Os erros no diagnóstico da economia

Coluna Econômica

Ouvi ontem, na rádio CBN, considerações de minha colega Mirian Leitão sobre déficit público. São análises algo equivocadas, que acabam por confundir a opinião pública.

1º Tema – há uma discussão sobre dívida bruta e divida líquida. A Fazenda trabalha com o conceito de dívida líquida, descontando da dívida bruta o valor das reservas cambiais e de outros ativos líquidos. Mirian diz que é bobagem porque as reservas podem se evaporar na primeira crise cambial. Ora, evaporando-se, a dívida líquida ficará menor.

Entenda o raciocínio.

Momento 1 – O Banco Central adquire, digamos, US$ 100 milhões a uma taxa de R$ 1,70. Para tanto, vende R$ 170 milhões em títulos no mercado. Ficará com US$ 100 milhões a mais nas reservas e R$ 170 milhões a mais na dívida bruta.

Momento 2 – há uma fuga de recursos e o dólar vai a, digamos, R$ 2,00. O BC pega os US$ 100 milhões e vende no mercado. Apura R$ 200 milhões, resgata os R$ 170 milhões de títulos vendidos e tem um lucro de R$ 30 milhões com a operação – que abaterá da dívida bruta.

Momento 3 – Mais ainda. Supondo que as reservas foram adquiridas a um custo médio de R$ 1,75 por dólar, se o dólar chegar a R$ 2,00, o BC terá um lucro fiscal correspondente ao total das reservas (US$ 250 bi) vezes a diferença de R$ 0,25 por dólar. Ou R$ 62,5 bi.

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2tem2º Tema – diz a Mirian: a Fazenda fala que a dívida pública caiu, mas é falso. A dívida continua aumentando. O que ocorreu foi uma redução da relação dívida pública/PIB porque o PIB cresceu.

Vamos entender melhor.

Imagine que você tenha uma empresa que fature R$ 1 milhão por mês, um lucro de 10% sobre o faturamento (R$ 100 mil mensais) e uma dívida de R$ 2,5 milhões. A dívida corresponderá a 25 meses de lucro. Aí a empresa investe, dobra o faturamento para R$ 3 milhões mensais, o lucro para R$ 300 mil mensais e a dívida para R$ 3 milhões. A dívida aumentou. Só que serão necessários apenas 10 meses de lucro para cobrir a dívida.

Em termos de crédito, a situação da empresa piorou ou melhorou? É óbvio que melhorou.

Com países se dá a mesma coisa: o que interessa, na avaliação do endividamento, é a proporção sobre o PIB (o conjunto de riquezas geradas pelo país). Se a dívida aumenta em termos nominais, mas cai em termos percentuais, eu, você, o FMI e o banco Mundial considerarão que a situação do país melhorou.

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Por trás dessa discussão, há questões mais profundas, relacionadas à própria condução da política econômica.

Quando se aposta no crescimento, há recuperação do mercado de trabalho, melhorando a arrecadação da Previdência; há aumento na receita tributária, sem necessidade de aumentar as alíquotas; abre-se inclusive espaço para reduções de tributação. É como o exemplo da empresa que aumenta seu faturamento.

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De uma maneira geral, com exceção dos últimos dois anos, o jogo da política econômica tem sido o inverso. Problemas fiscais são utilizados como álibi para juros altos e crescimento baixo. 

Luis Nassif

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