Os gargalos como fator de desenvolvimento

Coluna Econômica – 17/06/2010

Muitas vezes vista como intocável, superior, a teoria econômica na verdade é uma espécie de convalidação a posterior de um jogo de interesses econômicos que se tornam hegemônicos.

Não se pense que estou desmerecendo a analise econômica, longe disso. Ocorre que há inúmeros modelos, inúmeras maneiras de atingir os objetivos de uma economia – o desenvolvimento, a geração de empregos e renda, o bem estar social. Na arena política, no dia a dia da economia, no entanto, os interesses de grupos se sobrepõem ao interesse mais amplo do pais ou mesmo à lógica econômica. E aí tratam temas de interesse de grupos como sendo de interesse do país.

Tome-se a discussão em fins dos anos 80. Havia uma economia amarrada, fechada, protegida, dominada por cartéis e pela despreocupação com a competitividade e com o consumidor. Qualquer tentativa de mudar o modelo, de acabar com a Lei da Informática – exemplo maior da sanha regulatória – era taxado como anti-nacional.
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Depois muda, a economia começa a ser liberalizada, surgem novos grupos de interesse, novos grupos econômicos, cria-se um novo discurso.

Na fase inicial de consolidação, radicaliza-se a retórica para permitir a entrada dos novos conceitos. À medida que os novos grupos se consolidam e uma nova ideologia os ampara, cria-se um novo discurso mas amarrado ao mesmo modelo: chavões, sofismas econômicos, retórica do fim do mundo (se não fizer o que digo, acaba tudo) etc.

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Um amigo físico sempre dizia: se um físico não consegue expor uma tese com idéias claras, é porque ou ele é um gênio ou um embuste; e gênios surgem muito raramente.

O mesmo acontece na economia. Durante anos o discurso oficial era de que o país não poderia crescer por não dispor de infra-estrutura adequada. A cada soluço de crescimento se respondia com elevação de taxas de juros, abortando o movimento.

O desafio do “Minha Casa Minha Vida” e os desdobramentos do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) estão trazendo à tona a verdadeira dinâmica do desenvolvimento. O país cresce e cria gargalos. O que são os gargalos? Demanda não atendida. Se se tem a demanda e ela não foi atendida, significa que existe um mercado (a demanda reprimida) à espera de um investimento. Ou seja, o que deflagra os investimentos e o crescimento são justamente os gargalos. São esses gargalos que estimulam investimentos, treinamento de mão-de-obra, tira governo e setor privado da inércia.

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Tome-se o programa habitacional. Nas primeiras reuniões, o setor privado declarou não ser possível mais do que 200 mil habitações ano. Definiu-se a meta de um milhão. Depois, passou-se a discutir como chegar lá. Havia um seguro muito alto para mutuários de idade mais avançada. Ordenou-se à Caixa para reduzir. Os preços finais ainda estavam altos devido aos tributos federais. Desonerem-se os produtos. Ainda era insuficiente. Negocie-se com estados e municípios a contrapartida da redução de tributos locais. Mas há problemas de infra-estrutura de saneamento. Abra-se uma linha do FGTS para cada projeto. E assim vai-se indo, construindo a solução para alcançar as metas propostas. 

Luis Nassif

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