As lições do caso de assédio no Quitandinha, por Marc Tawill

Por Marc Tawill, via Linkedin

O linchamento virtual do Quitandinha Bar alerta: é hora de você rever seus conceitos

Como um gerente sexista e despreparado, policiais militares machistas e uma cliente vítima de assédio – consciente de sua liberdade de ação e da força da internet – contribuíram para jogar no limbo a imagem construída ao longo de 25 anos de um dos bares mais tradicionais da zona oeste paulistana, o Quitandinha Bar, da Vila Madalena.

O episódio aconteceu às vésperas do Carnaval e a cliente em questão é a paulista Júlia Velo. Em um longo post no Facebook, Júlia relata que estava com amigos no bar, quando foi assediada por dois frequentadores antigos do local. Daí em diante, o desenrolar da história mistura choro, xingamentos, despreparo e machistas da pior espécie travestidos de clientes, PMs e o gerente da casa. 

O Caso Quitandinha seria mais um dentre tantos de assédio sexual – e moral – a mulheres em bares paulistanos, se Júlia não tivesse prometido a si mesma e aos amigos fazer barulho. A hashtag fala por si só: #vamosfazerumescândalo.

Para azar do bar e sorte daqueles que lutam por uma sociedade moderna e igualitária, o post viralizou. Hoje passa dos 38 mil compartilhamentos e 125 mil curtidas. Em poucas horas, 26 mil homens e mulheres indignados inundaram a FanPage do Quitandinha para avaliar negativamente o bar e deixar o seu repúdio ao caso de assédio e à falta de providências.

O tsunami de avaliações negativas invadiu ainda o Google e o TripAdvisor, além de aparecer nos principais veículos de comunicação. Prejuízo incaculável.

Quando a emenda fica pior do que o soneto

O Quitandinha, claro, teve de se explicar. Como ele se explicou é que foi o problema…

Escrito para apagar um incêndio florestal de grandes proporções com um copo de água, o post soou mal aos ouvidos de quem esperava uma retratação à altura da humilhação sofrida por Júlia e seus amigos:

“…Estranha o fato da pessoa que conta a história não querer assistência como foi dada no momento, estranha a pessoa não querer denunciar o agressor e sim, apenas falar do bar. O bar sempre deu assistência a todos que ali frequentam, o bar não cuida da índole, caráter de pessoas que frequentam e sim da integridade de quem está lá, sempre assessorando quando há alguma ocorrência, que historicamente não tem; também estranha o fato de que quem relatou o ocorrido e quem concordou e compartilhou, não frequentarem o bar!”

Tome 4 mil comentários.

Diante da reação negativa, o Quintadinha voltou a postar:

“Parece que há algum engano na interpretação do texto, quando diz o bar não compactua com isso, não é com o fato relatado e sim com assédio ou qualquer discriminação contra alguém, o bar não compactua com qualquer assédio contra as mulheres, grato pelo compreensão!”

Tome mais 2 mil comentários detonando a retratação.

Novamente, o bar se pronunciou:

“…Dentre os nossos valores, prezamos pela verdade, e por isso, estamos trabalhando para que tudo seja esclarecido de maneira justa, transparente e eficaz! E para que o agressor seja devidamente punido…”

Três mil comentários.

Um quarto post tentou, em vão, colocar panos quentes na situação:

“Clientes e amigos! Queremos que vocês saibam que estamos trabalhando com toda nossa força pra descobrir exatamente o que houve na noite do dia 4 e para responsabilizar os culpados pelo fato acontecido é narrado por Julia Velo e seus amigos… Tenham certeza que os culpados serão responsabilizados. Estamos abertos e queremos ouvir todos os envolvidos no acontecimento…”

Não convenceu. E houve quem pedisse até o fechamento da casa:

O que a grita contra o Quitantinha Bar tem a nos revelar?

O Caso Quitandinha expõe uma ferida aberta que há tempos incomoda homens e mulheres na Vila Madalena, em outros bairros e capitais do Brasil: o mito institucionalizado de que, contra a mulher, tudo pode.

Por isso, o recado das ruas, melhor dizendo, da rede, é tão simples quanto direto: reveja os seus conceitos. Reveja quem você contrata, reveja seu atendimento, sua comunicação, sua ética e suas relações.

Chega de fazer vistas grossas a playboys folgados; chega de babação de ovo a reis do camarote; chega de policiais subservientes; chega de desinformação; chega de misoginia; chega de opressão; chega de machismo.

Poderia o Quitandinha ter evitado esse inferno na terra? 

A resposta é não. Ninguém contrata um gerente esperando que ele acoberte babacas. O bar poderia, porém, ter dado passos que indicassem maior transparência e boa vontade em resolver o imbróglio:

  • Sairia melhor na foto se não postasse no susto notas mal redigidas e sem assinatura 
  • Sairia melhor na foto se desse um rosto ao bar, colocando um sócio em vídeo, desculpando-se ou comentando a acusação de agressão 
  • Sairia melhor na foto se entrasse em contato com as vítimas para conversar decentemente e lhes pedir desculpas públicas
  • Sairia melhor na foto se fosse até a polícia com todos os envolvidos e respondesse por aquilo que está sendo acusado

O empresário Flavio Pires, sócio do Quitandinha e de pelo menos cinco bares da Vila Madalena, afirmou ao G1 que mesmo se confirmarem a denúncia de negligência feita por Júlia após suposto assédio sexual não justificaria a repercussão que o caso teve. Será mesmo?

Dentre as centenas de comentários que li, um me chamou a atenção. Foi de Graça Marinho, rebatendo os vários posts do Quitandinha que citam a tradição da casa na noite paulistana e seus mais 25 anos de atividade:

“Em 25 anos deveriam ter aprendido que mulheres não se calam mais ao serem assediadas e agredidas por ‘machos das cavernas’. Os tempos são outros, queiram ou não os machistas aceitarem”.

Pois é. O mundo mudou e talvez só o Quitandinha não viu.

 

Redação

30 Comentários

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  1. A atitude dos administradores

    A atitude dos administradores do bar foi canhestra! Ameçando inclusive de processo a garota que denunciou.

    Aliás o fato de que uma garota menor de idade pudesse estar no estabelecimento bebendo já demonstra o desapreço pela lei, pela ética.

    A ameaça de processo, é só mais uma face das inúmeras amarra com as quais tentam nos submeter.

    Mas enfim, nenhum dele pode pararo tempo então, a derrota do machismo é inexorável!

    E.T Nesse bar não ponho os pés.

    Luciana Mota.

  2. Pois é. Que coisa chata. A

    Pois é. Que coisa chata. A mulherada resolveu, simplesmente, dar um basta.

    Mas não sei se foi “só o Qitandinha que não viu”: tem muita gente distraída por aí.

  3. Onde estão os pais desta

    Onde estão os pais desta garota que permitem que ela esteja em um bar de bebuns? E a fiscalização??? E o Juizado de Menores?? Está tudo errado!!!!!

    1. Eis um clássico caso de

      Eis um clássico caso de culpar a vítima, de “amarrem as cabras que meu bode esta solto”.

      Pelo fato ocorrido neste buteco, e pelo comentário acima, é que ficamos desanimados com o quão bárbaros ainda somos.

    2. Tudo errado mesmo!

      Paulo Ribeiro, está tudo errado mesmo! A começar pelo seu comentário, que prefere culpar os pais da menina em vez de reconhecer que numa sociedade machista como a nossa, nenhuma mulher está segura. Nenhuma esposa, nenhuma filha – por mais “santas” e “recatadas” que sejam, e por mais reclusas que vivam. 

      No mais, por uma questão de lógica: se é para individualizar um problema que é coletivo e culpar os pais, por que não culpar os pais desses machistas-babacas (perdoe a redundãncia) que assediaram a menina? Que raios de educação foi essa que eles deram para seus filhos?!

       

       

      1. Bi, estamos totalmente de

        Bi, estamos totalmente de acordo. Os rapazes demonstraram grosseria e má educação na abordagem às meninas. Realmente, está tudo errado. Valores morais deturpados, estabelecimento comercial preocupado em ganhar e não fiscalizar a venda de bebidas para os clientese pais omissos em permitir a presença das filhas em locais absolutamente impróprios. Que futuro podemos esperar desta juventude????

    3. De que seculo você

      De que seculo você é?? 

      Existem bares que não são de bebum?

      Onde esta que a menina é de menor?

      Existe fiscalização de machismo em bares?

      Não discute o assunto e ainda quer dar lição de moral nos outros.

       

      Cresça e apareça!

  4. O bar quis ficar bem com os

    O bar quis ficar bem com os fregueses trogloditas, e se deu mal. Bem-feito. Não tem nada de “pós-moderno” nisso.

    Botecos bem mais simples do que esse resolvem na hora esse tipo de conflito. Num que conheço, garotas podem ficar sozinhas se quiserem, ou conversarem em paz com quem quiserem, sem serem incomodadas. Assisti há pouco um bebum desses bem inconvenientes ser advertido pelo pessoal do bar, por assediar uma garota de modo grosseiro. 

    Parou na hora.

  5. Que bom que houve essa reaçao. É preciso dar um basta a isso

    Esse tipo de acontecimento é revoltante. Tomara que o bar leve um senhor prejuízo.

    1. O prejuízo já está ocorrendo.
      O prejuízo já está ocorrendo. Eles ficaram com as portas fechadas no carnaval. Fora o boicote anunciado das mulheres.
      Que sirva como lição para eles e um alerta para os outros donos de bares e restaurantes também

  6. Se a coisa toda ocorreu como

    Se a coisa toda ocorreu como foi descrito no face da moça, a Justiça deve ser acionada e o bar deve identificar os trogloditas, uma vez que são clientes assíduos. Ainda, a Corregedoria da Polícia tb deve ser acionada para identificar, punir e orientar os policiais despreparados que atenderam a ocorrência. É uma baita trabalheira, mas deve ser feito. Quanto ao bar, que a fama adquirida se encarregue de seu futuro.

    1. Não entendi por que deveria

      Não entendi por que deveria reprimir os policiais, sendo que os mesmos informaram para a solicitante que para ser realizado algo, era necessário que a mesma juntamente com seus agressores fossem encaminhados até a delegacia mais próxima, para realização de um Boletim de Ocorrência, como determina a Lei, entendo o sentimento da vitima, mas os policiais não presenciaram nada, impossível prender alguém somente com acusações, o procedimento de conduzir as pessoas para a delegacia é correto, desde que a vitima tenha interesse, o que parece não é o caso, a polícia não pode levar ninguém coercivamente acusado de algo sem um acusador.

  7. Estão certíssimas as meninas!

    Estão mais do que certas essas meninas.

    Danem-se os 25 anos desse barzinho paulista de merda (no Rio, um bar de 25 anos é só mais um que nasceu ontem).

    Enquanto esse bar não mandar esse gerente boçal pra rua e escrachar com nome e sobrenome esses clientes playboys nojentos, ele deve ser linchado até ser fechado.

    Deveríamos, isso sim, é fazer uma campanha com a hashtag #vamosfecharobarmachista.

  8. Eu fui uma das pessoas que

    Eu fui uma das pessoas que compartilhou o texto de Julia Velo. Compartilhei porque o achei crível, mas sempre fico muito cautelosa quando a versão de um fato vem apenas de um lado. Por isso fiquei mais tranquila quando as respostas do Quitandinha começaram a vir, pois dado a falta de preparo para uma situação como esta, as respostas acabaram dando mais credibilidade ao texto de Júlia. A tática de culpar a vítima é sempre a mais utilizada, quando ela é mulher, a maioria acredita na culpabilidade da vítima. 

    Uma das maneiras do bar se defender seria mostrar as imagens daquele dia, mas pelo visto, ou eles não têm as imagens ou tem, mas não querem mostrar porque pode comprometê-los.

    Neste momentos de crise , como do Quitantdinha é necessário umapessoa de cabeça fria para responder, não alguém que bota mais gasolina no fogo que já está alto.

     

  9. BABACAS BAR Gerente babaca acoberta machões babacas

    Quem acoberta babacas, é mais babaca e criminoso, bota o Bolsonaro como gerente, aí a casa vaio encher só de machucado. 

  10. O mundo passou e Carolina não viu, por Renato Janine Ribeiro
      

    Renato Janine Ribeiro

    14 h ·  

    O mundo passou e Carolina não viu…
    O verso de Chico Buarque vem à mente quando vc nota certos atos que eram tolerados até um tempo atrás, e de repente deixam de sê-lo.
    O primeiro caso é o do Bar Quitandinha, em SP, no qual gerente e policiais foram tolerantes com clientes que assediaram duas moças – e ríspidos com elas. Mais de cem mil protestos depois, o Bar fechou para o carnaval. Seu prejuízo pode ser enorme. Uma marca pode ser destruída, simplesmente porque sua gerência ou mesmo seus donos não viram que o mundo mudou, e que ações que antes eram encobertas agora podem gerar reações fortes na sociedade.
    Este é um alerta importante para quem pensa que pode dizer qualquer coisa, sem atentar para as consequências. 
    Ainda há muito machismo, muito desrespeito, mas quem os pratica ou com eles é conivente pode correr riscos sérios. Inclusive no bolso.
    No caso específico, não dá mais para tocar um negócio sem estar alerta a esses riscos. E, melhor do que depois gastar dinheiro com advogado, gestor de riscos e publicitário, é antes disso se preparar para este mundo novo.

     

  11. Esse bar transvestido de

    Esse bar transvestido de boteco sempre foi uma bosta, frequentado por boemios sem cultura.

    Me desculpem os frequentadores, mas viveremos muito melhor se essa bodega fechar.

    Igual a esse tem mais de vinte na vila madalena. A esquina do posto 6 é o exemplo bares cujo os donos são policias e os frequentadores bandidos.

     

  12. Caso Quitandinha.

    Fiquei um pouco decepcionado com a coluna…..Voces que prezam tanto ouvir os dois lados dos casos, comeram bola ao punir antecipadamente o bar Quitandinha, acho que deveriam ao menos uma retificação e um pedido de desculpas.

     

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