A revolta das elites brasileiras contra a redução das desigualdades, por Marcio Pochmann

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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Com Temer no poder, país retoma políticas econômicas e sociais que aprofundam desigualdades entre brasileiros

© TUCA VIERIA / @OXFAM

da Rede Brasil Atual

A revolta das elites brasileiras contra a redução das desigualdades

por Marcio Pochmann
 

A receita para a redução da desigualdade no capitalismo industrial pode ser sintetizado por três componentes principais. Especialmente a partir do final da segunda grande Guerra Mundial (1939 – 1945), os países industrializados convergiram para a constituição (1) do fundo público ampliado assentado na tributação progressiva, (2) do Estado de bem estar social de cobertura universal e (3) da regulação da relação entre o capital e o trabalho concomitantemente com o estabelecimento do pleno emprego.

Para a ampliação do fundo público, a concentração da tributação sobre os rendimentos da propriedade (juros, lucros, aluguéis e renda da terra) se destacou, aliviando a arrecadação na base da pirâmide social, especialmente sobre os assalariados. O importo de renda, de herança e de riqueza foram os principais instrumentos tributários a contribuir não apenas com a ampliação da receita pública, mas com o efeito corretivo sobre os segmentos dos maiores rendimentos na sociedade.

No caso do Estado de bem estar social coube superar, inicialmente, o antigo Estado mínimo comprometido com apenas as funções de monopólio da tributação, da violência (ação policial e justiça) e da moeda. Assim, a sua constituição representou a universalização da seguridade social, com a garantia dos serviços públicos de boa qualidade (educação, saúde, transporte, saneamento, entre outros) e transferência de renda aos segmentos sociais, especialmente aos pauperizados da população.

Por fim, a regulação das relações entre o capital e o trabalho permitiu que o pleno emprego se realizasse, com o valor do salário mínimo acompanhando os ganhos reais de produtividade. Também a difusão dos contratos coletivos de trabalho pela atuação dos sindicatos favoreceu a proteção dos trabalhadores mais vulneráveis, cuja conquista da estabilidade no emprego foi perseguida pelo repasse da produtividade aos salários.

No Brasil, todavia, a receita de combate à desigualdade terminou ficando no segundo plano. Somente no período democrático iniciado em 1985, que o conjunto de ações mais efetivas terminou sendo aplicadas.

A começar pela Constituição Federal de 1988, responsável por estabelecer as bases do Estado de bem estar social. Com isso, o gasto social que equivalia a 13,5% do Produto Interno Bruto (PIB), em 1985, saltou para 23,4% do PIB no ano de 2014.

Do ponto de vista do combate à desigualdade, os avanços tributários foram praticamente inexistentes, uma vez que a carga do Estado seguiu concentrada na base da pirâmide social brasileira. Os principais tributos em termos de arrecadação do Estado assentam-se no consumo, sendo aqueles mais regressivos possíveis, o que significa dizer que a ampliação do Estado de bem estar social foi financiado pela maior carga tributária paga pelos pobres, não os ricos.

Para a relação entre o capital e trabalho, o salário mínimo se mostrou essencial, especialmente nos anos 2000, com valores reais crescendo acima da média salarial do país. Assim, não apenas os trabalhadores ativos foram favorecidos, como também os inativos beneficiados pela seguridade social.

Tudo isso, contudo, sofre atualmente um revés inquestionável. A elite do país terminou se rebelando contra o modelo de combate à desigualdade social presenciado somente mais recentemente no Brasil.

O governo Temer, porta voz dos interesses da elite revoltada, deságua um conjunto de reformas neoliberais que torna cada vez mais desigual a situação do conjunto dos brasileiros. A classe trabalhadora termina sendo a mais atingida, com o desemprego em alta, o rebaixamento dos salários, o corte nos gastos públicos, especialmente o social, e o fim da previdência social tal como até então se conhecia.

Marcio Pochmann – Professor do Instituto de Economia e pesquisador do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho, ambos da Universidade Estadual de Campinas.

 

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

6 Comentários

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  1. Como que um meio de

    Como que um meio de comunicação pode fazer com que uma parte da sociedade fique com ódio de uma outra parte da sociedade mais inferiorizada financeira mente? Fazendo com que um membro desta parte da sociedade mais inferiorizada financeira mente diga que não conseguirá realizar uma extravagancia com o dinheiro que recebe da parte da sociedade mais abastada. Isso dará a impressão para a parte da sociedade mais abastada, que ela está sendo lesada e portanto ela, como sendo a maior parte da sociedade do país; Será a favor no corte da ajuda para a parte da população mais empobrecida financeira mente, e o dinheiro que iria para esta parte da população que não representa nem um 1% do PIB, irá para os bancos assim como a metade do PIB vai através de políticas fraudulentas de um banco central privatizado pelos bancos privados; mantendo o maior juros do planeta, tendo como justificativa, a inflação. Basta relembrar aquela filmagem da mulher dizendo que não conseguiria comprar uma calça de 300 reais com o valor que recebia do governo para que a sua família não morresse de fome. É um desvalor a vida, assim como a política do aborto. Pelo que eu estou entendendo… As coisas estão acontecendo como o Enéas disse… Estão tentando tirar todos os valores humanos da sociedade e torná-la um robô sem sentimentos ou carências.

  2. Autoimolação

    O Brasil é o país onde a concentração de renda é a maior do mundo e caminha, rapidamente, para ser o mais miserável. Enquanto isso, não se viu e nem se  ouviu nenhuma reclamação da população pela aprovação da PEC 241/55 na Câmara e no Senado. Está mais preocupada se o Sérgio Moro vai ou não prender o Lula . Chegam a fazer correntes de orações para que Deus proteja o Moro, e este  atinja o seu objetivo (prender o Lula). Não dão a miníma se as as ações do Moro e dos procuradores da Lava Jato estão causando, diretamente, desemprego a milhares de brasileiros e nem com os salários de marajás que recebem.

    1. Exatamente por este motivo o

      Exatamente por este motivo o brasileiro foi apontado como um dos povos mais ignorantes do mundo em pesquisa divulgada a semana passada.

      A globo fez muito bem o seu serviço.

  3. a revolta….

    Realmente a lentidão da elite brasileira em se enxergar é gritante. Principalmente da maior de todas, talvez a única, a elite da esquerda. Quer dizer, que como sugere a foto,  a culpa da pobreza destas casas e seus moradores, é das pessoas que pagam fortunas para tentar morar bem:? E principalmente fortunas em impostos e taxas, para goivernos de esquerda corruptos e incompetentes, que retornam muito pouco daquilo que é subtraído da sociedade? Esta foto pode ser d bairro de Paraisópolis, ou favela como gostam de descrever. Na cidade de São Paulo governada há anos pela centro esquerda de psdb a pt. Por que em comunidade estabelecida, não procuraram fazer regularização fundiária, urbanização, ligação de água e esgoto, àreas e praças de lazer, arborização, alargar as ruas, rede eletrica subterrânea ao invés desta aberração de postes e fios pendurados, alguns condominios horizontais baixos para diminuir a concentração de barracos e casebres, arejando o espaço público, porque juntamente com CREA, clubes de engenharia e arquitetura, estagiários e entidades filantrópicas não tentaram melhorar as condições de moradia e urbanismo deste lugar? Tudo isto poderia ter sido feito por governos dito progressistas, socializantes, de trabalhadores ou pela famosa república da Usp. Mais facil é sempre acusar o “fantasma” da tal elite brasileira. O Brasil se explica. E se lamenta. 

  4. E a direita conservadora,

    E a direita conservadora, golpista e hipócrita ainda tem a descaração de dizer que no Brasil a tributação é elevada.

    Gentalha! Gentalha! Gentalha!!!!

    Imposto sobre grande fortunas e sobre transmissão de herança neles!

    Por fim Fora Temer” e Diretas Já!!!

  5. Pochman, com sua

    Pochman, com sua inteligência, está sendo intelectualmente desonesto. Acusa os adversários ideológicos de uma ficçaõ. Ele sabe muito bem que inexiste “revolta contra redução das desigualdades”, seja de quem for.

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