Andre Motta Araujo
Advogado, foi dirigente do Sindicato Nacional da Indústria Elétrica, presidente da Emplasa-Empresa de Planejamento Urbano do Estado de S. Paulo
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Como o Fundo Nacional Judaico comprou terras na Palestina, por André Araújo

Como o Fundo Nacional Judaico comprou terras na Palestina

por André Araújo

Muito antes da criação do Estado de Israel, quando a Palestina era um mandato britânico, uma aristocrática família do Libano, os Sursock, de origem grega ortodoxa, radicada em Beirut desde 1714, era dona de  42.000 hectares no norte da Palestina, o vale de Jezreef, perto  de Haifa.

Nesse vale os Sursock construíram uma ferrovia que atravessava o vale.

Essa grande área dentro de um território pequeno, a Palestina sob governo britânico, foi vendida ao Fundo Nacional Judaico, uma organização fundada em 1901 com recursos  dos judeus ricos da Europa, com a família Rothschild à frente. O Fundo pagou, em 1906, 750 mil Libras esterlinas, o equivalente atual de 180 milhões de dólares pela área dos Sursock, sendo essa a maior compra de terras palestinas efetuadas por judeus antes da fundação do Estado de Israel, hoje o fundo é o maior proprietário de terras em Israel, com 13% do território israelense.

O Fundo Nacional Judaico foi criado no Quinto Congresso Sionista Mundial na Basileia, como entidade privada para comprar terras para os judeus na Palestina é uma organização controvertida no próprio Estado de Israel, acusada de falta de transparência financeira  e politicas  pouco generosas nos contratos de aluguel de terras para agricultores.

Os Sursock se tornaram uma das dinastias mais ricas e poderosas do Império Otomano, como coletores de impostos para o Sultão de Constantinopla e depois com manufatura de seda, comércio de trigo, navegação e grandes áreas de terra no então Império Otomano, especialmente na Siria e no Egito.

A família  investiu seus ganhos comerciais em prédios em Beirut, Constantinopla  e Alexandria no Egito, tornando-se grandes proprietários de imóveis nessas cidades, também investiram em ferrovias e portos no Levante, o Hipódromo de Beirut e o primeiro cassino da cidade.

Em Beirut, os Sursock tinham vários palácios, dois deles viraram museus (ver website www.sursockpalace.com). Sursock and Brothers tinha agências e filiais por toda a Europa e grande escritório em Londres além de palácios em Beirut (hoje é museu) e Istambul.

Seus membros se aliaram por casamentos com a aristocracia europeia, uma Sursock, Isabelle,  se casou com o Prinicpe Marcantonio Colonna, de uma das mais antigas famílias da nobreza  papalina e tornou-se uma líder da alta sociedade italiana durante o período fascista e no pós-Guerra. Durante a República a Princesa Isabelle Colonna era considerada a “Rainha de Roma”, recebia  a alta sociedade peninsular no magnifico Palacio Colonna em Roma. (ver website www.galleriacolonna.it). Isabelle Sursock Volonna nasceu em 1889 e morreu emm 1984 com 95 anos.

Outras moças Sursock se casaram na nobreza espanhola e britânica, com o que a partir de uma família de mercadores se tornaram parte da aristocracia englobando Europa e Oriente Médio.

Os Sursock mancharam sua imagem no Libano durante a Primeira Guerra, quando Beirut  passou fome e os Sursock se beneficiaram do mercado negro de trigo para realizar enormes lucros, aumentando sua já grande fortuna e poder politico.

Os Sursock faziam parte de um círculo de famílias proeminentes de Beirut, como os Trad, os Bustros, os Tueni, os Fernane, os Fayad, os Yaziji,  os Calil, cristãos e com forte presença cultural, social e politica no Libano desde os tempos do Império Otomano e depois no mandato francês, chegando ao Libano independente de hoje, influentes na politica, nas finanças e nas letras, constituindo um enclave social cristão dentro do Império Otomano.

O projeto de um Estado nacional judeu era muito anterior à criação do Estado de Israel em 1947 e seus passos preparatórios foram a compra de terras pertencentes a proprietários ausentes, sendo os Sursock os maiores proprietários de terras no mandato britânico. Pode-se dizer que os Sursock foram a principal família em importância politica e financeira no Libano no período que vai de 1880 a 1946, quando o Pais se tornou independente  com o fim do mandato francês e transformou-se  numa República, na qual o Presidente é sempre um cristão e o Primeiro Ministro sempre um muçulmano, conforme a Constituição libanesa. Esse foi um arranjo bastante complicado e que gerou conflitos e crises que não impediram o Libano de ser um dos países mais prósperos do Oriente Médio mesmo em meio a guerras civis e cataclimas políticos. A influência cultural francesa se manteve mesmo depois da independência, com o dinheiro libanês impresso em língua francesa, assim como o nome das ruas, o jornal oficial e os principais jornais de Beirut.

Quando se diz no Brasil que os árabes da diáspora, na realidade  libaneses cristãos, se dão bem no Brasil com os judeus, não é nenhuma novidade, significa que aqui se repetem as mesmas alianças no Oriente, os cristãos libaneses são de fato aliados dos judeus nos conflitos palestinos, os inimigos dos judeus são os libaneses muçulmanos, um grupo maior em número que os cristãos e que no conflito árabe israelense tomam o partido dos palestinos.

Os libaneses cristãos tem hábitos e atitudes muito diferentes dos seus compatriotas muçulmanos, as relações sociais e comportamentais são totalmente liberais nos  tratos, no vestuário, na frequência livre a bares e boates, comportam-se em Beirut como em Paris ou São Paulo, já os libaneses muçulmanos são rígidos na sua vida social, no padrão islâmico.

Os libaneses muçulmanos são bem menos comuns no Brasil, a grande imigração libanesa para o Brasil foi de cristãos, exatamente porque se sentiam perseguidos pelos muçulmanos durante o Império Otomano, os muçulmanos faziam parte do “mainstream” otomano e os cristãos eram uma minoria dentro de um Pais islâmico.

A saga da família Sursock já foi narrada em muitos  livros e faz parte integral da historia do Libano, lembrando que ao tempo de seu deslocamento da Grécia para  Beirut no começo do Século XVIII, tanto a Grécia como o  Libano eram parte do mesmo Império Otomano.

 

 

Andre Motta Araujo

Advogado, foi dirigente do Sindicato Nacional da Indústria Elétrica, presidente da Emplasa-Empresa de Planejamento Urbano do Estado de S. Paulo

16 Comentários

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  1. ” exatamente porque se

    ” exatamente porque se sentiam perseguidos pelos muçulmanos durante o Imperio Otomano, os muçulmanos faziam parte do “mainstream” otomano e os cristãos eram uma minoria dentro de um Pais islâmico.”

     

    Não havia qualquer perseguição aos cristãos no Líbano otomano. Aliás, os cristãos, naquela época, eram maioria em território libanês. 

     

    Os libaneses cristãos emigraram para o Brasil pelo mesmo motivo que outros emigraram: pobreza e falta de perspectiva na sua terra natal. 

    E nada mais.

    1. http://journals.sagepub.com/d

      http://journals.sagepub.com/doi/abs/10.1177/002200948001500405

      TODAS os livros sobre a Historia do Libano descrevem  os ENORMES conflitos religiosos que atingiram a comunidade cristã libanesa sob dominio de satrapas muçulmanos apontados pelo Imperio Otomano para gerir o Libano durante todo o Seculo XIX, a ponto de justificar intervenção francesa em varias ocasiões entre 1850 e 1895 para protegeger os cristãos.  Uma das principais razões de emigração de jovens libaneses cristãos era o recrutamento obrigatorio para servir no exercito turco. É claro que  havia emigração tambem por razões economicas MAS o fator de perseguição religiosa é evidente, comprovado pela NÃO existencia de emigração por  libaneses muçulmanos que tambem sofriam da mesma miseria economica, no entanto a quase totalidade da emigração era de cristãos.

      1. A não-emigração de libaneses

        A não-emigração de libaneses muçulmanos deve-se a um fato simples, André: eles quase não existiam. O Líbano era até mais ou menos 1930 entre 80 e 90% cristão, sendo as regiões do interior (as mais pobres) 100% cristãs. 

        Os muçulmanos aumentaram sua população no Libano a partir justamente da criação de Israel, com a emigração massiva de palestinos e jordanianos para o sul do Líbano.

        A razão, repito, para a emigração massiva deles para o Brasil foi econômica.

        O grosso dos libaneses que foram para o Brasil era da região montanhosa, uma das mais pobres, onde o cristianismo existe desde os tempos bíblicos. 

        Pergunte ao Nassif porque os avós dele emigraram. 

        Enfim, o seu texto está em geral correto, mas peca neste ponto. 

        1. Meu caro, agradeço seu

          Meu caro, agradeço seu interesse mas voce esta completamente equivocado. A população muçulmana no Libano está lá há seculos e corresponde a 55 a 60% da população do Libano. O PACTO NACIONAL de 1943 estipula que o Presidente da Republica será sempre um critão maronita, o Primeiro Ministro um muçulmano sunita e o Presidente do Parlamento um muçulmano xiita. O Pacto Nacional e a Constituição a ela agregada são de 1943, portanto antes da criação do Estado de Israel e ja refletiam a base demogfrafica do Libano, o que exigiu um Constituição CONFESSIONALISTA, baseada na divisão religiosa da população.

          O que ocorreu com os conflitos israel-palestinos foi um aumento de muçulmanos por causa de refugiados mas esse novo nucleo NÃO se confunde com a população original do Libano tanto no Imperio Otomano como no mandato francês que sempre foi nessa base, um pouco mais da metade muçulmanos e um pouco menos da metade cristãos.

          Quasnto a emigração, de fato vieram mais da zona montanhosa, especialmente da região de Zahle MAS tambem vieiram muitos de Beirut, um outro tipo de emigrante já mais preparado inclusive medicos como Fadlo Aidar, Wadih Safady,

          professores como Nami Jafet e jornalistas como meu avô Jorge Haddad, cujo avo, Nasif al Iaziji foi um dos precursosres

          do movimento nacionalista arabe no Seculo XIX, fundador da Sociedade Sirio de Ciencia que é uma das sementes do Partido Baath, primeiro movimento nacionalista arabe laico. Nasif al Iaziji  (ver Wikepedia e Enciclopedia Britannica) ) um filologo, foi o unificador e modernizador do alfabeto arabe, que é o que hoje se adota nas escolas e fez a primeira tradução da Biblia para o idioma arabe. Há uma esatua dele na Universidade Americana de Beirute.

          Seu filho Ibrahim al Iaziji (ver Wikepedia) foi um dos maiores poeta modernos da lingua arabe

          Considero que havia duplo motivo para a imigração, de natureza politica especialmente entre 1880 e 1914, os jovens que fugiam do recrutamento turco e a partir do mandato frances, uma leva menor em quanrtidade tinha motivação economica.

           

          1. Hã outro questão a ser
            Hã outro questão a ser considerada que é a das identidades etnicas. A população de palestinos que emigrou para o Líbano continuou sendo palestina etnicamente. Para o libanês, cristão ou muçulmano, palestino não é libanês.

          2. Não só no Libano

                Nos paises arabes em geral a situação de um “palestino” é a mesma, nas monarquias do Golfo ( Emirados, Arabia Saudita etc… ) é pior ainda que no Libano.

          3. É uma grande injustiça, os

            É uma grande injustiça, os palestinos são em geral bem instruidos e alguns muito cultos, não são fundamentalistas religiosos,seu ativismo e mais politico que religioso, há inclusive muitos palestinos catolicos. Mesmo assim são parias sociais em todos os paises arabes, cidadãos de segunda classe nos paises para onde se refugiaram.

          4. Pela lei do Líbano só tem
            Pela lei do Líbano só tem direito a nacionalidade libanesa os filhos de homens libanesas. É o jus sanguinis patriarcal. As mulheres não passam sua nacionalidade para os filhos. Janelas legais para estrangeiros se naturalizarem libaneses parece que não existem. E assim em vários países, até na Alemanha valia o jus sanguinis, não sei se mudou, havia uma movimentação para alterar a lei e permitir naturalizações.

          5. Bekaa / Zahlé

               Uma bela região do Libano, Zahlé até vale uma visita, sempre se encontrará alguem que fale português e tem um parente no Brasil ou mesmo já viveu aqui, mas tem um problema sério e grave :

                Excesso de Corintianos.

  2. André, o que você sabe sobre
    André, o que você sabe sobre os Lulia,família de libaneses que nos roubou a presidência?

  3. Como em todas as nações e

    Como em todas as nações e culturas entre os judeus existem aqueles que ajudam a evolução do ser humano e do mundo, e outros no entanto, que perseguem e assassinam quem se coloca na defesa do bem de todos e desse mundo. 

     

     

  4. Pré – ” Aliyah”*, antes do Rothschild

        Caro AA,

        Nesta história referente a aquisição de terras otomanas pelo “fundo judaico” ( que foram varias, como a “Aliyah Bet”, ou “Agencia Judaica de imigração”, Corporação para Investimento na Palestina, Fundação Schumann de Theodor Herzl ….), negociadas pelos “effendis” otomanos, caso da familia por vc. descrita, somente foi possivel graças a negociações realizadas em 1856, entre  Sir Moses Montefiore e o Sultão otomano.

         Em Israel areas vendidas a Rothschild pelos Sursock, são conhecidas como ” Alta Galiléia”, sendo a primeira colonia a atual cidade de Rosh Pinna, adquirida em 1.883, a qual marcou a “1a Aliyah”.

         P.S.:   André, existe sim grandes discussões entre libaneses e judeus em São Paulo, como por exemplo qual o melhor falafel, ou de qual festa é a melhor, o Rosh Hashaná na Hebraica, ou um jantar de ano novo no Monte LIbano ( prefiro o do Sirio Libanês, questão de gosto e “quantidade” ).

     

    1. Meu caro Junior, a Agencia

      Meu caro Junior, a Agencia Judaica (Barão Hirsch)  comprou terras no Rio Grande do Sul  para judeus russos que estavam sendo perseguidos na Russia czarista no começo do Seculo XX, essa foi a origem da grande colonia judaica gaucha.

      Mas de todas essas organizações o FUNDO NACIONAL JUDAICO é de longe a maior, com sede em Jerusalem e escritorio central em Nova York, só nesses dois locais o Fundo tem 960 empregados.

  5. Como o fundo nacional judaico comprou terras na palestina?

    Sr. André, como posso encontrar informações veridicas sobre esse assunto de tão pouco divulgação…? parece oculto aos olhos das massas de um modo geral. A compra de terras palestina por judeus, isso acontenceu até quando, foi só no periodo do sionismo?

  6. A propria Golda Meir falava dessas compras de terras. 14 porcento do estado de Israel, então eles são donos de metade das terras desde o jordão até o mar. O deserto do Negeb é metade do estado de Israel, mas duvido que eles compraram terras no deserto.

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