Em Roraima, preso sem condenação avisou esposa sobre chacina

 
Jornal GGN – Abel Paulino Sousa, que estava preso na Penitenciária Agrícola de Monte Cristo, em Roraima, alertou sua mulher sobre o massacre que deixou 33 mortos na última semana.
 
De acordo com a Folha de S. Paulo, Paulino enviou mensagem dizendo “acho que vão matar gente aqui hoje. Tá tudo estranho. Se eu for, amo vocês todos”. O detento foi umas das 16 vítimas decapitadas no massacre. 
 
Sousa ainda não havia sido condenado pela Justiça, assim como outros cinco presos que foram mortos. O detento  foi enviado para Monte Cristo porque a cidade de Boa Vista não tem um local específico para presos provisórios.

 
 
Leia mais abaixo: 
 
Da Folha
 
Preso sem condenação alertou a mulher sobre massacre em Roraima
 
Rubem Valente e Marlene Bergamo 
 
“Acho que vão matar gente aqui hoje. Tá tudo estranho. Se eu for, amo vocês todos. Amor, tá estranho aqui”. Essa foi a mensagem que o detento Abel Paulino de Sousa enviou à sua mulher, por celular, no último dia 5.
 
Naquela mesma noite, a facção criminosa PCC, segundo o governo estadual, matou 33 homens na Penitenciária Agrícola de Monte Cristo, em Boa Vista (RR).
 
Sousa está entre os 16 que foram decapitados. Ele foi enterrado no domingo (8), no mesmo dia em que completaria 25 anos de idade.
 
Como Sousa, outros cinco detentos morreram sem terem sido condenados pelo Judiciário. Estavam presos por decisões preventivas que ainda poderiam ser revistas.
 
A Folha localizou o inquérito de Sousa. Sem condenação anterior e sem passagem no sistema prisional de Roraima, ele havia chegado à penitenciária apenas um mês antes de sua morte.
 
O pesadelo para a família começou quando ele foi preso por policiais civis de Boa Vista na tarde do dia 5 de dezembro, com Francisco Wilami Souza de Oliveira, 39, e Marizete Almeida, 26. Um adolescente também foi apreendido. Oliveira e Marizete admitiram à polícia que já haviam sido presos sob suspeita de tráfico de drogas.
 
A polícia apresentou à Justiça 5,2 kg de pasta-base de cocaína, 391 gramas de crack, 412 gramas de cocaína em pó e 147 gramas de maconha.
 
Nesse ponto, o inquérito guarda uma contradição. Nas guias que acompanham a droga para o exame no Instituto de Criminalística, consta que ela foi apreendida “em poder” dos três presos.
 
Nos depoimentos prestados pelos policiais civis responsáveis pela prisão, porém, a história é diferente.
 
O agente da Polícia Civil Elias Magalhães disse que “a maior parte da droga estava na casa de Wilami; outra parte estava na casa do adolescente”. Acrescentou, porém, que “presenciaram quando Sousa deixou a droga na residência do adolescente”. Não há prova nos autos que comprovem essa afirmação.
 
Os policiais afirmaram que “informações indicavam” que Sousa “estava recebendo ordens para cuidar da droga” que vinha da Venezuela -também não há, no inquérito, a fonte das informações. Um policial ainda diz que apenas “uma pequena porção” da droga fora encontrada com Sousa, além de R$ 800 em seu bolso.
 
No único e curto depoimento que prestou à polícia, de uma página, Sousa disse que não entregou droga a outras pessoas e que não sabia da droga que estava com Oliveira, a quem conhecia apenas “da rua”.
 
Na audiência de custódia, no dia seguinte à prisão, Sousa afirmou que já fora apenas detido em janeiro passado “por envolvimento com drogas”, mas liberado em seguida e nunca condenado.
 
Ex-montador de móveis, Sousa disse à polícia que estava desempregado, estudara até o ensino médio e era pai solteiro de dois filhos. Afirmou ainda que não possuía bens nem dinheiro em conta bancária.
 
O cenário se complicou para Sousa, porém, quando Oliveira o acusou de ter sido um intermediário de entrega da droga trazida por “um venezuelano”. O adolescente também disse que recebeu de Sousa 500 gramas de cocaína para revenda.
 
Na audiência de custódia, Sousa não conseguiu convencer a juíza Suelen Silva Alves de que poderia responder ao processo em liberdade. Ela viu risco à ordem pública e converteu a prisão em flagrante para preventiva, sem prazo fixo para acabar, mas que poderia ser revista ao final do inquérito policial.
 
Como Boa Vista não tem um presídio específico para presos provisórios, Sousa foi enviado pelo governo para uma ala da penitenciária agrícola.
 
Parceiro de inquérito, Wilami Oliveira teve um fim igualmente trágico. Em 19 de dezembro, foi encontrado morto por enforcamento em uma cela da mesma unidade.
 
A família de Sousa disse à Folha que ele não pertencia a nenhuma facção criminosa e sempre negou a acusação de tráfico. No processo, ele ainda não havia conseguido recorrer da decisão da juíza e, oficialmente, continuava sem advogado, sendo representado pela Defensoria Pública, que atende pessoas com renda mensal inferior a três salários mínimos.
 
No dia 5 de janeiro, após ter recebido as mensagens preocupantes de Sousa sobre uma morte iminente, sua mulher tentou confortá-lo. “Por que você tá falando isso, você acha que é você?”
 
Sousa respondeu: “Sério, amor. Tô achando que sou eu. Se eu não te mandar mais mensagens, você não manda mais não, tá bom? Tô com medo, amor”. 
Redação

3 Comentários

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  1. A vítima cumpria pena de vida

    É mais fácil condenar quem já cumpre pena de vida. O Anarquista sério lavou as mãos dos sanues dos presidiários em outro post. Ele disse que a carnificina não é o maior problema, pois o problema é o que morre dentro de nós enquanto vivemos.

    Na música Classe Média, o Max Gonzaga diz:

    “Se o traficante é quem manda na favela
    Eu não “tô nem ai”
    Se morre gente ou tem enchente em itaquera
    Eu quero é que se exploda a periferia toda
    Toda tragédia só me importa quando bate em minha porta
    Porque é mais fácil condenar quem já cumpre pena de vida”.

    O Anarquista Sério e a OAB, que se indignou com o Ministro da Justiça (imagina se fosse Ministro da Guerra) porque ele defendeu a gravação das audiências dos advogados com seus clientes mas nada disse acerca da afirmação do referido Ministro segundo a qual está tudo sobre controle pois foram mortos 99 pessoas mas ainda há mais de 600 mil presos vivos, só se importam com as tragéidas quando elas atingem suas bundas.

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