Real x yuan, de novo, até entender

Volta à baila, mais uma vez, o mesmo tema surrado do real “supervalorizado” e do yuan “subvalorizado”. Desta vez, comparam-se as taxas de 2008 com as de hoje para dizer que o real valorizou-se 38% e é, segundo a mesma Goldman Sachs que foi incapaz de ver o tamanho do saco para onde ia a economia mundial, a moeda mais supervalorizada do mundo.

Por que 2008? Porque por alguns meses, em 2008, contrariando uma tendência de vários anos, o real se desvalorizou frente ao dólar. Caberia perguntar-se não porque o dólar vale hoje 1,66, real em perfeita sintonia com a tendência de valorização que se observa há mais de dez anos, mas porque valia 2,34 em dezembro de 2008, completamente fora da curva. Mas não, compara-se o atípico ao normal para, pela enésima vez, iniciar a cantilena da supervalorização e queixar-se da “subvalorização” do yuan, que seria um sinal de manipulação da moeda chinesa.

Volto aos históricos de câmbio para, mais uma vez, verificar a consistência da choradeira. E, mais uma vez, o que se vê é um bando de crocodilos aos prantos. Se não, vejamos: voltando à curva “normal” e excluindo-se o segundo semestre de 2008, em dezembro de 2007, o dólar valia 1,77 real e 7,29 yuans. Em dezembro de 2010, há menos de duas semanas, valia 1,66 real e 6,59 yuans. Ou seja, no mesmo período, a nossa moeda valorizou-se um pouco mais de 6%, enquanto o yuan subvalorizado e manipulado ganhava quase 11% na comparação com o dólar, valorizando-se quase o dobro do que o real. Pode-se alegar que em um período tão curto pode haver distorções, embora não se veja nenhum problema em comparar uma cotação fora da curva com uma que acompanha a tendência, em um período ainda mais curto. Portanto, comparemos a tendência em dez anos, de dezembro de 2000 a dezembro de 2010, cobrindo o final do governo FHC e todo o governo Lula. Há dez anos, o dólar valia 1,949 real, e 8,2774 yuans. De lá para cá, a nossa moeda valorizou-se pouco menos de 17%, enquanto o yuan avançava mais de 25,5%, no que foi uma das maiores e mais consistentes valorizações de uma moeda ao longo de uma década em todo o mundo, fazendo comer poeira não só o real como vários outros “campeões” de valorização.

Os históricos podem ser consultados no Oanda, caso alguém não acredite nos meus números ou queira fazer outras comparações.

Frente a estes dados concretos, será que alguém seria capaz de explicar ao distinto público, de preferência em menos de sete linhas mas em setenta se for preciso, porque raios se insiste tanto em que o real está “supervalorizado” e o yuan, “subvalorizado”? Se a explicação não for convincente, como aposto que não vai ser, alguém teria uma explicação coerente para este consenso tão universal em torno a uma falsidade tão facilmente demonstrável?

Caro Nassif, você é um dos que mais bate na tecla da supervalorização (o que me faz lembrar de uma piada sobre os espanhóis antifranquistas no exílio, mas vou precisar inventar uma ocasião para contá-la). Pode ser que já tenha exposto as suas razões há muito tempo e não considere necessário voltar ao tema, mas não me lembro de as ter visto. Que tal repeti-las para os que estão chegando agora e para mim que já não tenho a memória de outros tempos?

Redação

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