A cultura como negócio

Jornal GGN – Um dos grandes desafios do Brasil nos dias de hoje é dar condições para que os diversos agentes culturais possam empreender. Surgiram as leis de incentivo, mas junto delas verdadeiras redes de advogados se articularam para conseguir viabilizar projetos e captar recursos. Isso acabou favorecendo um número bastante restrito de artistas, que muitas vezes já estavam no circuito cultural, e não garantiu, necessariamente, a entrada de novos players no cenário nacional.

Esse foi um dos temas do 49º Fórum de Debates Brasilianas.org – Mapa da Diversidade Cultural. Na ocasião, a antropóloga e ex-secretária de Economia Criativa do Ministério da Cultura, Cláudia Leitão, lembrou que no último debate entre os candidatos à presidência, realizado na terça-feira (26), pela Band, a palavra “cultura” sequer foi citada. “A reflexão sobre cultura não chega à compreensão dos nossos governantes”, disse.

Ela explicou que o momento atual da economia brasileira é de buscar alternativas de crescimento frente à estagnação do modelo de fomento de consumo de eletrodomésticos, eletroeletrônicos e automóveis. Entre as possibilidades: favorecer a produção e o consumo de cultura nacional.

Mas aí surgem mais alguns problemas. Para que a cultura possa avançar como negócio, é necessário que seus agentes vão além da visão artística e consigam levantar indicadores que sirvam para demonstrar resultados. “Sem demonstrar resultados os agentes culturais não conseguem prestígio, sem prestígio eles não conseguem orçamento, sem orçamento eles não conseguem avançar”, afirmou Cláudia. “Então, continuamos em um círculo vicioso: não fazemos porque não temos e não temos porque não fazemos”.

A solução passa pelo investimento em pesquisa, “Ou as decisões vão continuar a serem tomadas por voluntarismo. Da cabeça dos governantes”, e pela criação de um arcabouço legal estruturante e capaz de pensar as dinâmicas econômicas e os incentivos à cultura. “E isso não é uma única lei que vai fazer”.

Cláudia Leitão afirmou que as ferramentas de financiamento, hoje, enfraquecem o papel do Estado. “O financiamento é a relação dos fundos versus as leis de incentivo. A Lei Rouanet se tornou muito complicada, porque ela perverteu o financiamento de cultura. Para cada um real nos fundos de cultura, há seis nas leis de incentivo. O Estado se tornou o primo pobre”, explicou.

Além disso, grandes artistas têm maior facilidade para aprovar editais. “Maria Bethânia aprovou? Aprovou. Luan Santana aprovou? Aprovou. E aí? Como fica o desenvolvimento dos pequenos? 90% da Lei Rouanet envolve projetos limitados a determinados quarteirões da cidade de São Paulo”, alertou.

No entanto, a situação não é de todo mal. Também presente no Fórum, Luciane Gorgulho, chefe do departamento de Cultura, Entretenimento e Turismo do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), afirmou que “Existe espaço e é importante fomentar tanto a cultura local quanto a indústria cultural, que vai ter impacto no PIB [Produto Interno Bruto] e quebrar aquele círculo vicioso de falta de indicadores”.

Explicou que o importante é entender qual o melhor mecanismo para cada ação cultural. “Às vezes, as pessoas dizem ‘O BNDES não aceitou minhas garantias’. Não é isso. A garantia é algo que você nunca quer usar. Se você quer financiar uma festa de rua, talvez uma lei de incentivo não seja a ferramenta certa pra você, porque ela tem essa dinâmica de dívida – tem que devolver o dinheiro e exige garantias reais”, detalhou.

Ela afirmou, no entanto, que há fartura de recursos. “Os financiamentos para cultura estão crescendo continuamente. De 2006 a 2013, o total de desembolsos do BNDES foi de R$ 1,5 bilhão. Este ano será de mais de R$ 600 milhões”.

E são apenas os grandes que estão conseguindo acesso a esses recursos? De acordo com Marcos André Carvalho, atual secretário de Economia Criativa do Ministério da Cultura, não.

Segundo ela já há ações multiministeriais sendo desenvolvidas. Com o orçamento mais enxuto, o que a gestão atual está fazendo é propor projetos a serem realizados pelo Ministério da Cultura, mas com apoio orçamentário do Ministério da Educação. “O Ministério da Educação carrega um orçamento poderoso – pequeno para a realidade das escolas brasileiras, mas muito superior ao do Ministério da Cultura”.

Uma dessas ações é a chamada Conexão Cultura Brasil, uma provocação do Ministério da Cultura ao Ciência sem Fronteiras que, de acordo com Marcos André, é um programa invejado no mundo, mas com foco exclusivo nas áreas exatas, o que criou uma “ansiedade muito grande nos alunos de humanas”.

O programa se propõe a fazer exatamente o que faz seu irmão rico: promover o intercâmbio acadêmico. A diferença é que, ao invés de engenheiros, os editais que custeiam cursos de graduação e pós-graduação, estágios e residências são para os agentes culturais. Em 2014, o orçamento é de R$ 4 milhões, e vai atender a apenas 40 brasileiros. Mas no ano que vem esse número será dez vezes maior: R$ 40 milhões. E o número de beneficiados também: 4 mil.

O secretário não esconde que o Ministério da Cultura sofre com o atual aperto orçamentário, mas parece confiante de que essa situação irá mudar em breve. De acordo com ele, já existe uma PEC (Proposta de Emenda Constitucional), para aumentar as verbas do Ministério – dos atuais 0,13% de recursos da União para 1%. “Mas nós até preferimos que isso seja feito de forma escalonada. Primeiro com um aumento pra 0,5%, para podermos fazer concursos e ter gente capacitada para tocar as ações”.

Ele também explica que já está acertado que parte dos recursos da Lei Rouanet vai migrar para o Fundo de Cultura, garantindo maior regionalização das ações.

Ainda sobre o desenvolvimento dos agentes culturais, a menina dos olhos do Ministério é a Rede Incubadoras Brasil Criativo, que vem auxiliando no desenvolvimento do empreendedorismo por meio de cursos e consultorias, planejamento estratégico, assessoria contábil, jurídica, de comunicação e marketing, elaboração de projetos e captação de recursos.

Para Marcos André, os agentes culturais precisam ter visão de negócios para desenvolver suas artes de maneira sustentável. “O Brasil precisa perceber a centralidade econômica da cultura. E a cultura deixará de ser a cereja do bolo e passará a ser o fermento”. Como disse Luciane Gorgulho, do BNDES. “A questão não é só o desenvolvimento da cultura. É o desenvolvimento do país por meio da cultura”.

Redação

5 Comentários

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  1. Só gente antenada fazendo seu
    Só gente antenada fazendo seu lobby coincidir com o momento econômico do Brasil.

    A idéia é péssima e a tentativa de associação da medida com a economia do país é absolutamente ridícula.

    Então o dinheiro é para ensinar o artista a ter lucro?
    Não basta ser pintor, tem que vender bem?

    1. Isso?

      Confesso que mesmo trabalhando no Minc não entendo esse “conceito” de econômia criativa. Não entendo porque também a cultura deva ser um negócio. Nossos saberes e fazeres devem ser preservados não para gerar riqueza, e sim para termos nossa identidade e sabermos quem somos e o que poderemos ser. Percebo o alijamento da cultura popular em relação ao entretenimento.

      1. Eu entendo porque conheço

        Eu entendo porque conheço muita gente do ramo e são, em sua maioria, muito despreparados.

        Então, penso eu que inicialmente partiram deste diagnóstico.

        Isso não é para ser uma premissa da Cultura. Cultura e lucro é algo que PODE acontecer mas que não deve ser si ne qua non.

         

        Então, esta iniciativa é igual a de algumas universidades que tem que ensinar ainda matérias de segundo grau devido ao despreparo de seus alunos.

        O despreparo da classe é o despreparo do Brasileiro e a cultura não tem nada que ver com o assunto.

        Despreparo é do Brasil e não da Cultura.

         

      2. Culrura é um bem econômico

        Culrura é um bem econômico que, obviamente, precisa ser explorado de forma a não a ceder tentações apenas de entretedimento. E basta vermos a abertura da copa para sabver do quanto o governo pesita tem vergonha das nossas cultura. O caso mais imoral, proibição das vendedoras de acarajá, aconteceu num govenro petista. Os nossos índios aparecem em trajes dos mais limpo e ocidentais.

  2. Se ha um setor em que os

    Se ha um setor em que os governos petistas erraram foi o da cultura, causando graves consequencias para si proprio e para o pais.

    Pior so a escolha do batman para o STF.

    Assistindo  a esses burocratas da cultura expondo suas ideias constatamos uma total insensibilidade  com relação a complexividade das questões culturais, entendidas por eles apenas como  produtos de mercado.

    Gerir cultura é algo bem mais complicado do que o proposto por esse pessoal, talvez competentes mas para fomentar a venda de ações ou coisas parecidas.

    Um quadro de um grande pintor tem um imenso valor no “mercado”, mas na maioria das vezes não valia nada quando foi produzido.

    É por isso que é delicado e fundamental o papel do governo no fomento a arte.

    A questão é que o PT resolveu inovar no trato da cultura.

    Nunca houve na historia um governo de esquerda com um ministro da cultura de direita.

    Os petistas desafiaram essa logica.

    Ao inves de convidarem um Suassuna ou outro pensador preparado de esquerda,foram chamar o parceiro do artista mais reacionario do pais.

    A direita não enxerga so a economia de seu jeito proprio, mas a cultura tambem.

    Esses burocratas do MINC observam a cultura numa visão de direita, não conseguem ve-la como algo muito alem e diferente de que produtos de “mercado”.

    Dai essa sinistra e perversa mistura entre cultura e entretenimento.

    Os burocratas do MINC ainda não entenderam que são atividades distintas.

    Entretenimento é atividade de industria.

    Produz diversão com fins lucrativos. A TV Globo, por exemplo, industria de entretenimento, não tem por fim produzir arte, mas um produto agradavel que venha gerar lucros.

    O João Gilberto quando fica 24 horas por dia no seu quartinho ensaiando uma musica, ou um pintor em seu atelier se aprofundando em sua obra ou um escritor concebendo um livro tem objetivos totalmente diferentes. 

    É por isso que o incentivo oficial a cultura é fundamental.

    É por isso que a nossa lei de incentivo cultural, promulgada por um governo de direita. e jamais modificada, causa um grande mal ao pais que precisa de cultura, como de saude e educação.

    Mas estamos chegamos num ponto em quemais ninguem “sai as ruas” para pedir “melhoria” na cultura.

    Ja esta se tornou assunto esquecido,sem importancia. Os presidenciaveis nem mais perdem tempo com ele em suas campanhas.

    Resultado.

    Uma juventude alienada que se tornou presa facil para os interesses mais reacionarios.

    E o PT colhendo os resultados de seu engano.

     

     

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