Transexuais reclamam de preconceito no Enem

Da Agência Brasil

A citação da célebre frase da filósofa Simone de Beauvoir “ninguém nasce mulher: torna-se mulher”, escrita em uma das perguntas do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), contrastou com o tratamento recebido por alguns transexuais que fizeram a prova neste sábado (24), no Rio de Janeiro.

Estudantes do cursinho Prepara, NEM!, tiveram o nome social (que corresponde à identidade de gênero) deixado de lado, foram obrigadas a usar banheiro de deficientes e contam que se sentiram humilhadas.

Lara Lincon Milanez Ricardo é uma das 278 transexuais e travestis que solicitaram o uso do nome social no Enem – número três vezes maior que em 2014. No Rio de Janeiro, foram 33 solicitações de atendimento pelo nome social, de acordo com o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), responsável pela aplicação das provas. 

Em Duque de Caxias, no Centro Integrado de Educação Profissional 320, onde fez a prova, ela conta que os fiscais não sabiam orientar sobre a assinatura na lista de presença, se devia ser como na identidade ou não e a deixaram constrangida.

“A coordenadora e a fiscal começaram a falar abertamente, na frente de todo mundo, ‘ele mudou de nome, agora se chama Lara’ e ficaram se referindo a mim no gênero masculino”, reclamou.

A situação se agravou, segundo ela, quando uma das fiscais pediu para que Lara corrigisse a assinatura: “Ela disse ‘ah, meu filho, você não pode assinar nome fictício aqui’. Reparei em volta todo mundo olhando para minha cara. Fiquei apavorada”, desabafou.

 

Quem também deixou a prova relatando discriminação foi Tyfany Stacy. Ela disse que foi humilhada por fiscais e encaminhada para o banheiro de deficientes e não para o feminino, na Universidade Estácio de Sá, campi Norte Shopping, na zona norte do Rio.

“Tenho cabelo na cintura, prótese de 400 mililítros nos seios, 113 centímetros de bumbum e nenhum pelo no rosto. Vou ter que aumentar minha silhueta para ser reconhecida como [mulher] trans? Perguntei para a coordenadora se eu tenho alguma deficiência”, relatou.

Ela disse, ainda, que conseguiu manter a concentração, mas quer evitar a situação no segundo dia de Enem.

“Amanhã [domingo] estarei aqui de novo, vou passar pelos mesmos problemas, frequentar banheiro de deficiente, ser tratado como ‘ele’ e ainda ouvir chacotas?”, questionou.

Já Bárbara Aires, que prestou o Enem na Estácio da Lapa, no centro da cidade, teve uma experiência diferente das colegas de cursinho.

Não passou por nenhum constrangimento, foi chamada corretamente pelo nome social, pôde usar o banheiro feminino e elogiou os fiscais.

No entanto, disse que circulou pela sala uma lista de presença com seus dois nomes, o que não era necessário, avaliou.

“Como eles têm o número de inscrição é de se imaginar que esse número faça referência à minha inscrição com o nome do registro civil e o nome social. Ou seja, com o número, não precisaria vir o meu nome da carteira de identidade na lista para todo mundo ver”, explicou.

O Inep disse, por meio de nota, que as ocorrências serão analisadas. “Todas as ocorrências são relatadas em ata pelo coordenador do local de provas. Posteriormente, todas as atas são encaminhadas para análise do Inep caso a caso”, diz a nota. De acordo com o instituto, a forma de inscrição de transexuais e travestis foi acordada com os movimentos sociais, publicada noedital do Enem 2015 e divulgada pelos meios de comunicação. 

 

*Matéria alterada às 16h45 do dia 25/10 para melhor compreensão do posicionamento do Inep sobre o assunto, no último parágrafo

Redação

3 Comentários

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  1. O preconceito não é do Enem e

    O preconceito não é do Enem e sim das pessoas que estão a frente, estes sçao os discipulos do Bolsonaro e do Feliciano.

  2. Mas em casos assim, de

    Mas em casos assim, de concursos também, deve prevalecer o nome da carteira de identidade, não? Pois senão poderia ter muita fraude, uma pessoa vai lá fazer prova pra outra com o nome diferente da carteira de identidade. Bem complicado a situação, mas se caso eu fosse trans, não me importaria de usar meu nome de nascimento pra assinar uma prova. Quanta bobagem, somos o que somos, não o que nos chamamos. Agora em questão ao banheiro é algo complicado também. Qual seria o limite pra estabelecer que uma pessoa é oposta ao seu sexo de nascimento? A quantidade de plásticas? A convicção? Tempo desde a mudança? Tem que haver bom senso em ambas as partes, pois em todo caso pode criar precedentes perigosos, como por exemplo, um taradão se faz de mulher e entra em banheiros femininos para abusar delas. Essa luta tem que ser para equiparação de direitos apenas, mas os “dois lados” devem ceder.

  3. Bem…no caso o correto é

    Bem…no caso o correto é usar o banheiro para deficientes (o qual inúmeras vezes já usei e não me senti menosprezado por isso. Ou então, criem-se mecanismos legais para a implantação da obrigatoriedade de banheiros ”neutros”.

    Como foi relatado acima, também há o problema de casos de travestis que adotam a postura ”ativa”, sendo que não seria seguro o uso em banheiros femininos, já que o masculino está fora de cogitação.

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