“O Estado que voltou a vulnerar e reprimir”: entidades acusam semelhança à ditadura chilena

Patricia Faermann
Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.
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"Militares nas ruas, com tanques, e o presidente declarar guerra aos chilenos fala de um governo que ainda segue lógica do inimigo interno. Ainda somos um perigo na visão dos governos neoliberais"

Foto: Patricia Faermann

Jornal GGN – “É a primeira vez que em democracia voltamos a ter uma situação como na ditadura”, resumiu Francis Valverde, diretora executiva da Associação Chilena Pró Nações Unidas (ACHNU), no evento de reabertura do museu da poeta e educadora Gabriela Mistral (GAM), em Santiago, no Chile, localizado na alameda que vem sendo o palco principal para as manifestações do país.

O gesto do GAM de reabrir suas portas foi na contramão dos estabelecimentos e grandes comércios locais, que nos últimos dias vinham fechando portões com maquinaria de ferro fundido. “Acreditamos que as artes e as culturas são o motor do nosso imaginário coletivo. É por isso que, depois de fechar por segurança aos nossos trabalhadoras e trabalhadores, público e artistas, decidimos retomar paulatinamente nossas atividades”, anunciou o espaço.

“Como centro cultural cujo edifício recorda a história dos últimos 46 anos do Chile, manifestamos nosso repúdio às violações aos direitos humanos, às restrições de liberdade e a todo tipo de violência”, completava o manifesto. A data escolhida, 30 de outubro, é também o Dia Nacional dos Executados Políticos no país. Neste 2019, os espaços do GAM recebiam manifestações artísticas para relembrar aqueles que morreram pela ditadura, mas também pelas últimas duas semanas.

“Este governo falhou ao Chile, ao voltar a reprimir desde o Estado, a voltar a vulnerar os direitos humanos, matando, desaparecendo, torturando, violentando sexualmente”, disse Beto Rodríguez Gallardo, ao GGN, integrante e sobrevivente da família Gallardo Morano, caso de sequestro e massacre da família em Rinconada de Maipú, na ditadura.

“Para nós, hoje, que estamos homenageando no dia 30 de outubro o Dia Nacional do Executado Político, é doloroso, porque estamos em memória também aqueles que nestes 12 dias foram aproximadamente 20 chilenos assassinados, nas mãos de policiais, militares e polícia de investigações”, lamentou a presidente da Agrupação de Familiares e Executados Políticos de Chile, Alicia Lira.

Mapa da Violência

O evento também foi o lançamento do Mapa da Violência de Estado no Chile, uma iniciativa da Agência QuatroV, em parceria com o Jornal GGN, o Museu da Memória e da Verdade do Chile, a Associação pela Memória e Direitos Humanos Colonia Dignidad, e os veículos OperaMundi, TVT, Outras Palavras e El Desconcierto.

O Mapa da Violência de Estado no Chile é um dossiê interativo, com o registro dos relatos de violência por parte da polícia chilena, militares e forças de segurança especial desde o início do Estado de Emergência, iniciado no dia 19 de outubro.

De acesso público e atualizado diariamente, o mapa apresenta as denúncias de abusos das forças armadas e de Segurança do país nestes dias de protestos, incluindo violência sexual e de gênero, sequestros e detenções arbitrárias, assassinatos e mortes, torturas, violência contra imprensa e censura e acusações de montagens de cenas de crime produzidas pelas próprias autoridades:

“Não somente mataram cerca de 20 cidadãos chilenos e estrangeiros, também torturaram, inclusive sexualmente, a jovens e crianças”, disse Alicia Lira. “O fato de liberarem os militares nas ruas, com seus tanques, e que o presidente nos declarou guerra aos chilenos, fala de um governo que ainda segue a lógica do inimigo interno. Seguimos sendo inimigos do governo, um perigo na visão dos governos neoliberais”, completou.

 


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Patricia Faermann

Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.

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