Rádios comunitárias e livres lutam contra criminalização da atividade

Patricia Faermann
Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.
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Sugerido por Alfeu

Por Helena Martins 

Da Agência Brasil

Desde os anos 1970, as rádios sem fins lucrativos se multiplicaram pelo Brasil, seja como comunitárias, quando têm autorização para funcionamento, ou livres, termo que se refere àquelas que ocupam o espectro eletromagnético mesmo sem permissão legal. Desde sempre, a preocupação foi falar para públicos específicos, permitindo o debate e a discussão da cidadania.

Ainda hoje, quando o rádio para alguns se tornou coisa do passado, usar o transmissor para se comunicar é única opção para muitos grupos sociais. Para eles, é preciso valorizar a comunicação comunitária, garantindo espaço e meios para que esses veículos possam multiplicar as vozes que circulam na mídia e produzir um conteúdo que, muitas vezes, não entra na agenda dos meios comerciais.

A batalha para manter os veículos de comunicação em atividade, entretanto, é dura. As organizações apontam que as rádios e os comunicadores têm sido criminalizados. Grupos que reúnem ativistas ou veículos de comunicação comunitária, como a Associação Brasileira de Radiodifusão Comunitária (Abraço), apontam dificuldades para a obtenção da outorga e criticam as restrições impostas pela Lei 9.612/98, que regulamenta o serviço. A lei proíbe veiculação de publicidade e estabelece limite de potência de 25 watts e abrangência de 1 quilômetro para a emissora comunitária.

Uma das rádios livres mais antigas e em operação no país, a Rádio Muda, desde meados dos anos 1980 funciona no interior da torre da caixa d’água da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). João Francisco*, que integra o coletivo que produz a rádio, conta que o veículo nasceu com o objetivo de lutar pela liberdade de expressão.

“É uma batalha contra grandes conglomerados econômicos, que ganham muito dinheiro com anúncios, mas também uma batalha de cunho estético-político, de fazer com que as pessoas possam se expressar livremente”, afirma

A Rádio Muda é um exemplo de criminalização. Segundo João Francisco, já houve várias tentativas de fechar a rádio ou lacrar equipamentos. Atualmente, parte das pessoas envolvidas na produção do veículo responde a dois processos judiciais, um na área criminal e outro na cível. O comunicador reclama da situação, pois considera que a rádio não causa interferências.

“É uma rádio de baixa potência, não há dano. A gente sempre buscou transmitir em uma frequência que não era usada por outro rádio. Isso é, a gente ocupava o espaço que estava vazio no espectro e a gente fazia a nossa transmissão”, disse.

Segundo a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), os registros de processos dos últimos cinco anos mostram que 30 entidades autorizadas como rádio comunitária foram penalizadas devido à potência e 198 devido ao uso não autorizado de radiofrequência.

O número pode ser maior, se consideradas as livres, mas não há dados sistematizados que apontem quantas emissoras foram fechadas ou o total de equipamentos apreendidos. Também não há informação exata sobre o número de integrantes das associações responsáveis por esses veículos que acabou sendo processado por comunicar.

Segundo a organização Artigo 19, essa criminalização ocorre porque existem legislações que preveem sanções criminais para o exercício da radiodifusão. A organização também avalia que a situação decorre da política de fiscalização, que reprime a atividade, e do entendimento judicial de que contra ela devem ser aplicadas sanções criminais e não administrativas.

“A criminalização da rádio comunitária acaba acontecendo porque o juiz considera que, na possibilidade eventual de causar algum dano a outros meios, é justificável atribuir uma pena criminal a esse comunicador”, avalia a advogada da organização, Karina Ferreira.

Na opinião de Karina, as leis que tratam do tema, como o Código Brasileiro de Telecomunicações, de 1962, estão defasadas e não se referem diretamente à prática da rádio comunitária, mas sim ao exercício clandestino da prática de telecomunicações. Por isso, na opinião dela, essas leis não deveriam ser tomadas como base de um processo penal contra as emissoras.

 

Patricia Faermann

Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.

4 Comentários

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  1. Muitas rádios populares ou

    Muitas rádios populares ou cidadãs poderiam funcionar no Brasil, mas são proibidas por interesses políticos e/ou econômicos.

    O grosso das autorizações são liberados para políticos ou parentes, enquanto outras entidades têm dificuldades extremas para uma obtenção legal.

    Conheço o caso de uma escola que levou mais de dez anos para obter sua permissão, sendo que era mais do que provado que o alcance seria pequeno, em relação às rádios comuns, e a finalidade era puramente educacional.

  2. Mais um daqueles erros/medos

    Mais um daqueles erros/medos oceânicos do PT. Vai completar 16!! anos no poder sem ensinar ao grosso da população brasileira que ela é a dona dos canais eletrônicos de comunicação. Qualquer cidadão comum nasce, cresce e morre achando realmente que a globo é dona e pode fazer o que quiser com seus valiosíssimos canais de rádio e tv. 

  3. Enquanto a raposa estiver

    Enquanto a raposa estiver cuidando do galinheiro isso não vai mudar.

    Na minha cidadela do sul de MG uma “rádio pirata” operou durante anos sem ser incomodada, gozando de significativa audiência entre os moradores e valorizando o que era de importância local, como tem que ser em qualquer veículo.

    Tinha até horário político para as eleições municipais, copiando as regras oficiais.

    Um belo dia o que aconteceu? “O poder público fez seu papel”.

    (Papel de defender os interesses da imprensa gorducha, claro. A rádio foi fechada.)

    Alguns anos depois tudo foi contornado. A princípio a rádio tornou-se filial de uma outra concessão maior (mera retransmissora) e depois conquistou o registro.

    Mas a Globo poooooooode mostrar tudo o que quiser sem interferências, né MP???

  4. Saindo do blog

    Neste momento, estou saindo do blog porque não consegui acessar as páginas 2, 3, 4 ……………………………

    Audiência não vai subir tanto como se esperaria.

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