Mesmo com contingenciamento, SDH garante identificação de corpos de Perus

Patricia Faermann
Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.
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O secretário de Direitos Humanos Pepe Vargas garantiu, nesta quarta-feira (19), a continuidade da identificação dos mortos da ditadura, encontrados na Vala Clandestina de Perus, em 1990 
 
 
Fotos: Pedro Garbellini
 
Jornal GGN – Foram mais de 40 dias de interrupção no contrato dos peritos da Equipe de Trabalho de Perus, que deixaram dúvidas se teriam continuidade os trabalhos de identificação dos corpos de desaparecidos políticos encontrados em um dos casos mais emblemáticos do Brasil, a vala clandestina do cemitério de Dom Bosco, em Perus, em São Paulo.
 
A iniciativa que hoje já analisou a biologia de 335 ossadas de 433, incluindo a identificação de gênero, faixa etária e, em alguns casos, o motivo da morte, foi possível graças a uma parceria, iniciada em 2013, da Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania de São Paulo, com o secretário-adjunto Rogério Sottili e a coordenadora de Direito à Memória e à Verdade Carla Borges, do Ministério Público Federal, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), por meio de repasses do Ministério da Educação, e da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência, na figura da então ministra Ideli Salvatti.
 
Pepe Vargas, o novo ministro da SDH, assegurou ao Jornal GGN que as contratações serão mantidas e que a verba para esse projeto está garantida. Também afirmou que o projeto – “agarrado com unhas e dentes” por Idelli, assim anteriormente descreveu a ex-ministra – permanecerá com o mesmo encaminhamento.
 
“Primeiro, o trabalho iniciado pela ministra Idelli continua, tanto que a equipe é a mesma, a única coisa que mudou aqui foi o ministro. Segundo, nós tivemos uma pequena descontinuidade, mas por questões de natureza burocrática”, disse o ministro.
 
O motivo para a paralisação dos contratos de peritos, uma responsabilidade da SDH, foi o atraso para a aprovação do Orçamento da União este ano e, mais recentemente, o contingenciamento realizado para cortar gastos da União. Apesar disso, os trabalhos devem continuar. Contudo, Pepe Vargas não especificou se a interrupção e se a baixa no Orçamento irão interferir na periodicidade e efetividade dos trabalhos.
 
“O Orçamento deste ano foi votado tão somente no mês de abril e até haver o decreto de programação orçamentária chegou-se ao final de maio. Então, tivemos uma pequena descontinuidade, mas o processo de contratação está em curso. E os recursos estão assegurados. Um milhão e 800 mil reais é exclusivamente para a contratação dos peritos, para dar continuidade aos trabalhos dos peritos, e dois milhões de reais são os recursos para a contratação do laboratório que fará a análise de DNA, a contratação internacional”, certificou.
 
https://www.youtube.com/watch?v=9ska_Pa1ydM height:398
 
A declaração foi realizada na coletiva de imprensa que anunciou a transferência de 614 caixas com resquícios ósseos, originários da vala de Perus, mas que estavam no Cemitério do Araçá, na zona oeste de São Paulo. O material foi enviado para a Procuradoria Regional da República, da 3ª Região, em espaço adaptado para o armazenamento com condições adequadas, no último sábado (15). 
 
Foto: Pedro Garbellini
O objetivo é aguardar o término da reforma do laboratório do Centro de Arqueologia e Antropologia Forense, de propriedade da Unifesp, para receber as novas ossadas. A previsão é de quatro meses para o espaço ser finalizado e, oficialmente, seis meses prorrogáveis por mais seis para o envio de todas as caixas com os possíveis desaparecidos políticos.
 
Pepe Vargas lembrou da importância da parceria com a Unifesp, e consequente reporte de recursos do MEC, com a Secretaria de Direitos Humanos e Cidadania de São Paulo, além do próprio MPF, na figura da procuradora regional Eugenia Gonzaga, que é também presidente da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos, dentro da SDH.
 
“Existem recursos que o Ministério da Educação está repassando para a Unifesp para fazer a reforma que, se eu não me engano, o valor é de R$ 500 mil da reforma que o MEC assumiu esse compromisso. E obviamente, de insumos, do pessoal da própria Unifesp que tem recursos também colocados nessa parceria”, assinalou.
 
Os trabalhos dos antropólogos e peritos da Equipe de Trabalho Perus tiveram início em setembro de 2014, quando as primeiras 411 caixas foram transferidas do Cemitério do Araçá ao laboratório e o grupo de profissionais começou a definir as metologias para as identificações. 
 
Quase um ano depois, já um total de 335 caixas foram analisadas e um prévio balanço: cerca de 85% dos corpos são do sexo masculino e 15% de mulheres. Apenas 3% a 4% eram de crianças. Do ponto de vista de motivos da morte, existem traumas compatíveis com atropelamento, em seis ossadas foram identificados sinais de armas de fogo e algumas a partir de uma ação contundente, “que significa que pode ter sido vítima de espancamento, mas em condições que não consegue estabelecer, se foi tortura, se foi uma briga ou acidente”, explicou o perito Samuel Ferreira.
 
“Do ponto de vista antropológico não é possível definir a identidade. Por isso, que essas ossadas serão submetidas a coleta de amostras ósseas para fazer a identificação com exame de DNA”. 
 
Ainda que com os atrasos na renovação dos peritos contratados – uma equipe que inclui, além de brasileiros e integrantes da Cruz Vermelha, profissionais estrangeiros, como peruanos e argentinos -, a previsão de finalizar a primeira parte das análises ainda se mantem no fim de 2016, “no máximo no primeiro trimestre de 2017”, disse o coordenador científico da Equipe, Samuel Ferreira. 
 
Entenda um pouco mais sobre o trabalho realizado com as Ossadas de Perus:
Perus: o desafio de resgatar os mortos sem identidade
Histórico de Perus: “Não é mais possível viver com fantasmas do passado”
Mutirão OSSADAS DE PERUS: A DIFÍCIL TRANSIÇÃO
 
Patricia Faermann

Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.

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