Os relatos de Rafael Senra sobre a situação no Macapá (Amapá)

No terceiro dia começaram a circular notícias sobre o real problema e o impacto disso. Ainda sem luz, as narrativas começaram a chegar mas não davam alento. A promessa é que ficariam 15 dias sem luz.

Jornal GGN – O professor Rafael Senra mora em Macapá, no Amapá, há três anos. Ele é professor na Universidade Federal do Amapá. Em relatos curtos, tenta nos dar uma dimensão do que aconteceu e acontece na cidade, que passa por falta de energia elétrica, água e, por consequência, desabastecimento da população.

Tudo começou com uma chuva mansa com alta incidência de raios. Um desses raios atingiu a operadora de energia e os problemas começaram. O acidente foi na terça-feira, dia 3.

Com o raio na subestação, teve uma queda de luz. Logo depois a internet ficou indisponível. Uma pessoa conseguiu fotografar o fogo na subestação da Isolux. Falta de energia é parte da rotina no Amapá em áreas alagadas da cidade, que não têm estrutura e fazem ligações clandestinas de luz pois a operadora não oferece.

Quando a foto da subestação em chamas foi divulgada foi que a população soube que o negócio era mais sério. Quedas de luz são restabelecidas logo e a situação não se resolveu em horas. Com a queda de luz do dia 3 a internet e telefone também se calaram. Então não se podia comunicar com ninguém e sem meios de se informar por nenhum canal de comunicação. Não se sabia de nada e não o que se poderia fazer.

No segundo dia, Rafael saiu para comprar mantimentos básicos em pequenas lojas, pois alguns supermercados fecharam com o black out. Muito se especulava sobre o que teria acontecido, mas sem nenhuma notícia normal. A população isolada do poder público.

No terceiro dia começaram a circular notícias sobre o real problema e o impacto disso. Ainda sem luz, as narrativas começaram a chegar mas não davam alento. A promessa é que ficariam 15 dias sem luz. Junte-se a isso falta ainda saneamento básico para a maioria da população, funcionam na base de poços artesianos, com água sem tratamento. E isso funciona na base da bomba para puxar a água, muito artesanal. Se você não tem luz, não tem água.

Rafael teve água por um período maior  de tempo, poupando, conseguiu fazer durar até meados do terceiro dia. Muitos tiveram a falta antes. Começou a rede de solidariedade, pois a situação ficou muito complicada. A água, no norte, é muito precioso devido ao calor e à umidade relativa do ar. Na terceira para a quarta noite sem luz, chegou o mormaço. Daí, sem água e sem luz, a situação se agravou. Início de mês, muitos tinham feito a compra do mês e perderam tudo.

No terceiro dia, ao fazer compras, andou em avenidas e viu muitos acidentes, pela falta de semáforos. Pessoas andando meio sem rumo pelas ruas, clima de tensão. Muitas filas nos postos de combustíveis. Ficavam até dez horas em filas para abastecimento, muitos saíram da cidade, indo para outros municípios, para fugir do problema.

Agora a situação começa a normalizar. Água ainda continua um ítem escasso e caro, pois com pouco saneamento básico as pessoas compram para poder beber. Os garrafões sumiram com o problema. Ainda está complicado comprar água, em falta ou mesmo mais caro.

A pior noite foi a pior. No meio da noite alguns vizinhos tiveram o retorno da eletricidade. Mas para alguns. Não todos. Começaria aí os turnos de energia. Agora a energia vem em turnos e tem variado muito de bairro para bairro. Alguns bairros estão seguindo o cronograma, variando muito de bairro para bairro. Isso está gerando muita revolta da população.

Algo muito grave foi a dificuldade em poder se comunicar com a família. Nesse caso, a mídia nacional ainda não estava noticiando. Aliás, não se sabia se a mídia estava noticiando. Esta foi mais uma negligência, ocorrida em dose mais grave. Com a volta gradual, puderam avisar os familiares. O Amapá ficou ilhado. Agora a situação é a seguinte: a vida normalizou para alguns mas algumas regiões vivem abastecimento bem mais irregular. Muitas dúvidas e nenhuma certeza, não sabem se a companhia vai continuar no estado, quem vai arcar com o compromisso dos prejuízos. O acidente foi por condição meteorológica, mas a empresa Isolux tivesse cumprido sua parte no acordo e a Aneel tivesse fiscalizando, não se teria chegado neste ponto. Mistura de problema ambiental com negligência. Agora é esperar para ver como é que fica, pois Brasil é pródigo em impunidades, em tragédias sem reparação. Importante que os brasileiros acompanhem tudo isso, pois vai valer para outras regiões. E que a cobertura da imprensa continue até o restabelecimento do serviço.

 

2 Comentários

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  1. Uma correção é necessária: a subestação não pertence à Eletronorte, e sim à Isolux, empresa que venceu o leilão e ganhou a concessão. A Eletronorte é quem está trabalhando pra restabelecer o sistema.

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