O papel da organização popular na distribuição de políticas em SP

Brasilianas: Dirce Koga avalia que exclusão identificada em bairros da cidade é determinada pela atuação de diferentes atores. A vontade política colabora bastante, mas existe um jogo mais complexo onde o mercado tem papel importante assim como a organização da sociedade
 
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Do Brasilianas
 
O que determina que um distrito da periferia em São Paulo tenha mais serviços básicos e estrutura de urbanização? A vontade política colabora bastante, mas existe um jogo mais complexo onde o mercado tem papel importante assim como a organização popular que, se bem realizada para pressionar o poder público, pode garantir a instalação de equipamentos públicos e serviços urbanos básicos. 
 
A avaliação é da pesquisadora socioterritorial, Dirce Koga, coautora do Mapa da Exclusão e Inclusão Social de São Paulo (MEIS), coordenado pela Profª Aldaíza Sposati e realizado pela PUC de São Paulo em parceria com o Instituto Nacional de Pesquisas Especiais (INPE). 
 
Em entrevista para Luis Nassif no programa Brasilianas, uma realização GGN e TV PUC, a pesquisadora apontou que a série histórica do MEIS comprova que não existe uma lógica na cidade que privilegie os distritos mais excluídos, entretanto observa que, nos locais afastados dos centros privilegiados e que se destacaram com a oferta de alguns serviços, existe uma organização popular que consegue fazer pressão sobre a administração pública. Esse, por exemplo, é o caso de Guaianases que, apesar de estar dentro do grupo dos distritos com exclusão grave, apresenta maior presença de creches, comparativamente a outras regiões.
 
Leia também: SP não segue padrão de politicas públicas por região, revela série histórica
 
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Metodologia 
 
Dirce Koga conta que o MEIS nasceu nos anos 1990 de uma necessidade identificada durante um Fórum da Assistência Social, formado por trabalhadores e organizações assistenciais. A proposta utilizada dados básicos coletados pelo IBGE e secretarias da cidade com a percepção da população local sobre a exclusão ou inclusão de equipamentos e serviços trabalhando quatro dimensões de “utopias”: autonomia, qualidade de vida, desenvolvimento humano e equidade. 
 
O projeto logo contou com o apoio do então Arcebispo Dom Paulo Evaristo Arns que acionou as lideranças paroquiais da cidade para ajudar a entrevistar a população. 
 
“Na verdade a população ajudou e participou na definição do padrão de inclusão social. Nosso ranking não é do melhor para o pior, simplesmente, e sim parte de um ponto que a gente chama de padrão. Então, por exemplo, a gente pegava os dados de renda, educação e esgoto e discutia com setores da população qual distrito seria considerado inclusivo e padrão para todos”, destaca. 
 
Paralelo a percepção dos moradores locais, os pesquisadores faziam comparação com os dados disponibilizados pelo IBGE e secretarias, observando que, em São Paulo, existiam bairros com padrão de primeiro mundo e bairros com padrão de quinto mundo onde, por exemplo, a cobertura de saneamento básico chega a 30% ou 100% das casas, respectivamente. As notas definidas pelo MEIS vão de -1 para o pior índice de inclusão, até +1 para os distritos com melhor índice. 
 
O primeiro período de recolhimento de dados e publicação do MEIS aconteceu nas administrações dos ex-prefeitos Paulo Maluf e Celso Pitta, período em que, segundo Koga, não observaram “impacto algum” de políticas públicas sobre a qualidade de serviços dos distritos. 
 
“Nós fomos ter o primeiro impacto no segundo mapeamento, no segundo governo do Partido dos Trabalhadores [com Marta Suplicy]”, conta. A gestão, mais sensível às desigualdades regionais, inclusive, usou os dados produzidos pelo Mapa para definir a instalação dos primeiros 21 Centros de Educação Unificada (CEUs) na cidade, priorizando os bairros onde as deficiências eram maiores. 
 
Poder paralelo nas periferias
 
Onde o poder institucional falta surgem lideranças paralelas, algumas vezes ligadas à criminalidade, que acabam apresentando para a população um papel de legitimidade no equilíbrio da segurança muito maior do que o próprio Estado. Como, então, acaba sendo a convivência das políticas públicas nessas localidades? Questiona Luis Nassif. A professora Koga responde que como o acolhimento de ações públicas são, em raiz, institucionais a negociação com o mundo da contravenção acaba sendo um “grande desafio”.
 
“Porque as políticas trabalham a partir da legalidade e da institucionalidade, mas a vida não, principalmente nesses territórios mais excluídos, mais periféricos que a própria cidade não legalizou. Entretanto, são os territórios que mais demandam a presença do estado e de políticos”, destaca.
 
No caso das ocupações ilegais em áreas de proteção ambiental Dirce revela que muitas delas foram induzidas pelo própria administração pública com “nome e data” de governos.
 
“O Sr Paulo Maluf, por exemplo, no período do seu último governo no município de São Paulo, expulsou a população da [região] Água Espraiada para o Grajaú. Em um lugar chamado Pedacinho do Céu quando a gente chega e pergunta de onde as pessoas vieram, muitas vão dizer: ‘nós viemos de caminhão da prefeitura morar aqui porque iam urbanizar a Água Espraiada’. Então, veja, uma coisa é o que está escrito na lei, outra coisa é o que acontece de fato. Então a gente tem um jogo de forças e uma realidade que é totalmente desconhecida da maior parte da população”, completa.
 
Democracia participativa contra quadro de desigualdades
 
A professora Dirce defende que não se deve abrir mão dos mecanismos institucionais para a produção e realização de políticas públicas, especialmente da atuação dos conselhos que reúnem profissionais de classe em determinados setores, como assistência social, saúde e habitação. A pesquisadora também diz ser “muito favorável” ao mecanismo de Orçamento Participativo, onde poder público, entidades e população decidem como os recursos serão investidos regionalmente.
 
“Agora [os mecanismos institucionais] não são suficientes. Acho que é o no interior das próprias políticas que temos que criar instrumentos de trabalho social com a população que levem em conta o conhecimento e a experiência que a população têm sobre a própria vida”, continua, destacando que sem considerar o ponto de vista de quem verdadeiramente “conhece a realidade que vive” as políticas acabam perdendo sua efetividade.
 
“[O problema] é que a mediação do próprio trabalho [da gestão pública é sempre feita numa lógica de que quem sabe fazer política é o profissional que atua na política e não o cidadão que sofre todas as consequências e que demanda essa política”, pondera a pesquisadora concluindo que a experiência da população deve ser a base do planejamento de governos.
 
Redação

3 Comentários

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  1. POLÍTICA PÚBLICA COM PCC: ME POUPEM!!!

    Foi muito feliz a intervenção do Luis Nassif, com relação ao impacto do poder paralelo na implantação de políticas públicas. Mas, acho que a resposta dada poderia atingir um outro patamar. Ao que parece, para a professora Koga, ao que entendi, a ação do poder paralelo é vista como algo sedimentado e inderente à própria lógica da periferia. Uma realidade com a qual o poder público deve lidar e negociar. Isto é o equivalente a se tentar fazer uma omelete sem quebrar os ovos. A quesão, mal respondida por Koga na minha opinião, denota senão falta de vontade política, ao menos uma surpreendente ingenuidade política sobe a questão. Negociar com as lideranças do crime, na prática, é legitimar o poder das mesmas, ao mesmo tempo em que se prefere “fazer o que for possível” (o já pervertido lema de que “quem tem fome, tem pressa”). Parece que a técnica, bem como seus pares, ainda acreditam (ou preferem acreditar – que o poder paralelo seja fruto da exclusão social, que seja uma dinâmica própria adotada pelos excluídos como a forma mais eficaz de se defender das agressões sofridas. Nada mais equivocado. Não são coitados! Nem vítima!

    Vítima é o cidadão que, ao morar na periferia se vê esquecido propositalmente pelo Estado e forçado a conviver com as agruras e o totalitarismo – este tão temido pela classe média e tão presente nas periferias – por total falta de representatividade e comprometimento de agentes públicos – progressistas ou não – para dar representatividade e apoio insttucional aos que denunciam, esperneiam, sofrem, temem e não podem recorrer a ninguém. Em verdade, um traficante ou membro do PCC de baixa patente tem hoje mais cidadania que o cidadão comum que não se deixou cooptar pela lógica imposta – repito, imposta! – por uma pseudo-omissão do Estado. Digo pseudo-omissão porque nos biarros de periferia o Estado está sim, muito presente, porém, assim como a professora Koga, preferindo na melhor das hipóteses, negociar com o crime a ter que combatê-lo e restaurar o Estado de Direito. Na pior das hipóteses, preferem fazer como Geraldo Alckmin e seu (sua) governo/organização criminosa, lançando mão de suas milícias de governo para deixar claro de que lado está e a quais interesses defendem. Sou testemunha ocular da profunda relação das polícias com seus “chegados” do crime. E isto se dá porque neste sistema, o bandido é o que menos ganha (graças aos achaques) e o cidadão refém, não é mais  que escudo nas favelas e presa fácil para crimes recorrentes, áreas de atuação e tribunais que todos sabem onde estão e como funcionam, mas nunca investigam, denunciam ou combatem.

    Só pra deixar claro que neste quesito não há inocentes, uma obra de benfeitoria para a Copa do Mundo – uma Avenida de acesso ao Estádio do Corinthians – simplesmente fo cancelada depois de uma “reunião” com políticos locais que assumiram o compromisso de não deixar rmover a favela onde funciona de tudo (com direito a casa com piscina e grilagem constante de terras, além de cemitério clandestino e área monitrada com câmeras). Parece humanismo e apenas um ato de “negociação” do tipo mencionado pela professora Koga. O fato é que o fluxo de pessoas que são levadas a morar lá em total situação de risco e são obrigadas a se submeter às regras ilegítimas do crime não pára. Tudo isto durante a administração Haddad.

    Se é pra se eleger ou pensar em políticas públicas pensando em atender, cooptar pragmaticamente o apoio do tráfico, sinto muito, não farão diferença alguma na qualidade de vida de ninguém. Jovens continuarão morrendo. Só pra ninguém peitar o Alckmin e o crime organizado. Pra uma esquerda que se preocupa tanto com a possibilidade de totalitarismo em nível nacional, tê-lo nas periferias não parece problema algum.

  2. dois exemplos de que

    dois exemplos de que cidadania não conta NADA  ..e pra que sirva de experiência na hora em que alguns ficarem dizendo que mobilização e cidadania, nesta terra de golspitas e de corporações, resolve

    Tenho uma demanda no MPSP há sete anos ..7 ..defende interesse da cidade  ..a construção duma praça em terra grilada por construtora (ao menos isso há sete anos consegui provar SEM contestação de nenhuma parte)

    UM promotor logo no início perguntou-me se eu conhecia algum jornalista pra “dar uma forcinha” (disse que não) ..outro recentemente dizendo que iria ao me socorro me perguntou se era “contra o PT”, ao qual respondi que não, pois o problema se originou décadas atrás 

    ..nem preciso dizer que entro no aniversário do oitavo ano sem ter esperanças de que o caso se encerre nem ande além dum IC pro forma  ..e este caso, registre-se que foi FACILITADO pela omissão e desidia de gerações de funcionários público municipais que se beneficiam com o rolo  

  3. por minhas experiências,,o

    por minhas experiências

    ,,o Poder paralelo em SP alcança níveis de CRIME ORGANIZADO  ..Poder, o que me refiro, dado aos “profissionais de carreira” lotados nas diversas Regionais

    ..dar a sociedade o papel de “pressionar e de se mobilizar” NÂO resolve ..enfraquece a CIDADANIA  ..pois dentro dessa política de “ganha mais quem berra mais alto” sempre ajudaremos a manter os “melhor relacionados”  ..os que tem ligação com a mídia ou com órgãos de pressão etc

    ..ANTES do GOLPE (que em 24.01 terá seu gran finale) eu acreditava na força crescente da cidadania insuflado pela ISONOMIA entre os cidadãos (mesmo que ferido em parte pela cotas racistas)

    e ISONOMIA só se consegue duma forma  ..com o estabelecimento de índices técnicos per capita de conforto e de bem estar  ..grifando nas regras que qq reforma começaria atacando os piores da lista (por ex: os que tem menos leitos por mil habitantes tem prioridade na construção de hospitais etc)

    exemplo de quem berra mais, ganha  ..higienópolis  ..de longe o baiiro que tem MAIS golpistas por m2 ..tem ao seu redor SEIS estações de metro  ..inclusive contando com o luxo de ter uma parte de povo que não o usa e nem o quer por perto

     

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