Serviços desaceleram apesar de estouro da meta do IPCA

Do Valor

IPCA estoura meta, mas serviços desaceleram

Por Juliana Elias e Diogo Martins | De São Paulo e do Rio

O Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), considerado o indicador oficial de inflação, recuou e fechou março com alta de 0,47%, variação inferior à de janeiro e fevereiro. O recuo foi menos expressivo que o esperado em alimentos, mas trouxe a boa surpresa de uma forte desaceleração em serviços, grupo de despesa que subiu 0,26%. A alta do IPCA também ficou abaixo do esperado pelo mercado, que projetava 0,50%, segundo a média de 14 projeções coletadas pelo Valor Data. Com o dado de março, a inflação acumulada em 12 meses alcançou 6,59% e ficou acima do teto estipulado como meta do país para este ano.

A abertura dos dados do IPCA mostra que os alimentos continuam concentrando as maiores pressões sobre a inflação, apesar do recuo. A alta do grupo alimentação e bebidas passou de 1,45% em fevereiro para 1,14% em março, mas ele respondeu por 60% da inflação do mês passado, percentual um pouco superior ao registrado em fevereiro (58%). Sem considerar os alimentos, a inflação medida pelo IPCA teria sido de 0,25%. Esse percentual indica que embora o índice de difusão (conceito que considera quantos produtos tiveram alta de preços no mês) tenha sido alto – 68,5% – os percentuais de reajustes foram modestos.

Para economistas consultados pelo Valor, a combinação de fatores que explica a inflação de março, apesar do recuo, reforça a necessidade de que o Banco Central eleve em breve a Selic, a taxa básica de juros, mas também dá uma certa folga para que a alta possa ser adiada para maio e, eventualmente, evitada se os dados de abril forem muito melhores. “Os números de março vieram com uma indicação melhor. Não significa que a inflação esteja sob controle, mas, se o Banco Central quiser um argumento para poder esperar mais e não subir os juros em abril, ele arrumou um com esse IPCA”, diz Luis Otavio Leal, economista-chefe do Banco ABC.

Um dos sinais de alívio identificados por Leal é a redução do índice de difusão, que caiu de 72,3% em fevereiro para 68,5% agora, a primeira marca abaixo dos 70% desde novembro, segundo cálculos do Banco Fator com base nos dados do IBGE.

Além da queda no índice de difusão, José Francisco Gonçalves, economista-chefe do Fator, destaca que os números deixam cada vez mais claro que a principal pressão sobre a inflação vem dos alimentos. “E não temos muito como controlá-los”, diz. Em março, o grupo subiu 1,14%, não só a maior alta entre as nove categorias pesquisadas como também o que mais impactou no IPCA do mês ao responder por 60% do 0,47% de alta registrada pelo índice total.

Sem esse grupo, aponta Gonçalves, o IPCA em 12 meses teria sido de 4,5% – exatamente no centro da meta estabelecida. Além disso, a tendência é que, entre ajustes de safras e impactos finalmente mais claros das desonerações na cesta básica, o grupo alimentação continue em trajetória de desaceleração em abril, caindo para cerca de 0,60%, na estimativa dos economistas. “O preço dos alimentos em março caiu porque o aumento de oferta da safra já começa a fazer efeito e houve a desoneração da cesta básica, embora o efeito dessa medida ainda não possa ser medido”, disse Eulina Nunes dos Santos, coordenadora de índices de preços do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Os reajustes em serviços, um dos principais motores para a inflação alta e resistente dos últimos meses, foram mais fracos em março, com alta de 0,26%. Com isso, a inflação desse grupo chegou a 8,37% no acumulado de 12 meses, após fechar 2012 em 8,75%. A previsão de Fábio Romão, da LCA Consultores, é que até o fim do ano o índice caia para 8%. “Continuará sendo muita coisa e não é uma grande redução frente a 2012, mas é preciso considerar que essa desaceleração se dará em um momento em que o PIB terá uma aceleração considerável, de 0,9% em 2012 para algo como 3,5% neste ano”, disse Romão.

Entre as razões que Romão enumera para o pequeno alívio nos preços dos serviços estão principalmente o menor reajuste do salário mínimo e os aumentos salariais mais difíceis como um todo neste ano, prejudicados justamente pela própria inflação alta. “O mínimo teve ganho real de apenas 2,7% neste ano, ante 7,5% no ano passado, e a renda, que aumentou 4,1% em 2012, deverá aumentar 2,8% neste ano, na nossa projeção.”

Os repetidos aumentos dos salários acima da inflação são, inclusive, um fator de peso direto que aparece na inflação do primeiro trimestre. Pesquisa do Santander calcula que, da alta de 5,58% que a alimentação no domicílio já acumula até março, 1,3 ponto percentual, ou 23,2% do total, veio apenas dos aumentos salariais conquistados um trimestre antes. “Isso significa que, se não houvesse quebra de safra, se os preços das commodities não variassem, e todos os demais fatores ficassem estáveis, ainda assim os alimentos teriam uma alta de 1,3% no trimestre, puxado apenas pelo efeito dos aumentos dos salários”, diz Tatiana Pinheiro, economista do banco. Para a porção restante da inflação, que exclui os alimentos, o impacto do aumento dos salários no quarto trimestre resultará em 0,9 ponto a mais para a o IPCA neste ano.

Apesar das pressões, no entanto, o Santander não acredita que o Banco Central recorrerá ao aumento da Selic para conter os preços. Para o banco, a taxa será mantida nos atuais 7,25% ao longo de todo o ano. O Banco ABC calcula um aumento para até 8,50% e o Banco Fator e a LCA apostam numa Selic de até 8,75% em 2013.

Para o ministro da Fazenda, Guido Mantega, “a boa notícia” sobre o IPCA de março é que ele foi menor que o de fevereiro e janeiro. “Estamos numa trajetória de redução da inflação”, disse, acrescentando que começarão as safras agrícolas e o regime de chuvas melhorará. “Se nós decompusermos essa inflação e olharmos mais o núcleo da inflação, vamos ver uma grande desaceleração da inflação. Alimentos ainda foi o grupo que pressionou a inflação de março e impediu que a queda fosse maior do que a que ocorreu.”

Mantega também disse que a inflação de serviços desacelerou em março. “Portanto, hoje o maior vilão ainda é alimentos”, sublinhou, antes de se recusar a falar sobre as expectativas do mercado em relação à reunião do Comitê de Política Econômica. “Eu não falo de juros. Juro é responsabilidade do Banco Central. Principalmente em véspera de Copom, ministro da Fazenda não fala de juros.” (Colaborou Fernando Exman, de Brasília)

Luis Nassif

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