Nossa luta é todo dia!, por Nathália Meneghine

A nossa prefeita Margarida Salomão e a vereadora Laiz Perrut foram ameaçadas! A prefeita precisou ir a delegacia registrar queixa crime por ter recebido ameaças contra sua vida. A vereadora Laiz Perrut foi xingada e teve seu carro cercado

Nossa luta é todo dia!

por Nathália Meneghine

No dia 10 de março, estávamos ainda sob o signo do Dia Internacional da Mulher, celebrado na véspera. Dia esse, demarcado para ratificar as conquistas no campo do direito das mulheres e para denunciar todas as violações a que ainda somos submetidas.

Também no dia 10 de março, perdemos para a Covid 19 – e para má gestão federal da pandemia- mais de 2 mil vidas de brasileiros e brasileiras.

A princípio, deveriam ser temas para nos mobilizarmos em uma articulação de forças no enfrentamento dessas realidades. No entanto, em Juiz de Fora, eles se encontraram por situações nada legítimas. Explico:

A nossa prefeita Margarida Salomão e a vereadora Laiz Perrut foram ameaçadas!  A prefeita precisou ir a delegacia registrar queixa crime por ter recebido ameaças contra sua vida. A vereadora Laiz Perrut foi xingada e teve seu carro cercado, a ponto de precisar de intervenção da Guarda Municipal para garantir sua integridade física, naquele momento.

Pela primeira vez temos uma prefeita em nossa cidade. Uma mulher ocupando a liderança do município! Também, pela primeira vez, temos quatro mulheres na Câmara de vereadores e vereadoras.

Ambos os ataques, a princípio, em razão das medidas restritivas – e necessárias- determinadas pela Prefeitura, diante do esgotamento de leitos de UTI na rede pública do município para atender pacientes com COVID19, e o crescente número de contaminações e mortes na cidade.

No entanto, ao que parece, as razões que sustentam a explosão de violência e intolerância contidas nessas ameaças, dirigidas a duas mulheres que ocupam cargos eletivos e, por isso, revestidas de funções e responsabilidades institucionais, são bem mais profundas do que a discordância sobre um Decreto Municipal (que tem por objetivo salvar vidas).

 Isto porque, são atos que acompanham uma onda de tentativas de corrosão da democracia. Ameaçar uma prefeita e uma vereadora, em razão do exercício responsável de suas funções, é atacar as instituições que elas representam. É atacar a própria democracia que depende dessas instituições fortalecidas para funcionar.

Adam Przeworski, um dos grande estudiosos sobre as Crises da Democracia no mundo, sustenta que “a democracia é um mecanismo de processar conflitos”. Portanto, qualquer conflito deve ser processado e conduzido dentro do âmbito institucional. Ao mesmo tempo, ele alerta que “pessoas de orientações políticas, valores e culturas diferentes veem umas às outras cada vez mais como inimigas”, e, por isso, estão dispostas a coisas terríveis.

Isso significa que, se há discordâncias, pela ordem democrática, elas devem ser abordadas e tratadas nos trâmites institucionais, e não contra as instituições, e menos ainda, contra quem as representa.

Os interessados em lapidar a democracia costumam usar como estratégia, convencer pessoas de que os que as divide é maior do que aquilo que as une. E, a partir disso, disseminam medo e dirigem o ódio criado contra pessoas que sustentam o funcionamento institucional democrático.

Como nesse momento, enquanto nossa cidade precisa se unir no empenho de salvar vidas, algumas pessoas se dispõem a organizar grupelhos para ataques personalizados, mas com objetivos de desestabilização institucional. Criam um “inimigo”, nesse caso, “inimigas”, para culpabilizar por um problema que só pode ser enfrentado por vias institucionais.

Seria ingênuo não destacar o conteúdo misógino desses ataques. Ousariam fazê-los, com tamanha ausência de cerimônia, contra líderes homens? Porque, se tem uma coisa que é certa, é que todo líder precisa tomar decisões que, necessariamente, não agradarão a todos ou todas. Nem por isso, dado o grande histórico de medidas não populares tomadas ao longo dos anos por homens em cargos eletivos nesta cidade, nunca vimos o que presenciamos nas últimas horas.

Tudo isso, nos remete de volta a duas questões fundamentais: a primeira é que democracia depende das instituições fortalecidas para tratar seus conflitos, para que não haja rupturas sociais graves. E, nesse ponto, qualquer ataque a uma representante democraticamente eleita, representa um ataque as nossas instituições.

A segunda questão diz respeito a confirmação de que nossa luta -a luta das mulheres por respeito e igualdade de direitos- é todo dia! Mesmo quando alcançamos pelos meios legítimos – como é o das eleições- lugares de poder, sempre haverá os intolerantes e retrógrados que tentarão, pela força física ou simbólica (como as difamações), destituir-nos de nossa posição.

Por tudo isso, o que nos aconteceu em Juiz de Fora é muito perigoso, e precisa ser encarado com a gravidade que contém. Digo, “nos aconteceu”, porque manifestando toda a minha solidariedade as companheiras Margarida e Laiz, ressalto que, todas e todos nós, para quem a democracia é cara, fomos desrespeitadas e desrespeitados.

A prefeita Margarida e a vereadora Laiz, além de mulheres e cidadãs dignas de respeito, são também as instituições a que pertencem. A verdade é que ao atacarem a elas, atacaram todas mulheres, a Prefeitura, a Câmara Municipal, o nosso pacto social, e, sobretudo, a ordem democrática.

Termino com um dos lemas de uma das Marchas Mundiais das Mulheres, que conheci, justamente, através da militância da Laiz: “Resistimos para viver, marchamos para transformar!”

Os que querem o retrocesso civilizatório, terão que tentar passar por todas nós!

Nathália Meneghine – Professora e Psicóloga .

Redação

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