José Dirceu, o dobro ou nada

Sérgio Moro condenou José Dirceu a 20 anos e 10 meses pelos crimes de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e organização criminosa. Ao reapreciar o caso, o relator do TRF-4 decidiu impor uma pena maior: 41 anos e 15 dias de prisão. A enorme discrepância entre as duas penas é evidente. Mas as regras que devem balizar a definição da pena imposta ao réu são as mesmas.

CAPÍTULO III
DA APLICAÇÃO DA PENA

        Fixação da pena

        Art. 59 – O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e conseqüências do crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

        I – as penas aplicáveis dentre as cominadas;(Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

        II – a quantidade de pena aplicável, dentro dos limites previstos;(Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

        III – o regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade;(Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

        IV – a substituição da pena privativa da liberdade aplicada, por outra espécie de pena, se cabível. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

        Critérios especiais da pena de multa

        Art. 60 – Na fixação da pena de multa o juiz deve atender, principalmente, à situação econômica do réu. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

       § 1º – A multa pode ser aumentada até o triplo, se o juiz considerar que, em virtude da situação econômica do réu, é ineficaz, embora aplicada no máximo. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

        Multa substitutiva

       § 2º – A pena privativa de liberdade aplicada, não superior a 6 (seis) meses, pode ser substituída pela de multa, observados os critérios dos incisos II e III do art. 44 deste Código.(Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

        Circunstâncias agravantes

        Art. 61 – São circunstâncias que sempre agravam a pena, quando não constituem ou qualificam o crime:(Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

        I – a reincidência; (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

        II – ter o agente cometido o crime: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

        a) por motivo fútil ou torpe;

        b) para facilitar ou assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de outro crime;

        c) à traição, de emboscada, ou mediante dissimulação, ou outro recurso que dificultou ou tornou impossível a defesa do ofendido;

        d) com emprego de veneno, fogo, explosivo, tortura ou outro meio insidioso ou cruel, ou de que podia resultar perigo comum;

        e) contra ascendente, descendente, irmão ou cônjuge;

        f) com abuso de autoridade ou prevalecendo-se de relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade, ou com violência contra a mulher na forma da lei específica; (Redação dada pela Lei nº 11.340, de 2006)

        g) com abuso de poder ou violação de dever inerente a cargo, ofício, ministério ou profissão;

        h) contra criança, maior de 60 (sessenta) anos, enfermo ou mulher grávida; (Redação dada pela Lei nº 10.741, de 2003)

        i) quando o ofendido estava sob a imediata proteção da autoridade;

        j) em ocasião de incêndio, naufrágio, inundação ou qualquer calamidade pública, ou de desgraça particular do ofendido;

        l) em estado de embriaguez preordenada.

        Agravantes no caso de concurso de pessoas

        Art. 62 – A pena será ainda agravada em relação ao agente que: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

        I – promove, ou organiza a cooperação no crime ou dirige a atividade dos demais agentes; (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

        II – coage ou induz outrem à execução material do crime; (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

        III – instiga ou determina a cometer o crime alguém sujeito à sua autoridade ou não-punível em virtude de condição ou qualidade pessoal; (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

        IV – executa o crime, ou nele participa, mediante paga ou promessa de recompensa.(Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

        Reincidência

        Art. 63 – Verifica-se a reincidência quando o agente comete novo crime, depois de transitar em julgado a sentença que, no País ou no estrangeiro, o tenha condenado por crime anterior. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

        Art. 64 – Para efeito de reincidência: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

        I – não prevalece a condenação anterior, se entre a data do cumprimento ou extinção da pena e a infração posterior tiver decorrido período de tempo superior a 5 (cinco) anos, computado o período de prova da suspensão ou do livramento condicional, se não ocorrer revogação; (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

        II – não se consideram os crimes militares próprios e políticos.(Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

        Circunstâncias atenuantes

        Art. 65 – São circunstâncias que sempre atenuam a pena: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

        I – ser o agente menor de 21 (vinte e um), na data do fato, ou maior de 70 (setenta) anos, na data da sentença; (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

        II – o desconhecimento da lei; (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

        III – ter o agente:(Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

        a) cometido o crime por motivo de relevante valor social ou moral;

        b) procurado, por sua espontânea vontade e com eficiência, logo após o crime, evitar-lhe ou minorar-lhe as conseqüências, ou ter, antes do julgamento, reparado o dano;

        c) cometido o crime sob coação a que podia resistir, ou em cumprimento de ordem de autoridade superior, ou sob a influência de violenta emoção, provocada por ato injusto da vítima;

        d) confessado espontaneamente, perante a autoridade, a autoria do crime;

        e) cometido o crime sob a influência de multidão em tumulto, se não o provocou.

        Art. 66 – A pena poderá ser ainda atenuada em razão de circunstância relevante, anterior ou posterior ao crime, embora não prevista expressamente em lei. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

        Concurso de circunstâncias agravantes e atenuantes

        Art. 67 – No concurso de agravantes e atenuantes, a pena deve aproximar-se do limite indicado pelas circunstâncias preponderantes, entendendo-se como tais as que resultam dos motivos determinantes do crime, da personalidade do agente e da reincidência. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

        Cálculo da pena

        Art. 68 – A pena-base será fixada atendendo-se ao critério do art. 59 deste Código; em seguida serão consideradas as circunstâncias atenuantes e agravantes; por último, as causas de diminuição e de aumento. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

        Parágrafo único – No concurso de causas de aumento ou de diminuição previstas na parte especial, pode o juiz limitar-se a um só aumento ou a uma só diminuição, prevalecendo, todavia, a causa que mais aumente ou diminua.(Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

        Concurso material

        Art. 69 – Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não, aplicam-se cumulativamente as penas privativas de liberdade em que haja incorrido. No caso de aplicação cumulativa de penas de reclusão e de detenção, executa-se primeiro aquela. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

        § 1º – Na hipótese deste artigo, quando ao agente tiver sido aplicada pena privativa de liberdade, não suspensa, por um dos crimes, para os demais será incabível a substituição de que trata o art. 44 deste Código. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

        § 2º – Quando forem aplicadas penas restritivas de direitos, o condenado cumprirá simultaneamente as que forem compatíveis entre si e sucessivamente as demais. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

        Concurso formal

        Art. 70 – Quando o agente, mediante uma só ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não, aplica-se-lhe a mais grave das penas cabíveis ou, se iguais, somente uma delas, mas aumentada, em qualquer caso, de um sexto até metade. As penas aplicam-se, entretanto, cumulativamente, se a ação ou omissão é dolosa e os crimes concorrentes resultam de desígnios autônomos, consoante o disposto no artigo anterior.(Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

        Parágrafo único – Não poderá a pena exceder a que seria cabível pela regra do art. 69 deste Código. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

        Crime continuado

        Art. 71 – Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes da mesma espécie e, pelas condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes, devem os subseqüentes ser havidos como continuação do primeiro, aplica-se-lhe a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, aumentada, em qualquer caso, de um sexto a dois terços. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

        Parágrafo único – Nos crimes dolosos, contra vítimas diferentes, cometidos com violência ou grave ameaça à pessoa, poderá o juiz, considerando a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias, aumentar a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, até o triplo, observadas as regras do parágrafo único do art. 70 e do art. 75 deste Código.(Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

        Multas no concurso de crimes

        Art. 72 – No concurso de crimes, as penas de multa são aplicadas distinta e integralmente. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

        Erro na execução

        Art. 73 – Quando, por acidente ou erro no uso dos meios de execução, o agente, ao invés de atingir a pessoa que pretendia ofender, atinge pessoa diversa, responde como se tivesse praticado o crime contra aquela, atendendo-se ao disposto no § 3º do art. 20 deste Código. No caso de ser também atingida a pessoa que o agente pretendia ofender, aplica-se a regra do art. 70 deste Código.(Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

        Resultado diverso do pretendido

        Art. 74 – Fora dos casos do artigo anterior, quando, por acidente ou erro na execução do crime, sobrevém resultado diverso do pretendido, o agente responde por culpa, se o fato é previsto como crime culposo; se ocorre também o resultado pretendido, aplica-se a regra do art. 70 deste Código.  (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

        Limite das penas

        Art. 75 – O tempo de cumprimento das penas privativas de liberdade não pode ser superior a 30 (trinta) anos. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

        § 1º – Quando o agente for condenado a penas privativas de liberdade cuja soma seja superior a 30 (trinta) anos, devem elas ser unificadas para atender ao limite máximo deste artigo. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

        § 2º – Sobrevindo condenação por fato posterior ao início do cumprimento da pena, far-se-á nova unificação, desprezando-se, para esse fim, o período de pena já cumprido.(Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

        Concurso de infrações

        Art. 76 – No concurso de infrações, executar-se-á primeiramente a pena mais grave. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

O roteiro a ser seguido pelos juízes no ato de fixação da pena é rígido. Eles não podem deixar de cominar pena para o crime que julgaram ter sido provado, mas não devem impor uma pena maior ou menor do que aquela que foi fixada pelo tipo penal aplicável à conduta do réu. A existência de circunstâncias agravantes ou atenuantes deve ser sopesada, bem como a vida pregressa do réu e sua periculosidade.

Como cada tipo penal prescreve uma pena mínima e uma pena máxima, o legislador possibilitou a cada juiz alguma subjetividade ao impor a pena, mas a margem é pequena. Dois juízes podem discordar sobre qual a pena deve ser imposta num caso concreto, mas as discrepâncias raramente são da ordem que vimos no caso de José Dirceu.

Ao dobrar a pena de José Dirceu, o TRF-4 disse que Sérgio Moro não sabe calcular penas. Isto é grave, muito grave. Como diabos o galã lavajateiro conseguiu passar num concurso e ser empossado no cargo de juiz? Uma segunda hipótese pode ser formulada. Se admitirmos que Sérgio Moro fixou a pena corretamente o erro foi cometido pelos membros do TRF-4. Neste caso, me parece evidente que os desembargadores que dobraram a pena do líder petista deveriam estar vendendo pipocas num parque. Eles não estão em condição de revisar os processos criminais julgados na primeira instância.

Suponhamos, porém, que a razão esteja com a defesa de José Dirceu e não com aqueles que o condenaram. Se o STJ ou o STF absolverem José Dirceu dos crimes reconhecidos por Sérgio Moro e pelo TRT-4, o dobro de pena se transformará em nada. Mesmo assim o pobre réu terá sido trancafiado por uma grande temporada. A justiça que tarda não é justiça, mas a injustiça rapidamente imposta ao réu pelo Estado é muito pior. Não teria sido melhor deixá-lo em liberdade enquanto a sentença condenatória ou absolutória aguardava o transito em julgado?

A vida é o maior bem tutelado pelo Direito. Depois dela, a liberdade individual é certamente o bem que tem mais valor jurídico. Mesmo que seja considerada valiosa a propriedade tem um valor relativo, pois ela deixa de ter qualquer utilidade quando seu dono está preso. Vem daí a certeza que os juristas tem de que a prisão deve ser imposta como medida extrema. A restrição da liberdade individual não pode ser atribuída quando há qualquer dúvida razoável em benefício do réu. É absolutamente irrefutável a necessidade das penas serem cumpridas somente depois que não existir nenhuma possibilidade de reforma da condenação. 

Fábio de Oliveira Ribeiro

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