Estreia: Contos do Uirapuru, de como Simplício resolveu entender tudo de economia para poder mudar o mundo

Foto: De como Simplício resolveu entender tudo de economiapara poder mudar o mundo(º)>Simplício é o tipo do sujeito distraído. Só se deu conta de que estava no meio da manifestação de junho em São Paulo quando uma multidão, na Avenida Paulista, começou a empurrá-lo de um lado para o outro levantando cartazes contra o aumento de ônibus e contra a corrupção, por investimentos em saúde e educação, e contra os gastos bilionários superfaturados nos estádios da Copa. Um sujeito, isolado num canto da rua, levantou um cartaz a favor do Neymar. Não chamou muita atenção.Simplício pensou: “Isso parece ser protesto político, misturado com economia e futebol. Tudo muito confuso. Talvez seja assunto para pouca gente, mas quero entender a fundo disso porque aí vêm as eleições. Afinal, eu quero escolher um bom presidente e bons deputados e senadores. ‘Sim, eu posso’, como dizia Obama antes de não poder. Acontece que todo mundo me diz que para votar com segurança tem que entender de economia e de política. Ou não?”, e lhe veio à mente a notável filosofia política de Caetano Veloso.A passeata de São Paulo replicou no Rio, Belo Horizonte e em quase todas as outras capitais. Quanto mais crescia o movimento, mais confuso ficava Simplício. A partir de determinado momento o de que menos se falava era no preço das passagens de ônibus. Na base da improvisação, pedia-se o fim da corrupção e a melhoria dos serviços públicos. Simplício raciocinava: Isso é o que me ensinaram na faculdade como sendo democracia direta. O povo mordeu o freio e decidiu, ele próprio, assumir o governo. Portanto, como se dizia em outros tempos, todo poder aos sovietes. Eia, finalmente estamos no controle! Na medida em que os dias passavam, Simplício sentiu que o fervor democrata das chamadas classes dominantes, inicialmente simpática ao movimento das ruas, foi-se arrefecendo. Afinal, de passeata em passeata vai-se esfacelando a boa vida burguesa. As pessoas têm que trabalhar, têm que circular, têm que estudar, têm que cuidar da vida. Um país inteiro não pode viver em ritmo de cavalaria rusticana o tempo todo. Convencido disso, Simplício colocou para si um desafio gigantesco: descobrir tudo o que está por trás das manifestações populares iniciadas em junho de 2003.Acontece que já lhe haviam dito que para entender os movimentos sociais era importante entender política, e para entender política era importante entender economia. Portanto, resolveu começar por aí. Ouvira falar que os economistas se dividiam em duas grandes seitas, os neoliberais ortodoxos, que ensinavam sua doutrina como sendo o décimo primeiro mandamento, e a dos heterodoxos, mais divertidos por não se subordinarem a dogmas. Então procurou o professor Galileu, conhecido por sua infinita paciência, para que ele o ajudasse a buscar algumas entrevistas esclarecedoras.E foi assim que Simplício se preparou para percorrer o Brasil em busca de ensinamentos definitivos de economia e de política contemporâneas.(º)>

    Simplício é o tipo do sujeito distraído. Só se deu conta de que estava no meio da manifestação de junho em São Paulo quando uma multidão, na Avenida Paulista, começou a empurrá-lo de um lado para o outro levantando cartazes contra o aumento de ônibus e contra a corrupção, por investimentos em saúde e educação, e contra os gastos bilionários superfaturados nos estádios da Copa. Um sujeito, isolado num canto da rua, levantou um cartaz a favor do Neymar. Não chamou muita atenção.

     Simplício pensou: “Isso parece ser protesto político, misturado com economia e futebol. Tudo muito confuso. Talvez seja assunto para pouca gente, mas quero entender a fundo disso porque aí vêm as eleições. Afinal, eu quero escolher um bom presidente e bons deputados e senadores. ‘Sim, eu posso’, como dizia Obama antes de não poder. Acontece que todo mundo me diz que para votar com segurança tem que entender de economia e de política. Ou não?”, e lhe veio à mente a notável filosofia política de Caetano Veloso.

    A passeata de São Paulo replicou no Rio, Belo Horizonte e em quase todas as outras capitais. Quanto mais crescia o movimento, mais confuso ficava Simplício. A partir de determinado momento o de que menos se falava era no preço das passagens de ônibus. Na base da improvisação, pedia-se o fim da corrupção e a melhoria dos serviços públicos.

    Simplício raciocinava: 

  — Isso é o que me ensinaram na faculdade como sendo democracia direta. O povo mordeu o freio e decidiu, ele próprio, assumir o governo. Portanto, como se dizia em outros tempos, todo poder aos sovietes. Eia, finalmente estamos no controle!

    Na medida em que os dias passavam, Simplício sentiu que o fervor democrata das chamadas classes dominantes, inicialmente simpática ao movimento das ruas, foi-se arrefecendo. Afinal, de passeata em passeata vai-se esfacelando a boa vida burguesa. As pessoas têm que trabalhar, têm que circular, têm que estudar, têm que cuidar da vida. Um país inteiro não pode viver em ritmo de cavalaria rusticana o tempo todo. Convencido disso, Simplício colocou para si um desafio gigantesco: descobrir tudo o que está por trás das manifestações populares iniciadas em junho de 2003.   

    Acontece que já lhe haviam dito que para entender os movimentos sociais era importante entender política, e para entender política era importante entender economia. Portanto, resolveu começar por aí. Ouvira falar que os economistas se dividiam em duas grandes seitas, os neoliberais ortodoxos, que ensinavam sua doutrina como sendo o décimo primeiro mandamento, e a dos heterodoxos, mais divertidos por não se subordinarem a dogmas. Então procurou o professor Galileu, conhecido por sua infinita paciência, para que ele o ajudasse a buscar algumas entrevistas esclarecedoras.

E foi assim que Simplício se preparou para percorrer o Brasil em busca de ensinamentos definitivos de economia e de política contemporâneas.

www.ContosdoUirapuru.com.br

Redação

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