Os deuses estão mortos no filme “Prometheus”

 

A crítica especializada e os fãs de sci fi e da franquia de filmes “Alien” têm se demonstrado decepcionados com “Prometheus” (2012) onde Ridley Scott retorna ao gênero que o consagrou. Todos procuraram nesse filme as explicações para o que se sucedeu antes da chegada da nave Nostromo naquele planeta perdido onde a morte estava à espreita no clássico “Alien” de 1979. Mas parece que Ridley Scott pregou uma peça em todos. “Prometheus” aproxima-se muito mais dos temas do outro clássico “Blade Runner” (1982) que também dirigiu: assim como o replicante Roy buscava seu criador em uma sombria Los Angeles, em “Prometheus” arqueólogos procuram os “Engenheiros” da humanidade. Como em “Blade Runner”, humanos e androides vão encontrar demiurgos tão desiludidos quanto eles mesmos. Descobrirão isso da pior maneira possível.

O filme abre com uma sequência aérea mostrando paisagens montanhosas, vales, lagos e cachoeiras ao som de uma música majestosa e épica até vermos um disco voador pairando sobre uma cachoeira. À margem da cachoeira vemos um ser com aparência humanoide, alto, com músculos bem definidos e forte. Leva à boca uma substância que, rapidamente, cria uma espécie de reação em cadeia em cada molécula do seu corpo.  Ele cai na água e se desfaz, como se o seu DNA fertilizasse o planeta Terra, criando uma nova espécie: a humanidade.

Como o diretor Ridley Scott afirmou em entrevistas, ele quis prestar uma homenagem a Erik Von Daniken (autor do best-seller “Eram os Deuses Astronautas?”) e a sua tese de que a humanidade descenderia de alienígenas e que os deuses adorados em diferentes épocas e culturas, na verdade seriam reminiscências dessa civilização extraterrestre que intencionalmente nos criou.

Essa sequência inicial nos leva a acreditar que estamos diante de mais um filme que renderá homenagens a essa utopia “new age” de sermos filhos das estrelas onde encontraremos as respostas a todas as questões clichês do gênero: quem somos? O que estamos fazendo aqui? Qual o propósito de tudo?…

Mas temos que lembrar que Ridley Scott retorna com esse filme ao gênero sci fi onde deixou como a principal marca os mundos distópicos que criou: “Alien” de 1979 (uma nave de mineração tripulada por astronautas destituídos de qualquer ideal mais nobre e odiando-se mutuamente encontra um monstro xenomórfico que inicia uma brutal chacina) e “Blade Runner” de 1982  (replicantes têm mais sentimentos do que os humanos em uma sombria Los Angeles onde cai uma insistente chuva ácida). Portanto, sabendo que o diretor foi o responsável por esses dois clássicos do gênero, nada é o que parece.

O sacrifício de um dos “Engenheiros” 
que abre o filme

A narrativa é centrada em um casal de arqueólogos, Dra. Elizabeth Shaw (Noomi Rapace) e o Dr. Charlie Halloway (Logan Marshall-Green) que descobrem uma série de antigos desenhos rupestres de culturas diferentes e separadas por milhares de anos que apontam para um único local nas estrelas: uma lua distante, LV-223. Shaw e Holloway creem que nessa lua será encontrada a antiga verdade sobre as origens da humanidade – crença que também é partilhada pelo bilionário Peter Weyland (Guy Pearce), CEO da corporação Weyland. Depois de ouvir as conclusões dos arqueólogos sobre os “Engenheiros” (assim como definem os aliens que teriam nos criado), concorda em enviá-los junto com uma tripulação de quinze pessoas a bordo da nave Prometheus.

Mas as intenções de Weyland não são tão místicas quanto dos arqueólogos: ele quer encontrar os “Engenheiros” para conseguir a vida eterna, já que se encontra em idade avançada. Para garantir seus interesses, envia um androide chamado David (Michaek Fassbender), cuja função é muito mais do que manter a nave em funcionamento enquanto a tripulação está em crio-sono durante a viagem: ele deverá realizar pesquisas “independentes” e prestar contas diretamente a Weyland.

O Futuro do Passado

sci fi de Ridley Scott se insere naquilo que os pesquisadores sobre a chamada “estética pós-moderna” denominam como “futuro do passado”. Ao contrário da ficção científica moderna onde o imaginário futurista e utópico com lugares, situações e oportunidades inéditas para a humanidade (“indo onde nenhum homem jamais esteve”, como exortava a célebre abertura da série de TV “Star Trek”), Ridley Scott nos mostra mundos futuros que parecem semelhantes ao presente: tramas de corporações, traições, suspeitas, sonhos desfeitos, monstros viróticos. O “demasiadamente humano” associado com más funções tecnológicas criam mundos, na verdade, a-tópicos. Isto é, uma sci fi paradoxalmente sem futuro, porque replica as mazelas do presente

Se em “Alien” e “Blade Runner” temos o sci fi retro (lembre-se do design neobarroco tanto da nave Nostromo quanto do space jokey e do monstro xenomórfico ou da Los Angeles com prédios antigos emoldurados em neon e muitos chapéus e sobretudos dos filmes noir dos anos 1940), em “Prometheus” temos o cúmulo desse futuro do passado: se as hipóteses dos arqueólogos estivessem corretas, não teríamos assistido à chacina da tripulação de “Alien” de 1979.

O neobarroco de Ridley Scott: 
sci fi “futuro do passado”

Por exemplo, é marcante que após “2001: Uma Odisséia no Espaço” de Kubrick onde os espectadores acompanham a épica jornada humana ao encontro de seus criadores e testemunham o nascimento do “star child” que mudará o futuro da humanidade, temos a distopia do “Planeta dos Macacos” de 1968: o futuro é pós-apocalíptico e repete os mesmos dramas do mundo atual. Esse filme apresenta um mundo pós-apocalipse dominado por macacos que evoluíram muito mais do que os homens após uma gigantesca hecatombe nuclear. Chegamos ao futuro, mas ele não mais existe. “Alien” (1979) e “Mad Max” (1979) confirmam a chegada deste futuro sem futuro, pós-apocalipse, triste e melancólico.

“Prometheus” e “Blade Runner”

Em “Prometheus” Ridlet Scott também retorna ao tema do filme “Blade Runner”: o encontro com o Criador. Se em 1982 vemos um replicante chamado Roy buscando um encontro com o seu criador da Tyrrell Corporation para conseguir viver mais (os replicantes eram programados para viverem apenas quatro anos), em “Prometheus” todo o propósito da expedição à lua LV-223 é encontrar nos “Engenheiros” as respostas sobre o propósito da existência e a luta contra a velhice e a morte.

“Blade Runner” era uma adaptação de obra do escritor Philip K. Dick (“Do Androids Dream of Eletric Sheep”) com inspiração gnóstica explícita: o homem em busca do seu Criador/Deus descobre que, na verdade, Ele não passa de um maquiavélico Demiurgo que não o ama.

O androide David econtra a divindade na
própria alma humana

Pois “Prometheus” retorna a esse tema gnóstico: “os Engenheiros” não são nem deuses e nem benevolentes e sábios, são Demiurgos enlouquecidos às voltas com uma tecnologia que se voltou contra eles em uma lua fria perdida no meio do nada.

Ao invés de encontrar respostas reconfortantes às grandes questões religiosas e metafísicas, a tripulação da nave se depara com as primeiras gerações do monstro xenomórfico de “Alien”.

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Luis Nassif

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