O mundo como um imenso presídio sem Lei, por Fábio de Oliveira Ribeiro

O mundo como um imenso presídio sem Lei

por Fábio de Oliveira Ribeiro

Hoje a Declaração Universal dos Direitos Humanos fez 70 anos. Impossível não lembrar nesta data os três problemas evidentes do Brasil nesse momento: a letalidade das PMs; o aumento descontrolado do encarceramento e; o tratamento desumano dos presidiários. Essas três questões são abordadas no livro BR 111 – a rota das prisões brasileiras, Fábio Mallart e Rafael Godoi [orgs.], editora Veneta, São Paulo, 2017

A realidade deprimente do Sistema de Justiça brasileiro (que se recusa a respeitar os direitos garantidos aos detentos pela CF/88, pela Lei de Execuções Penais e pelas convenções internacionais subscritas pelo Brasil) e do Sistema Carcerário (cuja missão programática é desumanizar e barbarizar os prisioneiros, destruindo-os física mentalmente) comprovam uma das afirmações mais contundentes do livro Sociedade sem Lei.

A partir da realidade neoliberal, a ‘segurança pública’ tornou-se mais uma mercadoria a ser explorada. Interesses políticos e econômicos somados à tradição autoritária em que está inserida a sociedade brasileira (que acredita no uso da força como solução mágica) forjam políticas de segurança que violam direitos e garantias fundamentais. O medo da população é utilizado, sem pudor, para justificar arbítrios e gerar lucro.” (Sociedade sem Lei, Rubens R.R. Casara, editora Civilização Brasileira, Rio de Janeiro, 2018, p. 146)

Um pouco adiante, Casara afirma que:

…No caso da segurança pública, não há planificação adequada, coordenação ou refinamento de análise das poucas informações produzidas sobre a criminalidade real, o que não permite compreender o contexto, a complexidade e a regularidade dos conflitos, indispensáveis à formulação de políticas públicas sérias e capazes de modificar uma dada realidade.” (Sociedade sem Lei, Rubens R.R. Casara, editora Civilização Brasileira, Rio de Janeiro, 2018, p. 146)

A vitória eleitoral e posse de Jair Bolsonaro reforçará os três problemas referidos no início, cujos fundamentos históricos, culturais, políticos e econômicos foram referidos Rubens R.R. Casara. O autor de Sociedade sem Lei finda seu livro nos convocando a ter esperança. Segundo ele “Resgatar as energias utópicas passa, então, por afastar a neblina ideológica” (Sociedade sem Lei, Rubens R.R. Casara, editora Civilização Brasileira, Rio de Janeiro, 2018, p. 163). O pragmatismo realista nos obriga, porém, a antever tempos sombrios.

Uma das primeiras coisas que Michel Temer fez ao assumir o poder após o golpe “com o Supremo com tudo” foi começar a reconstruir o infame SNI. A vigilância política e ideológica na internet já é uma realidade. Em razão de sua história pessoal e política, Jair Bolsonaro provavelmente expandirá a vigilância virtual dos cidadãos brasileiros. Sempre que um governo ou governante encara uma parcela da população como “inimigo interno” o monitoramento policial de toda a população se torna indispensável, gigantesca e opressiva. Foi exatamente isso o que ocorreu nos EUA.

Se tudo o que é bom para os EUA é bom para o Brasil (como dizem os formuladores da política externa bolsonariana), a consequência lógica necessária é que o Grande Irmão construído na era Bush Jr. ganhará um Pequeno Irmão brasileiro. Nesse sentido, estamos mais próximos da concretização de uma distopia do que da restauração da democracia em razão do resgate das energias utópicas. 

Os presídios construídos nos últimos anos utilizam todas as técnicas modernas para monitorar os detentos. Sob a égide do Grande Irmão bushiano todos os usuários de internet passaram a ser monitorados como se estivessem confinados num presídio planetário. Os detentos podiam desfrutar as regalias da prisão domiciliar, mas se despertassem o interesse dos analistas da NSA eles reverteriam ao regime fechado (caso dos cidadãos norte-americanos processados por atividades consideradas hostis na internet) ou simplesmente assassinados com mísseis AGM-114 Hellfire disparados por Drones que passeavam pelos céus do Afeganistão e Paquistão. 

À medida que a distopia bolsonariana “com o Supremo com tudo” começar a funcionar os brasileiros ficarão na mesma situação que os norte-americanos estavam antes de Snowden vazar informações sobre a NSA, mas existem algumas agravantes. Nossas prisões domiciliares são mais pobres, nossos juízes são menos confiáveis, nossos jornalistas só são valentes quando exigem a condenação e a prisão de petistas inocentes, nossos presídios são mais horripilantes e nossa polícia é mundialmente conhecida por sua letalidade. 

O espaço para a distopia bolsonariana funcionar já existe. Não será preciso fazer uma upgrade urbana, judiciária, política e econômica. O Brasil era o país do futuro, mas o nosso futuro será aquele referido por George Orwel na sua famosa entrevista

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Fábio de Oliveira Ribeiro

1 Comentário

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  1. A concretização da distopia

    A concretização da distopia tupiniquim dependerá da abrangência da gestapo de Moro. Logo nos primeiros meses de 2019 seremos apresentados ao pequeno IRMÃO.

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