Brasileiro da ONU espera que caso do menino conscientize opinião internacional

Jornal GGN – Paulo Sérgio Pinheiro, sociólogo brasileiro que lidera a Comissão de Inquérito da ONU para os Crimes na Síria, disse esperar que a imagem do garoto sírio, encontrado morto em uma praia da Turquia, gere uma conscientização internacional sobre a situação de milhões de pessoas na Síria.

Segundo Pinheiro, o país tem uma população de 20 milhões de habitantes e oito milhões estão deslocados dentro do país. “Quatro milhões estão em países vizinhos, que já não têm mais condições de receber mais gente, é uma coisa escandalosa”.  Ele diz que a imagem do garoto mostra o desespero dos sírios que fogem do país e espera que Europa supere posições internas contra imigrantes para ajudar a encontrar uma solução para a crise.

Enviado por Gilberto Cruvinel

Do O Globo

‘Espero que imagem do menino sírio conscientize opinião internacional’, diz Paulo Sérgio Pinheiro

Equipe liderada pelo sociólogo brasileiro lançou seu décimo relatório para a ONU sobre a situação na Síria

por Mariana Timóteo da Costa

SÃO PAULO — O sociólogo brasileiro Paulo Sérgio Pinheiro, que lidera a Comissão de Inquérito da ONU para os Crimes na Síria, disse ao GLOBO, de Genebra, esperar que a imagem do menino sírio morto gere mais consciência entre a opinião pública internacional sobre a “situação desesperadora” de milhões de sírios. Segundo Pinheiro, os números que ele e sua comissão vêm expondo há cinco anos já seriam suficientes para isso, mas ainda não se conseguiu atingir uma solução negociada para o fim da guerra. Nesta quinta-feira, em Genebra, a equipe liderada pelo brasileiro lançou seu décimo relatório sobre a situação na Síria, alertando para uma escalada da agressão contra civis.

O que o senhor achou da divulgação dessa imagem do menino? Pode ser um divisor de águas na comoção da opinião pública internacional sobre o conflito na Síria?

Eu espero que sim. Se os números já não fossem suficientes para marcar esta situação… A Síria tem uma população de 20 milhões de habitantes e oito milhões estão deslocados dentro do país. Quatro milhões estão em países vizinhos, que já não têm mais condições de receber mais gente, é uma coisa escandalosa. Só no Líbano, com uma população de 4 milhões, já vivem 1,2 milhão de sírios. Há mais crianças sírias do que crianças libanesas nas escolas primárias do Líbano. Então, se você tomar os números desses que estão tentando chegar à Europa, é um número muito pequeno em relação aos que estão pela região.  

Mas as cenas que têm aparecido, como a desse menino, são muio dramáticas. Ele está bem vestido, tem sapato de qualidade. Mostra que trata-se de uma gente desesperada fugindo. Eu sinceramente espero que na Europa possa superar internamente oposições de partidos xenófobos e contra imigrantes para que ajudem a encontrar uma solução para isso.

E essa solução passa pelo que?

No passado a Europa não acolheu os refugiados das guerras da Indochina? São soluções muito claras, exigem dar vistos humanitários, flexibilizar políticas de admissão humanitária. Há apelos do Unicef, do Acnur. E, mesmo depois dos apelos feitos aos países mais ricos, os fundos não chegam a 30% ou 50% das necessidades das agências. Ouvimos das agências sobre essa insuficiência de recursos.

Felizmente alguns países da Europa e do resto do mundo, como o Brasil, estão tendo a visão de acolher com maior solidariedade esses refugiados. Mas a única solução mesmo para terminar este drama é terminar a guerra. Como não há uma solução militar, as forças estão razoavelmente equilibradas dentro da Síria, ninguém pode hoje ganhar esta guerra. A solução é o entendimento. Caso contrário, isso pode durar cinco, 10 anos, aprofundando o desastre humanitário. Não dá para o mundo ficar assistindo essas cenas de gente naufragando, gente ocupando estações de trem, é uma coisa que não é compatível com o século XXI.

E qual o sofrimento que os grupos envolvidos na guerra síria — governo, grupos rebeldes e Estado Islâmico — perpetuam especificamente às crianças?

No nosso relatório há denúncias de que, do governo aos grupos rebeldes, crianças são usadas para funções de carregador, de transmissor de mensagens. Mas o EI manipula as crianças a um ponto que os outros não fazem: treinam elas para fazer execuções e para participarem do combate. Isso é algo delirante. Além disso, o Estado Islâmico stá refazendo todo o sistema de educação para doutrinar as crianças para se tornarem combatentes, o que são bomba de efeito retardado, à medida que essas crianças se tornam jovens combatentes… E também exportando esses jovens terroristas para a Europa. Ou seja, está sobrando para todo o mundo, ninguém fica ileso nesta guerra. Sem falar nos jovens estrangeiros, de 80 países, já temos notícias, indo se juntar ao EI.

 

as insisto que a violência na Síria não cabe apenas ao EI, e sim a todos os envolvidos. São todas as facções rebeldes da oposição, é o governo sírio. Estão atacando e bombardeando a população civil, que é quem mais sofre. Quem esta morrendo, quem esta fugindo, quem está tendo suas casas destruídas é a população civil. E o estado islâmico é parte dessa responsabilidade. Mas mesmo antes da criação do estado islâmico a guerra da Síria já tinha chegado a um estado dramático e grave. Agora, não dá para países terem uma solução ambígua dizendo que apóiam uma solução politica e ao mesmo tempo apóiam tanto o governo como os grupos rebeldes em termos de armas e recursos para continuarem a guerra e tanta violação. 

O senhor acha que a comunidade internacional acompanha essa amplitude da crise?

No que depender de nós, ninguém pode dizer que não sabe o que está acontecendo. Damos detalhes em todos os nossos relatórios. Já fomos quatro vezes ao Conselho de Segurança, uma vez à Assembleia Geral, aparecemos sempre no Conselho de Direitos Humanos da ONU. Sem falar nos contatos bilaterais que temos sempre com os cinco membros permanentes do Conselho de Segurança, e os países da região. Todos estão absolutamente cientes do que está acontecendo.

Essas fotos, essas cenas bárbaras desses últimos dias são simplesmente uma pontinha do iceberg que ficou mais revelada porque realmente um corpo de um menininho enfiado na areia de uma praia na Turquia pelos pais estarem tentando, com apoio de redes de mafiosos, de pessoas que estão se aproveitando desses horror, levá-los às ilhas gregas.

Acho que esse menininho é um símbolo, é muito candente, de todos os sírios que já estão morrendo nesta travessia para a Europa. Agora a comunidade internacional está levando um choque. Mas é um choque que já deveria ter ocorrido bastante antes. E perdemos muitas possibilidade de terminar esta guerra, é uma coisa que repetimos mais uma vez no relatório.

Redação

2 Comentários

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  1. Até parece que a imprensa


    Até parece que a imprensa internacional, passado o momento de ganhar uns $$ com o sensacionalismo imediato, irá explorar o caso no sentido da consonantização da opinião pública…

  2. Só espero que a classe media

    Só espero que a classe media brasileira crie juizo e não saia a apoiar aventureiros pagos por governos/organismos inrernacionais para agitar a clima politico aqui no Brasil e essa classe media passe a seguir aventureiros que já tem sua grana nos paraisos fiscais. Corremos o risco, como os sirios, de desestabilização e, no futuro não muito distante, sairmos nadando em direção aos USA  ou mesmo à Europa em busca de refugio. Lembre-se que entre esses refugiados não há pobres ou miseraveis. São tipo classe media e com formação universitária.

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