Por Ion de Andrade
Excelentíssimo Sr. Alexandre Barreto de Souza e senhores conselheiros do CADE;
A imprensa vem divulgando a informação de que em janeiro próximo o Conselho Administrativo de Defesa Econômica, o CADE, deverá aprovar sem restrições o fim da EMBRAER por sua fusão minoritária à gigante americana Boeing.
Gostaria de não acreditar nisso, mas estamos num momento particularmente difícil da vida nacional capaz de dar a essa notícia total verossimilhança.
Não quero questionar as questões técnicas, que não conheço, ou a legalidade da operação, vez que provavelmente elas estão cumpridas, dentro do que são as normas reguladoras e as leis no Brasil e é desse escopo normativo e legal que o CADE é guardião.
Porém o CADE é guardião também dos interesses nacionais, que ultrapassam a agenda da tecnicidade, da licitude ou da legalidade.
Nessa grande área onde a tomada de decisões é incomparavelmente mais complexa, e eu gostaria como cidadão tecer algumas considerações em relação ao momento da EMBRAER e da Boeing e em relação aos interesses estratégicos do Brasil, sobre quem recai uma responsabilidade histórica por tratar-se ao mesmo tempo do maior país da América Latina e do maior país de língua portuguesa do mundo, uma singularidade que nos obriga à grandeza e à nobreza. Não somos um país qualquer.
De fato, a perda da EMBRAER representa perante o futuro, na área aeroespacial a triste realidade de que não teremos estado à altura dos nossos antepassados que a ferro e a fogo asseguraram a sua capacidade de inovação e de iniciativa e desenharam o mundo moderno. Estamos bem posicionados, também porque nosso élan pela aviação remonta ao seu criador Alberto Santos Dumont, um brasileiro.
O momento da EMBRAER é brilhante. Empresa inovadora e representante de um ponto de união que reagrupa os mais diversos setores da nação brasileira em torno da ideia de um Brasil à altura das aspirações dos brasileiros e da sua responsabilidade histórica, país que deve ser grande, generoso e respeitado, a empresa, fundada pelos militares desenvolvimentistas sempre foi orgulho da nação.
Dois grandes empreendimentos, certamente dentre muitos outros menos conhecidos, mas certamente capazes de desdobramentos tecnológicos cruciais para o futuro Brasil merecem destaque, o cargueiro C-390, que é o que há de mais moderno em termos de transporte logístico e reabastecimento em vôo e o carro voador, que parece abrir horizontes tão promissores quanto o que Santos Dumont abril em Paris ao voar com o 14 Bis, projeto que posiciona a EMBRAER como destaque internacional, (por favor, clique aqui, aqui e aqui).
Num país periférico como o nosso, a EMBRAER construída sobre a genialidade brasileira galgou, num mercado tecnologicamente dos mais disputados, a condição de terceira maior empresa, superada apenas pela Airbus e pela Boeing. É empresa portanto a defendermos como quem defende a terra pátria pelo que ela já é, mesmo sem considerar o que ela será se permanecer sob comando nacional e não for simplesmente absorvida pela Boeing.
O momento da Boeing, por outro lado é sombrio. Flagrada pelos órgãos de controle americanos em práticas empresariais inteiramente irresponsáveis, segundo diversos analistas, e causadoras da morte de centenas de pessoas em acidentes que ela própria antevia como possíveis, em virtude dos erros de projeto do modelo 737 Max que ela própria conhecia e não divulgou, a Boeing está sendo processada nos Estados Unidos.
A gravidade é tanta que o portal InfoMoney (clique aqui) noticiou artigo de autoria do professor David Spring, da Universidade de Washington, intitulado: “
O texto do professor Spring, reproduzido pelo InfoMoney diz textualmente o seguinte:
“De acordo com o professor Spring, porém, o problema é muito mais profundo: o próprio software problemático só precisou ser construído como uma tentativa de corrigir artificialmente problemas estruturais graves na construção do avião. O jato é, basicamente, ingovernável do ponto de vista aerodinâmico, de acordo com o texto.
Outra grave acusação do relatório é que a Boeing teria excluído propositalmente o MCAS do manual de bordo do avião (mantendo acidentalmente a sigla no glossário do documento) e omitido todas as informações a respeito dos problemas de fabricação da FAA (órgão federal de regulação aérea dos EUA), das companhias aéreas que compraram unidades do modelo e de pilotos.
Para completar, a empresa teria descoberto, em 2016, que o 737 Max era mais perigoso do que antecipado – e aumentado o grau de desvio possibilitado pelo MCAS. No relatório, há imagens que explicam o funcionamento da aeronave com o software em questão).
Para o autor do artigo, quando as autoridades liberarem o uso do 737 Max novamente, é inevitável que ocorra um novo acidente envolvendo a aeronave. “Depois as companhias aéreas se recusarão a comprar o 737 Max e demandar centenas de bilhões em reembolso pelas centenas de 737 já vendidos. Então a Boeing não vai mais existir. A Boeing vai falir”.
Ele continua:
O artigo do InfoMoney se conclui pela seguinte frase: “O InfoMoney entrou em contato com a Boeing em busca de um posicionamento, mas não obteve resposta até esta publicação.”
O momento das duas empresas representa um péssimo negócio para a EMBRAER que pode, se a operação for concluída ser convertida da condição de florão empresarial e tecnológico de um país único no cenário internacional e portador de uma responsabilidade histórica de permanência digna no concerto das nações, à condição de massa falida a ser liquidada para pagar indenizações da Boeing.
Por tudo, isso, em nome do Brasil, peço aos senhores conselheiros do CADE, na figura do Exmo. Sr. Alexandre Barreto de Souza, que suspendam o processo, ao menos até que os destinos da Boeing possam ser conhecidos evitando que ao menos a nossa EMBRAER ameaçada não se converta de uma vez por todas em lixo pela irresponsabilidade de terceiros.
Nesses termos peço deferimento.
Ion de Andrade
Cidadão brasileiro
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