As cidades e o tempo de leitura

Atualizado às 13h45

Os projetos políticos atuais precisam urgentemente incorporar o valor “cultura” como uma coisa muito séria para a sociedade. A cultura é importantíssima para equilibrar a vida social e a formação da personalidade de seus indivíduos. É uma forma de saber. O conhecimento somente não basta. Já houve no Brasil uma preocupação bem maior com a política cultural. E quando falo de cultura, aqui, estou falando basicamente de leitura, de livros, e de espaços, lógico, como para a música e o teatro.

Quando estava ainda na graduação de Letras da UFSCar, fiz com a profa. Irene um projeto para a Pró-Reitoria de Extensão, que se chamava Hábitos de Leitura em um Pólo Tecnológico brasileiro. Nesse projeto estudamos várias abordagens sobre o mundo da leitura em São Carlos, que incluiam também o mercado literário e as teorias acadêmicas sobre leitura. Autores como Marisa Lajolo, Ezequiel T. da Silva, Paulo Freire e vários outros foram estudados, em confronto com dezenas de entrevistas de vários cidadãos.

UmadUma das conclusões principais a que chegamos, além do preço dos livros, da falta de uma política popular para a formação de bibliotecas DOMÉSTICAS, dos estudantes, das donas-de-casa ou de profissionais, e da falta de cultura de bibliotecas populares que tenham publicações como jornais e revistas próprios, comunitários, e publiquem os autores locais e até por bairros, foi a do tempo. O tempo de leitura. A nossa cultura atual, industrial, impositiva, monopolista, míope, restrita, imediatista, aplica na verdade uma política de estrangulamento total do tempo de leitura.

O ritmo social que vivemos, o espaço interno das casas, os outros meios de comunicação social, como a TV (a TV nas salas, calou a família – não fala agora, fica quieto! – o computador nos quartos, etc.), a tentativa de sugar toda a energia dos cidadãos, a cada dia, a falta de condições dos transportes urbanos, a própria escala de valores totalmente materialistas, a depreciação do estudo, a enorme queda do nível intelectual geral da sociedade, as editoras também querendo explorar ao máximo o livro como objeto de lucro, de consumo, sem preocupação de ampliar o público leitor em edições mais acessíveis, tudo combinado faz com que aqueles momentos, em que se sentava no terraço, na cidade, no sítio, na cadeira de balanço, na rede, coisas assim, tudo isso está praticamente extinto. Não é só a letra cursiva, mas, tragicamente, e tragicamente mesmo, a leitura em seu sentido amplo está em extinção. O culto ao livro.

Já cheguei a ter quase 500 livros, mas e o tempo para ler esses livros. E as pessoas perguntando, mas ler tantos livros para quê? É, meus amigos, é triste, muito triste. Peço um minuto de tristeza para todos, em nome dos livros e de nós. Quem sabe uma pequena lágrima?

Por Leandro A

Prezado Luiz Horácio, concordo em gênero com seu artigo, mas discordo em graus.

Antes de mais nada, confira o site Skoob, sobreo projeto de uma rede social de leitores (http://www.skoob.com.br). O Nassif precisa postar sobre essa iniciativa…

Tempo é a gente quem faz, é parte do processo de retomar a vida nas mãos (naquilo que toca ao livre arbítrio…), de amadurecimento do indivíduo e conscientização da individualidade.

Quando eu cursava o 1° ano do ensino médio, um professor de geografia (Eduardo), diante da dificuldade da classe em concatenar a dinâmica dos movimentos econômicos da globalização, nos apresentou a várias revistas (Carta Capital, Caros Amigos, Bundas – sensacional! Criada pelo Ziraldo em contraponto à CARAS -, Super Interessante, Exame e até Globo Rural), alguns encartes de jornais ( MAIS+, economia do Estado de São Paulo, um encarte da falecida Gazeta Mercantil do qual não me recordo mais e por aí vai). O primeiro argumento da classe foi a falta de tempo, no que o professor ponderou: “quem assiste novela? quem asssite futebol? quem assiste Chaves?” No que a turma quase em peso assentiu que acompanhava, invariavelmente, um ou outro tipo de programação.

Nosso professor simplesmente disse, que a partir daquele momento de nossas vidas, a responsabilidade por quem seríamos dez anos depois dependia diretamente de nossas escolhas conscientes. Nos aconselhou, sem desmerecer programação alguma, que trocássemos as horas despendidas em tais atividades pela leitura de revistas, livros ou aprendizagem de idiomas.

Como o colégio era extremamente puxado, a maioria de nós acatou o conselho, alguns a muito contragosto, mas no somatório geral, o resultado foi bom. A forma como aquilo foi nos colocado, aqui explanado em termos frios, sem contexto e sem emoção, conseguiu nos despertar de um sono televisivo, imposto nas conversas cotidianas.

Assim, a conclusão que me ponho nesse assunto, é que a leitura somente desabrocha no altar dos sacrifícios cotidianos (partindo-se da perspectiva da nossa sociedade de massas e consumo, onde qualquer esforço é repelido, em prol de uma postura hedonista). O incentivo tem de partir de algum lugar, de alguém – talvez aí se insira o papel do governo, de uma política cultural -, sendo preciso um movimento de ativação, sobremodo em meios onde a leitura ainda é vista como algo desproveitoso ou destituído de sentido pragmático para a vida (posso afirmar que no interior é revestida de certo preconceito e desconfiança). Construir excelentes bibliotecas, sem bibliotecários ou leitores encaminhados, é perder tempo na construção de templos de mofo.

Luis Nassif

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