino no interior do país e diversificando a população estudantil que passou a ter mais negros, mulheres e estudantes de escolas públicas.
 
O representante da Andifes destacou, ainda, que a ampliação de unidades não reduziu a qualidade, como mostram os resultados de pesquisas que vão de órgãos públicos, como Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira) e Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), à avaliação de institutos privados, como o ranking universitário do país (RUF), da Folha de S.Paulo. 
 
“O mais grave neste momento é que estamos usamos o discurso da má gerência para poder fazer o subfinanciamento. ‘Não falta dinheiro, problema é de gestão’, é o mantra repetido diariamente. Claro que temos problemas de gestão como todos têm. Por exemplo, tem uma empresa de telecomunicação – por que não citá-la no ambiente acadêmico?, não estou fazendo propaganda nem demérito -, a Oi, que está quebrada.  É privada e mexe com telecomunicações, talvez uma mina de ouro, né? Não conseguiu ter uma gestão. Recentemente vimos uma grupo x que mexia com petróleo, recurso público, quebrou também. Privado, mexendo com petróleo”.
 
“Certamente temos muitas mazelas e a transparência e o espaço público como esse [fórum de debates] é que permitem corrigir essas mazelas, até porque a universidade não é e não pode ser um gueto em relação à sociedade, ela é o reflexo da sociedade. Mas queria fazer essas afirmações, de que a Universidade pública, gratuita, brasileira é muito eficiente, nessa oportunidade e ela tem colaborado para a construção dessa sociedade nos melhores aspectos”, justificou. 
 
Leia também “Brasilianas: A Universidade na reconstrução do Brasil pós crise”
 
Veja a seguir a apresentação de Balduíno na íntegra, a partir de 8:18
https://www.youtube.com/watch?v=cq2BMDAmTXU?list=PLhevdk0TXGF4I3-oQVZaWGeduaPz1dyiw&t=499
 
 
Redação

3 Comentários

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  1. As redes não são sociais. Blogs. “Debates”

    Primeiramente, não acho necessário recorrer e citar um filósofo pensador da moda. Pro fenômeno de redes ditas sociais, basta se pensar com os próprios botões e, claro, com um distanciamento e liberdade intelectual (o que não é tarefa das mais fáceis e que podem nos trazer choques se depararmos com o que víamos serem pouco mais que preconceitos diversos).

    O que se denominou (bota bom marketing nisso) de rede social, de “acesso democrático à informação”, não passam de superficialidades, de leituras corridas, escritas idem. Há fenômeno mundial de tendência a jovens de todas as idades de saírem de facebooks, e de nem entrarem. São nichos de iguais “debatendo” com iguais. Em Blogs em geral acontece o mesmo.

  2. A minha bolha é melhor que a sua
    Mais uma manchete falaciosa.
    Os motivos para defender a universidade pública, gratuita e de qualidade são muitos e dentre os quais não pode estar “rivalizar” com redes sociais digitais como o melhor espaço para debates públicos democráticos.
    Até porque as “bolhas digitais” são menos restritivas no acesso que a universidade, pública ou não, e no caso das públicas estas são a versão original, oficial e elitista do pensamento e relacionamento em forma de bolha. Não por acaso chamadas de Torre de Marfim. Acho que seu papel no debate público democrático se dá através da ampliação do acesso não apenas para estudantes mas principalmente à sociedade ampla que não vai, por inúmeros motivos, aderir a ela nessa condição. Parece que a manchete força o assunto ao aproximar os dois universos, sendo as bolhas digitais o bode expiatório de um problema que é da sociedade como um todo, aliás de onde surge – a vida real – a tendência ao isolamento social em grupos homogeneizados/zantes. A universidade não é diferente nisso, apenas é mais exposta ao debate, interno, por natureza de seu funcionamento. O debate público não deve ser privilégio de nenhum setor ou local social, mas uma prática exercitada, e reconhecida em seus moldes prosaicos tornados fora de moda – migração que deságua com desordem nas chamadas redes sociais digitais -, como a convivência comum na família, no trabalho, nos relacionamentos íntimos e privados e nos espaços públicos em geral.
    Sugiro a entrevista do professor Renato Janine Ribeiro ao programa EntreVistas, da rede TVT, canal 44, apresentado pelo jornalista Juca Kfouri.

    [video:https://m.youtube.com/watch?v=4J_HSPHIy2U%5D

    https://m.youtube.com/watch?v=4J_HSPHIy2U

    Sampa/SP, 13/06/2018 – 10:47 (alterado às 10:51 e 11:08).

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