O fim da euro e o renascimento das moedas nacionais

Do The Wall Street Journal

Bancos centrais se preparam para possível fim do euro

Alguns bancos centrais da Europa já começaram a considerar planos de contingência para se preparar para a possibilidade de que os países deixem a zona do euro ou que a união em torno da moeda se desintegre, de acordo com pessoas a par do assunto.

Estão surgindo os primeiros sinais de que os bancos centrais estão pensando em como ressuscitar moedas baseadas em cédulas que já não são impressas desde que as primeiras notas de euro entraram em circulação, em janeiro de 2002.

Pelo menos um deles — o Banco Central da Irlanda — está considerando se precisará garantir acesso adicional às impressoras, caso precise produzir em série novas cédulas para sustentar o renascimento da moeda nacional, de acordo com pessoas familiarizadas com o assunto.

Fora da região dos 17 países que usam o euro, numerosos bancos centrais europeus estão de olho em medidas defensivas para se protegerem de efeitos colaterais adversos caso a zona do euro venha a se dissolver, disseram outras pessoas. Vários países, inclusive a Suíça, estão considerando possíveis substituições para o euro como ponto de referência externo, ou indexador, que eles usam para tentar manter estável o valor de suas moedas.

Os planos dos bancos centrais são preliminares, de acordo com uma pessoa a par do assunto. E não representam a expectativa de que a zona do euro esteja a caminho da dissolução.

Mas só o fato de que os bancos centrais estejam mesmo estudando essa possibilidade, que até poucos meses atrás estava fora de cogitação, ressalta como as condições estão se deteriorando rapidamente na Europa. Autoridades monetárias, bancos centrais e investidores em todo o mundo estão colocando suas esperanças no encontro de cúpula em Bruxelas esta semana para chegar à tão aguarda solução para a crise financeira do continente que já dura dois anos e foi iniciada pelas dúvidas sobre a capacidade dos países de pagar suas dívidas.

Há muito em jogo. Se os líderes europeus não conseguirem esfriar a crise, as dúvidas em relação à viabilidade do euro se intensificarão ainda mais. Muitas autoridades monetárias, banqueiros e outros especialistas temem que a dissolução da união vá não apenas reverter uma década de integração econômica, mas provocar também um caos financeiro.

Antes do lançamento formal do euro, em janeiro de 2002, um exército de organizadores gastou anos coreografando a logística do início da circulação da moeda, incluindo a impressão de bilhões de moedas e cédulas e a distribuição da nova moeda aos bancos e empresas em todo o continente. Desfazer o bloco, no mínimo, criaria uma grande confusão. Um dos vários desafios é que empréstimos e depósitos atualmente denominados em euros teriam que ser revertidos para outras moedas. E cada país teria que, individualmente, decidir se vão ressuscitar a antiga moeda e, nesse caso, com que rapidez voltar a produzir grandes quantidades de cédulas.

Em Montenegro, que usava o marco alemão antes de adotar o euro em 2002, as autoridades do banco central estão considerando quais seriam as opções, caso o euro deixe de existir. O país teria “uma grande variedade de alternativas, desde usar uma outra moeda internacional até introduzir uma moeda doméstica”, disse Nikola Fabris, economista-chefe do banco central de Montenegro. Mas a segunda opção esbarraria em um problema: Montenegro não está preparado para imprimir a própria moeda, disse ele.

A maioria dos bancos centrais da zona do euro mantém ao menos uma capacidade limitada de imprimir cédulas. Embora o Banco Central Europeu seja responsável por estabelecer a oferta de cédulas na zona do euro, a instituição, na realidade, não as imprime. O BCE delega esse trabalho aos bancos centrais dos países da zona do euro.

No ano passado, a Irlanda imprimiu 127,5 milhões de notas de 10 euros, de acordo com seu relatório anual. Este ano, estava entre os países encarregados de imprimir um total de 1,71 bilhão de notas de 5 euros.

Nas últimas semanas, autoridades do banco central da Irlanda tiveram discussões preliminares sobre a eventual necessidade de ampliar a capacidade de impressão no caso de uma ruptura da zona do euro ou caso a Irlanda deixe o bloco para retomar sua antiga moeda, a libra irlandesa, de acordo com pessoas a par do assunto. As autoridades já discutiram a reativação de antigas impressoras e a contratação de uma empresa privada, disseram as pessoas. “Estão sendo avaliadas várias coisas que não estavam sendo vistas há dois meses”, de acordo com uma pessoa que participou do encontro. Uma porta-voz do Banco Central da Irlanda não quis comentar.

Na Grécia, país que muitos consideram ser o que tem mais chances de deixar a zona do euro por conta de seus problemas fiscais, o banco central tem uma unidade de impressão de cédulas chamada Ieta. Construída em 1941, a gráfica localizada na região de Ática está aparelhada com “equipamentos modernos”, de acordo com o site do banco central grego. Mas nos últimos anos o trabalho de impressão em Ieta tem sido restrito. A Grécia tem sido um dos cinco ou seis países responsáveis pela impressão de lotes de notas de 10 euros, de acordo com o ECB.

Este ano têm fervilhado em Atenas rumores de que o Banco da Grécia estaria secretamente imprimindo dracmas, a moeda grega pré-euro. E-mails em tom de brincadeira circularam amplamente mostrando cédulas com a imagem do então primeiro-ministro George Papandreou. Os rumores foram em alguns momentos apontados como a causa das ondas de saque dos bancos de varejo da Grécia.

Um porta-voz do Banco da Grécia disse que a entidade não está buscando alternativas para ampliar sua capacidade de impressão. “Não houve nenhuma discussão sobre esse assunto”, disse ele.

Alguns euros são atualmente produzidos fora da zona do euro. Na cidade de Gateshead, no norte da Inglaterra, por exemplo, uma gráfica da De La Rue PLC imprime cédulas para vários países da zona do euro, de acordo com pessoas próximas do assunto.

A planta de Gateshead também é uma opção de reserva para o Banco da Inglaterra, que tem um contrato próprio com a De La Rue, para imprimir libras, de acordo com um porta-voz do Banco da Inglaterra.

A situação preocupa algumas autoridades do Banco da Inglaterra, de acordo com pessoas a far do assunto. O temor é de que, se a zona do euro se desintegrar, o parque gráfico de Gateshead possa ser soterrado por pedidos de nações que faziam parte do euro, para a impressão de suas moedas, disse a pessoa.

Embora alguns países da zona do euro tenham suas próprias gráficas, “podem surgir outras oportunidades em decorrência de uma possível desintegração do euro, já que muitos países menores não têm capacidade própria de impressão”, disse Tim Cobbold, diretor-presidente da De La Rue, num comunicado. Ele observou que normalmente são necessários cerca de seis meses para desenvolver uma moeda.

Na Suíça, que também não faz parte da zona do euro, o Banco Nacional da Suíça está considerando qual moeda ou cesta de moedas substituiria o euro como referência ou teto, de acordo com uma pessoa familiarizada com a situação.

Antes da criação do euro, o marco alemão era a principal referência para a Suíça — incluindo um período na década de 1970 quando o Banco Nacional da Suíça atrelou o franco ao marco para controlar a apreciação da moeda suíça. Hoje, assim como nos anos 70, a Alemanha é o maior parceiro comercial da Suíça, então, um novo marco alemão poderia em teoria substituir o euro, de acordo com a pessoa, embora o banco esteja considerando também outros cenários, como a formação de mais de um bloco cambial na Europa.

Autoridades do banco central da Bósnia e Herzegovina, cujo marco conversível é atualmente atrelado ao euro, poderiam adotar qualquer moeda forte que surja no caso da dissolução do euro, disse uma porta-voz. Antes de as autoridades na Bósnia terem atrelado a moeda ao euro, em 2002, eles a indexavam ao marco alemão.

A moeda da Letônia, o lat, também é indexada ao euro. O banco central não espera que o euro vá desaparecer, mas “pode-se esperar” que ele adote uma possível indexação a outra moeda entre as moedas de outros países europeus com “políticas fiscais prudentes” e com os quais a Letônia já tenha intensa relação comercial, disse um porta-voz do Latvijas Banka.

Fonte: WSJ
(Colaboraram Francesco Guerrera, Alkman Granitsas e Brian Blackstone)

Luis Nassif

0 Comentário

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador