Comissão de Anistia solta nota oficial sobre Lamarca

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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Jornal GGN – Na contramão da cidadania, dos direitos humanos, da anistia, da Constituição, do Estado brasileiro, do Direito brasileiro, da nossa história, um juiz do Rio de Janeiro, decidiu anular os atos da Comissão de Anistia, de 2006. Esses atos determinavam o pagamento de uma indenização para Maria Pavan Lamarca, viúva de Carlos Lamarca, e seus dois filhos, num total de R$ 300 mil. Neste mesmo ato foi definido o pagamento de pensão equivalente ao posto de General-de-Brigada para a viúva. O juiz resolveu anular tudo e determinou, ainda, o ressarcimento dos valores já pagos à família, corrigidos monetariamente segundo a variação do IPCA/E e acrescidos de juros. Quem moveu a ação foi o advogado João Henrique Nascimento de Freitas, um dos autores da ação popular que suspendeu o pagamento da indenização para 44 camponeses que foram vítimas de tortura por parte do Exército na guerrilha do Araguaia. A família vai recorrer.

Diante disso, a Comissão de Anistia soltou nota oficial sobre o caso. Leia a seguir. A matéria que trata da decisão do juiz pode ser lida clicando aqui.

Nota oficial da Comissão de Anistia sobre Lamarca

A anistia a Carlos Lamarca, seus dois filhos e sua esposa constitui-se em ato oficial do Estado brasileiro, após rigoroso processo administrativo que também levou em conta decisões judiciais, está integralmente amparada pelo art. 8º do ADCT da Constituição da Republica de 1988 e pela sua regulamentação na Lei n. 10.559/02.

O Direito brasileiro prevê o direito à reparação à todos aqueles que foram atingidos por atos de exceção, na plena abrangência do termo, compreendidos como restrições ao exercício de direitos fundamentais por força do arbítrio autoritário do Estado ditatorial.

A história factual é notoriamente conhecida em torno dos atos de exceção sofridos pela família Lamarca: perseguições políticas sistemáticas, compelimento à clandestinidade, limitação ao direito de identidade, privação de liberdades públicas, difamação e constrangimentos públicos, desrespeito ao direito de resistência contra a opressão, obstáculos sucessivos ao direito a um projeto de vida sem impedimentos por praticas de abuso de poder ou atos institucionais de arbítrio, entre outros.

Por esse motivo, a Comissão de Anistia expressa sua contrariedade e grave preocupação com a judicialização do direito à anistia e à reparação integral (moral, simbólica e econômica). A decisão proferida no caso em concreto coloca em risco o esforço de reconciliação e o progressivo tratamento construído ao largo de 30 anos, por parte dos sucessivos governos democráticos, dos legados autoritários da ditadura militar e das demais questões ainda pendentes da transição democrática.

Neste contexto, qualquer “relativização” do direito à reparação e do direito à anistia ampla, geral e irrestrita para os perseguidos políticos e seus familiares, fere o princípio basilar da responsabilidade do Estado de Direito em indenizar a terceiros prejuízos que ele deu causa e também a compreensão legal da anistia como ato político que se exaure com a decisão do Estado expressa em portaria ministerial.

Solidarizamo-nos por mais esta atribulação impingida à família anistiada e em virtude da importância histórica do caso, a Comissão de Anistia reitera seu agradecimento à AGU que tem realizado com zelo as defesas judiciais das legítimas decisões do Estado brasileiro e que, mais uma vez, saberá recorrer tempestivamente da referida decisão junto às instâncias superiores do Poder Judiciário.

Para que não se esqueça. Para que nunca mais aconteça.

Paulo Abrão

Presidente da Comissão de Anistia

 

 

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

14 Comentários

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  1. É … a cada hora um soco, um direto na boca do estômago,

    um golpe baixo, uma levada às cordas…

    Estão conseguindo, por todos os lados espúrios, levar-nos a nocaute.

    1. Colhemos o que Plantamos

      A substituição das lutas políticas dos trabalhadores por aconchavos com os partidos de direita, seitas religiosas e a tolerância para com os agentes do capital, acordos esses traídos continuamente pela direita desaguam nessa situação de apatia dos trabalhadores e descrédito nas lideranças oportunistas. Os únicos que poderiam politicamente enfrentar a diretização de todo o processo mundial , os trabalhadores estão sem direção, mas não há que perder as esperanças.

      Nocauteados não seremos nunca! Mais dor e sangue será cobrada de nossas forças e da Humanidade, mas não há alternativa se não lutar continuamente contra a barbárie e a destruição da Cultura da Humanidade.

      Força, companheiro, mudemos nossos comportamentos e Unamo-nos. 

  2. Isso é reflexo do

    Isso é reflexo do fortalecimento dos ultraconservadores no cenario político nacional. Os movimentos e entidades sociais simplesmente não conseguem reagir pois não conseguem se atualizar; os discursos e a mentalidade parecem ter saído da decada de 1980. A comunicação com a população se limita as redes sociais que são mais dominadas pelos radicais de direita. A esquerda nunca baixou a guarda quando não tinha o comando, por que está fazendo isso agora que tem?

  3. Efeito “Sergio Moro”.

    Vivemos momentos de um voluntarismo judicial que beira a insegurança jurídica.

    Não há mais fundamentos jurídicos, jurisprudência, doutrina ou ato jurídico perfeito. A própria lei é aquilo que o juiz decidir que ela é. A leitra e o espírito das leis podem ser torcidos segundo o intendimento pessoal do juiz.

    Ora, se Moro pode inverter ponto basilar do direito, fazer valer a presunção de culpa e com isso ser premiado, porque outros juizes das cortes inferiores deixariam de fazê-lo.

    E assim, tome-se juiz de primeira instância anulando asilo concedido por Presidente da República e desfazendo decisão do STF. E, agora, juiz anulando ato que já está realizado há 9 anos.

    O que espanta é o silêncio das Cortes superiores. Estão acuadas.

  4. Fim da anistia para os assassinos da ditadura militar

    Ha alguns dias um dos trolls reinantes do blog chamou Maringhella, Lamarca e todos que lutaram contra a ditadura civil-militar de assassinos e os igualou aos torturadores-assassinos do regime. Até ai, nada de mais, não fosse o fato dele ganhar todas as suas estrelas e apesar de meu protesto, continuar prestigiado em sua opinião de comparar a luta de uns com a crueldade de um regime muito mais poderoso que eles. 
     

     

  5. Justiça tupiniquim

    Eu ainda não entendi como funciona a Justiça neste país. Uma decisão soberana, provinda da Constituição, pode ser derrubada, e após anos, por um qualquer juiz ou promotor?

    Alguém explique, porquê não dá para entender.

  6. decisão é nula

    a sentença desse juiz ordinário, em sentido amplo, é nula.

    ele não tem competência para isso, e mostra um claro aparelhamento do judiciário brasileiro por fascistas.

    esse julgado é um escárnio à constituição federal e também à sociedade, que despreza os golpistas de 64: figuras infames que não se furtaram apenas a emporcalhar as fardas que vestiam para, alegremente e de cócoras, servirem de capachos onde os interesses transnacionais limparam suas botas, mas, também, trairem a pátria pelo dinheiro imundo que receberam de potência estrangeira.

    gente reles; barata e desprezível, que nomeia diversos logradouros brasil afora porque neste país se homenageia a canalhice.

  7. Anistia ampla e irrestrita

    A Lei 6.683/79, alterada pela Lei 10.559/02 concedeu anistia política ampla e irrestrita. Significa dizer que o benefício alcançou tanto os colpistas quanto os insurgentes. Ora, uma vez anulada, por decisao judicial – sabe-se lá com qual inspiração –  a reparação civil e promoção, “pos mortem”, de uma oficial das Forças Armadas insurgente, por simetria, as reformas, aposentadoria e pensões dos militares, de seus dependentes, dos policiais e dos civis que tenham cometido crime contra a humanidade, deverão também ser anuladas, caçadas ou revistas. Ou então estaremos diante de um Justiça de dois pesos e duas medidas.

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