Civis são massacrados, mas a milícia passa bem e sai fortalecida da chacina no Jacarezinho, por Lucia Helena Issa

Foi um massacre assustadoramente parecido com os executados por Israel nos últimos anos.

Civis são massacrados, mas a milícia passa bem e sai fortalecida da chacina no Jacarezinho

por Lucia Helena Issa

Chove assustadoramente nessa manhã de luto na cidade que me adotou e que amarei para sempre.

Crianças, jovens e mães do Morro do Jacarezinho tentam ainda conhecer a história de cada pessoa assassinada e entender como a Chacina foi autorizada, ainda que o STF tivesse proibido as incursões policiais (tanto civis quanto militares) nas comunidades do Rio durante a pandemia de Covid – 19. 

Como jornalista que cobriu recentemente a Guerra da Síria e que cobre Israel, Palestina e Campos de Refugiados há 10 anos, posso afirmar que as imagens que recebi ontem são de execuções e massacres como os massacres de Israel contra civis e crianças palestinas em Gaza em 2014.

Não foi um confronto entre forças iguais.

Pessoas foram executadas ontem dentro de suas casas e sentadas em uma cadeira.

Um homem foi morto em um quarto de uma menininha, na casa em que entrou para fugir da morte.

Foi um massacre assustadoramente parecido com os executados por Israel nos últimos anos.

Há muitas perguntas cruciais que os brasileiros precisam fazer nesse momento:

1) Por que Jair Bolsonaro, um homem que defendia abertamente os milicianos quando foi deputado aqui no Rio e cujo filho homenageou o miliciano Adriano da Nóbrega em pleno parlamento carioca, marcou um encontro com o governador Cláudio Castro apenas 12 horas antes da Chacina?

 2) Moro no Recreio dos Bandeirantes, um bairro lindo da Zona Oeste do Rio de Janeiro, bem perto de regiões completamente controladas pela milícia e que recentemente também têm sido invadido por milicianos, policiais militares e civis envolvidos com grilagem e construções ilegais. Por que algumas áreas aqui no Rio, controladas por milicianos ligados ao clã Bolsonaro (a Milicia controla hoje 57% do território do Rio) jamais recebem operações policiais e nem mesmo investigações sérias?

3) Por que em algumas áreas os milicianos se uniram claramente ao tráfico de drogas e criaram um REGIME de APARTHEID RELIGIOSO, como no chamado Complexo de Israel, onde tremula a bandeira de Israel, onde moradores católicos e umbandistas estão sendo expulsos de suas casas por criminosos evangélicos, sem que a polícia consiga realizar uma única operação que possa protegê-los?

 4) Por que a Cidade de Deus, não muito longe do Recreio, passou nos últimos dias por operações violentas, mas a polícia sequer incomodou de fato o grupo de milicianos que age na região?

5) Por que a polícia civil contestou a fala de Mônica Cunha, coordenadora da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, que ressaltou ontem que a operação desrespeitou determinação do Supremo Tribunal Federal (STF) que suspendeu operações policiais em favelas e que o corpo preto foi o que ficou no chão? Não foi exatamente isso o que vimos ontem?

6) Vinte e cinco famílias foram destruídas ontem. Por que a polícia civil não nos conta quantos deles eram traficantes de fato?

7) Com as 25 vidas destruídas na maior chacina da História do Rio de Janeiro o tráfico de drogas deixa de existir a partir de hoje no Jacarezinho?

Lucia Helena Issa é jornalista, escritora e embaixadora da paz por uma organização internacional. Foi colaboradora da Folha de S.Paulo em Roma. Autora do livro “Quando amanhece na Sicília”. Pós-graduada em Linguagem, Simbologia e Semiótica pela Universidade de Roma. Atualmente, vive entre o Rio de Janeiro e o Oriente Médio e está terminando um livro sobre mulheres palestinas que lutam pela paz.

Este artigo não expressa necessariamente a opinião do Jornal GGN

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