Gestão Doria não convence ao negar ‘depósito’ para usuários de crack na Raposo Tavares

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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Galpão de uma das dependências da Prefeitura Regional do Butantã, que passa por obras para abrigar centro de acolhimento provisóriobutanta.jpg

da Rede Brasil Atual

Gestão Doria não convence ao negar ‘depósito’ para usuários de crack na Raposo Tavares

Versão do prefeito regional do Butantã de construção de abrigo de inverno para moradores de rua em galpão da administração, na Raposo Tavares, não convence moradores

por Cida de Oliveira, da RBA

São Paulo – Em reunião tumultuada na manhã de hoje (9) com moradores e lideranças comunitárias, o prefeito regional do Butantã, Paulo Vitor Sapienza, negou que o prefeito João Doria (PSDB) esteja reformando um galpão da Coordenadoria de Projetos e Obras (CPO), ao lado do Parque Raposo Tavares, na zona oeste da capital, para abrigar usuários de crack expulsos da região da Cracolândia. Desde a semana passada, circula nas redes sociais um áudio que denuncia o fechamento do CPO, a transferência de servidores e reformas no local que passaria abrigar essas pessoas, que seriam trazidas em ônibus. 

Visivelmente exaltado, elevando o tom de voz diversas vezes e chegando a gritar outras tantas durante as mais de duas horas de reunião, Sapienza afirmou que o projeto da gestão Doria é criar ali um albergue para acolher pessoas em situação de rua, da própria região, no período mais frio do ano. E que as instalações serão utilizadas também para abrigar cursos de capacitação profissional em parceria com a Força Sindical.

A negativa de Sapienza, no entanto, guarda incoerências com sua avaliação do caso Cracolândia em resposta a questionamento de um dos moradores. “Estive ontem na região central. As barracas, moradias, gente em situação de rua. Um negócio absurdo. Acabaram com a nossa cidade. E agora temos de achar saída. É difícil, mas vamos chegar lá”, disse, sem saber que estava sendo gravado. 

Durante a reunião, o prefeito regional proibiu o uso de celulares para a gravação de vídeos por parte da comunidade, mas um de seus assessores chegou a usar o celular, como quem tira fotos ou grava vídeos dos presentes à reunião, o que causou indignação. 

Em frases soltas, afirmou ainda: “O que aconteceu? Com a paulada que ocorreu lá, começaram a se espalhar (em referência à ação violenta do governo de Geraldo Alckmin e do prefeito Doria na madrugada do último dia 21 de maio). Até tive reunião com meu pessoal na CPO ontem. Pelo amor de Deus. Vamos trabalhar até de madrugada para, pelo menos, limpar as praças. E a assistência social chegar no foco e já fazer a abordagem, fazer o trabalho na tentativa de persuadir as pessoas para o tratamento. Porque por enquanto não pode, está um pouco parado a internação ‘involuntária’, né. Estão discutindo aí, com o Judiciário, vamos ver o que vai dar”.

O prefeito regional foi enfático também ao minimizar a veracidade do áudio que teria sido gravado por uma professora do Jardim Dracena, informando que uma amiga de infância, servidora do CPO, estaria indignada com a transferência para a sede da prefeitura regional, no Jardim Peri Peri, e que também temia que a chegada de usuário de crack poderia tornar o bairro mais violento com o acirramento de disputa entre traficantes. 

“Tem coisas que não vale a pena nem a gente ouvir. Se eu estou aqui de domingo a domingo, a partir das 5h da manhã, é para tentar acertar; para que possamos ter uma cidade melhor. É de uma incoerência isso, de uma maldade. Chega até me cansar. Penso em ir embora. Mas nem faço, porque é um desafio. E em cada canto que eu vou, nasce a esperança dentro de mim porque há pessoas boas.”

No calor do clima, que esquentou diversas vezes na reunião em que Sapienza aproveitou para discutir também questões relacionadas ao lixo, ao parque Raposo Tavares, segurança e esportes, entre outras, para tirar o foco da denúncia, ele ficou sem responder questionamentos da integrante da Rede Butantã de Entidades e Forças Sociais Martha Pimenta. “Não somos contrários à criação do centro temporário de acolhimento de pessoas em situação de rua. E muito menos que se acolha pessoas que fazem uso de drogas. Precisamos desse espaço. A nossa preocupação é: qual é a política pública que vai embasar isso? Qual o envolvimento da área de saúde? A nossa região é a que tem a menor cobertura de assistência à saúde mental de toda a cidade, apenas um Caps (centro de atenção psicossocial). E uma reivindicação antiga, que já formalizamos por meio de carta aberta neste ano, é a implantação de um Caps Álcool e Drogas”, disse Martha.

Na falta de informações, a Rede Butantã protocolou requerimento de informações. Os mais de 400 participantes de conselhos, redes, movimentos sociais e fóruns da região que integram a rede querem mais esclarecimentos sobre o projeto denunciado nas redes sociais.  

Integrante de ações socioculturais no Parque Raposo Tavares e entorno, que pediu para ter sua identidade preservada, participou da reunião e não acredita na versão apresentada por Sapienza. “Já temos uma Cracolândia aqui na região, onde o tráfico corre solto. E agora que o Doria está limpando a Cracolândia do centro, do nada, me aparece essa história? Para mim, o Doria está querendo limpar o centro e trazer os dependentes para cá, querendo valorizar os imóveis que têm na região central, jogando a sujeira para debaixo do tapete. Me parecem estar fazendo isso às escondidas.”

O agravante, segundo ele, que entrou no local e fotografou, é o improviso. “Se fosse um local decente, com estrutura, médicos, psicólogos, assistentes sociais, com capacidade de alojar boa parte dessa galera, tudo bem. Mas está parecendo que vão transferir os albergues que tinha na antiga Cracolândia para comunidades espalhadas por São Paulo. Em poucas palavras, vão limpar o centro e jogar a sujeira pras favelas”.                        

A reportagem da RBA esteve no local e conversou com um servidor da CPO. Segundo ele, já há empreiteira trabalhando nos galpões, onde funcionaram oficinas de carpintaria e de serralheria, hoje desativadas. E que já foram construídos banheiros. Segundo ele, a informação que circula entre os servidores é que o local deve abrigar usuários de drogas. E que há planos semelhantes para outros espaços da estrutura municipal.

 

Lourdes Nassif

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