Dalva de Oliveira, o Rouxinol do Brasil, por Mara L. Baraúna

Trio de Ouro

Vicentina de Paula Oliveira (5 de maio de 1917, Rio Claro, SP – 31 de agosto de 1972, Rio de Janeiro, RJ)

Dalva de Oliveira, o Rouxinol do Brasil

por Mara L. Baraúna

Vicentina era a filha mais velha de Mário Antônio de Oliveira e Alice do Espírito Santo Oliveira. Tinha outras três irmãs, Nair, Margarida e Lila, extremamente musicais, mas não seguiram a carreira. Seu pai, conhecido como Mário Carioca, era marceneiro e músico nas horas vagas, tocava clarinete e costumava realizar serenatas com seus amigos músicos, chegando a organizar um conjunto para tocar em festas. Era tão boêmio que sonhava em ter um filho homem, a quem daria o nome de Vicente, para acompanhá-lo na farra. Mas nasceu uma menina que recebeu o nome de Vicentina. Quando cresceu um pouco, o pai a transformou em sua grande companhia nessas serenatas. Chamava-a de Vicente e a levava aos bares de Rio Claro, onde, ainda menina, aprendeu a tomar cachaça com ele.

De Rio Claro, a família foi para Belo Horizonte. Viviam de forma bastante modesta e quando ela tinha apenas oito anos, sofreram um duro golpe: Mário faleceu, deixando a esposa com quatro filhas para criar.

Dona Alice resolveu tentar a vida na capital paulista, onde arrumou emprego de governanta. Conseguiu vaga para as filhas em um internato de irmãs de caridade, o Internato Tamandaré, onde Vicentina chegou a ter aulas de piano, órgão e canto lírico. A menina ficou lá por três anos, até ser obrigada a sair, devido uma séria infecção nos olhos. Nessa ocasião, a mãe perdeu o emprego, pois os patrões não aceitaram a presença da filha. Dona Alice conseguiu emprego de copeira em um hotel e Vicentina passou a ajudá-la. Trabalhou então como arrumadeira, como babá e ajudante de cozinha em restaurantes. Depois, conseguiu um emprego de faxineira em uma escola de dança onde havia um piano.

Transferiram-se para o Rio de Janeiro em 1934, onde foram morar à Rua Senador Pompeu, num cortiço. Nessa época, a família já estava novamente reunida, pois as irmãs voltaram a morar com a mãe. No Rio de Janeiro, empregou-se como costureira numa fábrica de chinelos, da qual um dos proprietários, Milton Guita, conhecido como Milonguita era diretor da Rádio Ipanema. Gostava de cantar enquanto trabalhava e um dia foi ouvida por Milonguita que a convidou para um teste na Rádio Ipanema. Foi aprovada e logo depois transferiu-se para as Rádios Sociedade e Cruzeiro do Sul, onde cantou ao lado de Noel Rosa. Depois, passou pela Rádio Philips e finalmente conseguiu trabalho na Rádio Mayrink Veiga. O Rio de Janeiro era a metrópole que atraía os talentos de todo o país para seus palcos, seu grande sonho. Muito magrinha, bastante tímida, se inscreveu no programa Calouros em Desfile, de Ary Barroso, já com o nome artístico de Dalva de Oliveira. Disse Ary: Minha senhora, quer um conselho? Volte imediatamente pro tanque, de onde nunca deveria ter saído. Vá lavar roupa, a senhora jamais deveria abrir a boca pra cantar!. Dalva chorou muito. Anos depois, já reconhecida como grande cantora, recebeu um pedido de desculpas de Ary Barroso, acompanhado da música Folha morta, transformada por Dalva em grande sucesso.

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Em 1936, Dalva e Herivelto Martins se encontram pela primeira vez no Largo da Cancela, no Teatro Pátria, São Cristóvão, Zona Norte do Rio. Naquela época, Dalva não era uma cantora conhecida, ela se apresentava imitando a atriz Dorothy Lamour. Herivelto fazia um número de palhaço, o Zé Catimba. Ele convida Dalva para fazer parte da Dupla Preto e Branco, que já conta com Nilo Chagas. Herivelto pesquisou um repertório adequado à extensão vocal de Dalva, trabalhou sua postura no palco, escolheu os primeiros figurinos, ensaiou exaustivamente a performance dos três. Não demora muito para que Dalva se destaque por conta do seu talento. Juntos gravam o primeiro disco, pela gravadora RCA Victor.

Modernos para a época, Herivelto e Dalva, antes de se casarem, foram morar juntos. A cantora passa a viver no mesmo cortiço em que Herivelto e Nilo moravam. Finalmente, em 1939, oficializaram a união em dois rituais: na igreja católica e no ritual de umbanda, na praia. Dalva e Herivelto tiveram o primeiro filho, Pery e casaram-se com Ubiratã a caminho. Depois que Nilo se mudou para um quarto na Piedade, Dalva trouxe a família para morar com eles, mesmo ainda em situação difícil. Dormiam todos juntos, no chão, separados apenas pela lona de um circo. Começaram a gravar, a se apresentar em shows, circos, boates nos subúrbios do Rio e em rádios: Dupla Preto e Branco e Dalva de Oliveira, um trio de ouro!, anunciava o comunicador César Ladeira, na então famosa Rádio Mayrink Veiga. Ficava assim batizado o Trio de Ouro.

Herivelto centraliza as finanças e os contratos. Nilo recebia sua parte normalmente, mas a parte de Dalva ficava com o marido, ela não via o dinheiro. Com o trabalho aumentando, conseguiram morar em lugares mais confortáveis. Nos anos 1940 atuaram no Cassino da Urca e no Cassino Icaraí, onde conheceram Orson Welles de quem Herivelto seria assistente de produção do filme inacabado It’s all true, de 1942. Com o dinheiro recebido dos patrocinadores americanos, Herivelto compra uma casa na Ilha do Governador. Welles se apaixona pelo lugar e fica horas e horas bebendo de frente para o mar.

Já tinham contrato fixo desde 1941 com o Cassino da Urca e, em 1943, mudaram-se para a Avenida João Luís Alves, 88, perto do trabalho. Dalva chegava, jogava o sapato para o lado, colocava um avental por cima do vestido de noite, amarrava o cabelo ou punha um turbante e ia cozinhar o melhor macarrão que os inúmeros amigos já comeram. Orlando Silva, Ciro Monteiro, Nelson Gonçalves, Monsueto, Grande Otelo e tantos outros dormiam no chão da sala.

O casal saboreava, em público, o triunfo artístico, mas amargava na intimidade o insucesso amoroso. As brigas, pouco a pouco, se tornavam mais frequentes pelas constantes infidelidades do marido. Os vestígios das noitadas eram cada vez mais evidentes. No carro, Dalva encontrava manchas de batom, fios de cabelo e bijuterias que não pertenciam a ela. De frequentes, as brigas passaram a violentas. Em 1941, Dalva engravida de novo, o casal se envolve em outra briga, Herivelto agride a esposa violentamente, empurra-a escada abaixo e ela perde o bebê. Dalva guarda o feto num vidro com álcool e o deixa exposto no armário do banheiro para que o marido não esqueça do que fez. Muitas vezes, o menino Pery voltou do colégio e descobriu que a mãe estava no hospital. O seu pai havia batido nela. Dalva não engolia nada a seco e espatifava vários cinzeiros na cabeça do marido. Com o desgaste da relação, Herivelto conhece e se apaixona por uma aeromoça, Lurdes, desquitada e mãe de um menino. Ela é apresentada aos amigos como sua namorada. O casamento de Dalva sobrevive por mais três anos por temerem que o Trio se desfaça.

O marco da separação de Dalva e Herivelto se deu numa excursão à Venezuela, iniciada por volta de 1949. Dercy Gonçalves fez um convite ao Trio de Ouro para se integrar à sua companhia teatral que se apresentaria na Venezuela. Herivelto tentava administrar uma situação insustentável – viver em casa com Dalva apenas pelo sucesso do trabalho com o Trio, enquanto o namoro com Lurdes se aprofundava. Ciumento, porém, não admitia, absolutamente, a hipótese de Dalva ser cortejada por alguém. Iniciado o processo do desquite, viajaram sob regime de separação consensual e, por exigência do juiz da Vara de Família, que não considerava o casal apto a dar a atenção necessária aos filhos devido às características do seu trabalho, os meninos foram enviados para um colégio interno, o que causou enorme sofrimento pra Dalva. O show foi um fracasso pelo palavreado e gestos de Dercy, que mesmo em português chocou o público de Caracas, bem mais tradicional. O espetáculo recebeu muitas vaias e o público se retirou do teatro. Foi um susto para quem estava acostumado ao grande sucesso. Dercy, produtora e protagonista, foge para o Brasil. O elenco não recebeu o cachê, não tem como pagar a conta do hotel, não tem a passagem de volta e não sabe como resolver a situação num país estrangeiro. O Trio, desconhecido na Venezuela, se desmembra e procura lugares para fazer seus shows separadamente. Na volta, param por 3 meses em Belém, onde fazem um grande sucesso e conseguem restabelecer a vida financeira. Herivelto sofre com uma nova Dalva, distante e mais segura de si. Volta ao Rio e Dalva permanece em Belém, fazendo apresentações solo com o maestro e compositor Vicente Paiva e sua mulher Amália. É a primeira vez que recebe o dinheiro do seu trabalho. Ao voltar para o Rio, o marido já não está mais em casa.

A separação do casal, em 1947, inicia uma polêmica pública mantida através de músicas provocantes, uma batalha de ofensas mútuas muito explorada pela imprensa da época. O duelo começa quando, em 1947, Herivelto compõe Caminhemos e Segredo.

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Dalva, então, responde à provocação de Herivelto cantando Tudo acabado, de J. Piedade e Osvaldo Martins. Diversos compositores, como Paulo Soledade, Humberto Teixeira, Nelson Cavaquinho, entre outros, abasteciam o repertório de Dalva na briga conjugal mais famosa da nossa história. Ataulfo Alves e Marino Pinto, que foram parceiros de Herivelto em sambas anteriores ao desquite, se transformaram em autores de canções de Dalva. Quem lucrou com os ataques do ex-casal foi a indústria fonográfica, lançando discos e mais discos com as composições de ambos os lados, e a mídia cobrindo cada batalha dessa guerra.  Nessa disputa, contudo, o público pareceu ficar do lado da cantora, assim como os artistas que conheciam o comportamento de Herivelto.

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Enquanto Dalva ascendia em carreira solo, Herivelto via o prestígio do Trio de Ouro acabar. Depois que Dalva deixou o trio, as cantoras Noemi Cavalcante, Lourdinha Bittencourt e Shirley Dom assumiram o posto. O público rejeita o novo Trio de Ouro. Dalva fecha um contrato com a gravadora Odeon e tem um convite para fazer parte do importante elenco da Rádio Nacional. Herivelto não estava preparado para enfrentar a realidade de que Dalva poderia sobreviver sem ele. O ciúme e a inveja pelo sucesso de Dalva levam Herivelto a se aliar ao jornalista e compositor Davi Nasser e ao jornalista da revista Escândalo, Fred Daltro, para denegrir a reputação da cantora. Fred foi levado por um grupo de fãs de Dalva para a Barra da Tijuca (em 1951 era ainda um bairro em formação), apanhou muito e foi enterrado na areia, ficando somente com a cabeça de fora. Além das matérias caluniosas de Herivelto e David Nasser no Diário da Noite, no artigo diário Por que abandonei Dalva de Oliveira, ele e David compõem Caminho Certo, em que insinuam que Dalva teria traído Herivelto com os amigos dele.

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Dalva fazia tanto sucesso que era necessário uma escolta policial para conter os fãs na entrada e na saída do Teatro Recreio. O nome do espetáculo, É rei, sim, direção de Walter Pinto, era um jogo de palavras com o sucesso de Dalva Errei, sim e o sucesso de Carnaval de Herivelto Que rei sou seu?. Vicente Paiva, seu amigo e maestro preferido, compôs especialmente para ela cantar no show Olhos verdes. Outra música que fazia a plateia vir abaixo era Ave Maria, de Vicente com Jaime Redondo

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Agora solteira, era cortejada por muitos homens. Um deles foi Djalma Ferreira, organista da noite do Rio, nos anos 50. Outro, o apaixonado ator Procópio Ferreira, enche seu camarim de flores, compra um piano para a nova casa da cantora e a presenteia com um carro Austin zero quilômetro. Para os meninos faz muitas surpresas, como relógios e bicicletas. Mas Dalva não correspondia a esse amor.

Dalva conheceu o segundo marido quando ele veio ao Brasil se apresentar ao lado de Gôgo Andrews, com quem formava uma dupla de comediantes. Além de comediante, Tito Clemente era músico, excelente dançarino e coreógrafo (era conhecido como o Fred Astaire Argentino) e diretor de programas na TV. Tito era um homem refinado, com educação europeia, de família também de artistas. Seu pai era um conhecido tenor espanhol e a mãe, francesa, era atriz. Casaram-se em Paris, na Igreja de Montmartre, aproveitando uma excursão de Dalva pela Europa. Foram morar em Buenos Aires e Dalva voltaria ao Brasil para cumprir temporadas. Adotaram uma menina, em 1954, Dalva Lúcia, a Gigi. Dalva gravou o samba-canção Intriga, parceria de Tito com Sinval Silva. Mas eles vinham de mundos muito diferentes e os conflitos se sucediam. Dalva já se entregava à bebida. Separaram-se em 1963, ano em que retornou ao Brasil. Ficou transtornada quando a filha escolheu morar com o pai na Argentina. Tito cortou todos os vínculos com Dalva. Ela se sentia derrotada. Tito fez como Herivelto: inventou mentiras sobre Dalva e usou os jornais para fazer intrigas. Nesse período de grande sofrimento, o conhaque se tornou um companheiro frequente.

Foi eleita Rainha do Rádio para o período 1951 – 1952, chegando ao auge do sucesso. Ao ser coroada Rainha do Rádio, recebendo a faixa de Marlene, ganhou como prêmio um pouco de dinheiro e um automóvel pequeno e feinho, que a fábrica queria tornar conhecido por aqui. Foi o primeiro Volkswagen Sedan que chegou ao Brasil. Em seguida, Dalva recebeu o convite para ir à Inglaterra gravar um disco e fazer algumas apresentações na Europa, coisa rara na época. Conheceu grandes artistas nessa temporada e foi ouvida, entre outros, por Errol Flynn, Deborah Kerr e Katherine Hepburn. Apresentou-se para a Rainha Elizabeth, no Hotel Savoy.

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Em 1952, fez uma série de 17 gravações nos estúdios da EMI-Parlophone, em Londres, acompanhada pela Orquestra do maestro e pianista Roberto Inglêz. Foram doze músicas em português, sendo oito inéditas, e cinco em espanhol. No disco que impulsionaria definitivamente sua carreira solo, já no formato LP, estavam Fim de comédia, Que será e Kalu, canções que se tornaram verdadeiros hinos na música brasileira. 

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Em 3 de novembro do mesmo ano, o auditório da Rádio Tupi do Rio lotou para receber a volta da cantora Dalva de Oliveira para o Brasil. Era a mais recente contratação da emissora. No programa, Paulo Raimundo e Oswaldo Luiz atuavam como mestres de cerimônia e tentavam controlar os fãs para que Dalva pudesse cantar.

Recebeu o convite para recepcionar um famoso cantor norte-americano que viria ao Brasil gravar um disco. Como campeã de vendas da gravadora Odeon, sua presença era indispensável. O coração de Dalva disparou quando soube que o nome do artista era Nat King Cole! Nat começava a gravar uma série dedicada ao mundo latino, cantando em espanhol. Aqui, ele cantou em português, ao lado do Trio Irakitan e de Sylvinha Telles.

Em 1955, começando a preparar um novo disco, os produtores Aloysio de Oliveira e Milton Miranda sugeriram um músico e arranjador totalmente desconhecido. Disseram que seria bom se ela pudesse dar essa chance a alguém novo com talento. Ela concordou, e um dos primeiros arranjos para disco desse novato surgiu aí. Era Antônio Carlos Jobim. A música, Saia do caminho, de Custódio Mesquita.

Em 1957, A Odeon do Brasil criou, junto a Odeon Argentina, uma parceria que iria estourar novamente o mercado: os tangos. Investindo em tudo o que pudesse fazer com que Dalva vendesse mais discos, excursionou com frequência a Argentina, Uruguai e Chile.

Depois da sofrida separação de Tito, Manuel Nuno Carpinteiro, modesto rapaz muito mais moço que ela, entrara na vida de Dalva como secretário e motorista e, nessa situação, se sentia frágil e inseguro de seu papel na relação. A diferença de idade entre os dois não impediu que o amor crescesse, e Nuno foi o seu terceiro e último marido. Nuno estava ao volante no grave acidente que sofreu, na noite de 19 de agosto de 1965, quando o Oldsmobile de Dalva se desgovernou no Túnel Novo de Copacabana, subiu na calçada e matou quatro pessoas. Ensanguentada e inconsciente, deu entrada no Hospital Miguel Couto. Uma pessoa esperava sozinha, antes que qualquer parente ou amigo chegasse. Ansioso, chorava e pedia notícias aos médicos que transitavam pelos corredores. Era Mané Garrincha. Depois de alguns dias em coma e com uma cicatriz que desfigurou seu rosto, a cantora foi obrigada a abandonar a carreira por um tempo. Flávio Cavalcanti foi o comunicador que ofereceu à Dalva a chance de retornar ao palco, não se importando com qualquer marca que o acidente tivesse deixado em seu rosto. Outro amigo foi Chacrinha que a queria em seus programas.

Depois do acidente, Dalva ficou com muitas dívidas pelas despesas que teve  com hospitais e com o processo das vítimas. O marido foi condenado e preso. Enfrentando a imprensa corajosamente, Dalva costumava visitá-lo na prisão. Sem fazer shows, entrou em profunda tristeza. Pediu socorro à gravadora Odeon e ouviu que para receber algum dinheiro emprestado, mesmo em forma de adiantamento, ela teria de assinar um documento abrindo mão de alguns discos. As músicas seriam escolhidas por eles. Com a autoestima em baixa, ela cedeu e, assim, parte do que gravou (e escolheram seus principais sucessos) hoje pertence à Odeon, companhia que ela ajudou a crescer e enriquecer.

Em 1967, lançou o LP  A cantora do Brasil que marcou seu retorno ao disco após o afastamento provocado pelo acidente. Nesse disco, gravou a marcha Máscara negra, de Pereira Matos e Zé Kéti, um dos maiores sucessos de sua carreira e que foi uma das mais executadas no carnaval daquele ano, tendo conquistado o 1º lugar no concurso de músicas para o carnaval criado naquele ano pelo MIS – Museu da Imagem e do Som do Rio. 1970 foi o ano que marcou a recuperação de seu prestígio. Na TV Tupi ganhou o terceiro lugar em um concurso de Carnaval, com Bandeira branca, e lançou aquele que acabaria sendo seu último LP e cuja música título, de autoria de Laércio Alves e Max Nunes, constituiu-se em enorme sucesso, a mesma Bandeira branca, um marco em sua carreira. Em 14 de abril, prestou histórico depoimento para o Museu da Imagem e do Som.

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Dividiu o palco com o Pery em alguns shows no Rio, São Paulo e Salvador. Um silêncio de quase vinte anos entre o ex casal foi rompido com a gravação de Fracassamos, música que Herivelto fez questão de dar para Dalva, produção do filho Bily.

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Em 1971, venceu outra vez na TV Tupi, dessa vez com a música A lágrima, além do prêmio de melhor intérprete. Em 1972, Sílvio Santos a convidou para participar de seu concurso de Carnaval, quando ganhou o primeiro lugar, com Rancho da esperança.

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Diagnosticada com cirrose hepática, ela tinha de ser internada para os médicos fazerem punção em sua barriga. A bebida foi tendo um papel fortíssimo em sua vida, a razão maior de sua destruição. Com o  agravamento do seu estado ela foi internada na Casa de Saúde Arnaldo de Morais, de onde não mais conseguiu sair. Nos meses em que Dalva esteve internada, antes de morrer, o que mais ela desejou foi que Herivelto a visitasse. Nunca foi. Segundo o filho Pery Ele perdeu a grande chance de se redimir de todo o acontecido não fazendo esse gesto da visita à minha mãe no leito de morte. Tentei dizer isso, mas ele não me entendeu.

Dalva faleceu em 30 de agosto de 1972, vítima de hemorragia no esôfago, devido a complicações do câncer, aos 55 anos de idade. Foi uma comoção nacional. O Rio parou. Depois de mais de 17 horas de vigília em torno do corpo, exposto no hall do Teatro João Caetano, o povo carioca dava uma grande demonstração de seu amor pela cantora. Às 14h40min, o corpo de Dalva de Oliveira era trazido para fora do teatro, onde seria colocado numa viatura da Polícia Militar. Trinta mil pessoas acotoveladas na Praça Tiradentes não escondiam a emoção. Depois, o corpo de Dalva de Oliveira percorreria a cidade, a caminho do cemitério Jardim da Saudade, no subúrbio. O cortejo atravessou mais de uma dezena de bairros da Zona Norte – onde se concentrava o grande público de Dalva.

Dalva realizou mais de 400 gravações e sua voz está em vários coros de discos de Carmen Miranda, Orlando Silva, Francisco Alves, Mário Reis entre outros. Ela era endeusada pelos gays e considerada A Rainha das Bichas. Chegou a receber oficialmente esse título e guardava com orgulho uma faixa com essa frase em seu quarto de lembranças, na sua casa em Jacarepaguá.

Em 1974 foi homenageada pela escola de samba Acadêmicos de Santa Cruz, com o enredo O Rouxinol da Canção Brasileira.

[video:https://www.youtube.com/watch?v=-Wis4hEuxNM

Em 1976 a Escola de Samba Turunas do Riachuelo (4º escola de samba do Brasil – Juiz de Fora – Minas Gerais) foi tricampeã do carnaval da cidade com o enredo Estrela Dalva.  Em 1987 a Escola de Samba Imperatriz Leopoldinense levou para a Sapucaí o enredo Estrela Dalva, sendo último trabalho do carnavalesco Arlindo Rodrigues.

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Marília Pêra interpretou a cantora no musical A Estrela Dalva em 1987 no Teatro João Caetano. Em 1997, Roberto Menescal produziu o álbum Tributo à Dalva de Oliveira, reunindo vários artistas, como Elba Ramalho, Sidney Magal, Joanna, Cauby Peixoto, Lucho Gatica e Eduardo Dusek. Ainda em 1997, a EMI lançou o álbum A Rainha da Voz, com quatro CDs, contendo suas gravações mais expressivas, num total de 80 músicas.

Em sua cidade natal, Rio Claro-SP, existe uma praça em sua homenagem com nome de Dalva de Oliveira, inaugurada em 15 de julho de 2000. No local existe um busto em bronze da cantora.

Em 2012, foi lançado, dentro da série Super Divas, projeto do pesquisador Rodrigo Faour, um CD com gravações suas registradas entre os anos 1940 e 1970, quase todas inéditas em CD.

Em 5 de maio de 2017, comemora-se o Centenário da artista.

Fontes:

RIBEIRO, Pery; DUARTE, Ana. Minhas duas estrelas: Uma vida com meus pais Herivelto Martins e Dalva de Oliveira. Rio de Janeiro, Ed. Globo, 2009. 

Dalva de Oliveira no Dicionário Cravo Albin 

Dalva de Oliveira, blog por Paulo Henrique de Lima 

Dalva de Oliveira no IMDB 

Dalva de Oliveira: 100 anos da intérprete da alma passional brasileira

Dalva – Lágrimas na voz, por Joaquim Ferreira dos Santos 

A estrela  Dalva de Oliveira, por Jeocaz Lee-Meddi  

Estrela Dalva ainda brilha, mitológica, 100 anos após ter visto a luz da vida, por Mauro Ferreira 

Dalva de Oliveira e Herivelto Martins – A Colisão dos Astros – Parte I, Parte II Parte Final , por Djacir Dantas 

O Rouxinol brasileiro: um ensaio da obra de Dalva de Oliveira, por Gilmar Luís Silva Júnior  

A nova rainha do rádio 

Briga de marido e mulher: Dalva e Herivelto cantam e o público ‘mete a colher’ – o rádio como ‘palco’ de performances sociais, de Adriana Cunha, Mariane Fonseca e Cláudio Carmo

Boa cantora, péssima esposa   

Dalva e Herivelto por eles e elas, por Biancamaria Binazzi 

As canções da briga Dalva e Herivelto, por Patricia Palumbo 

Neto de Dalva documenta em filme o reinado da cantora da era do rádio, por Mauro Ferreira 

Bethânia dá depoimento para filme sobre Dalva, uma cantora que cultua, por Mauro Ferreira 

Redação

6 Comentários

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  1. PerRebe

    Duas musicas de Dalva de Oliveira que marcaram a minha infância.

    Fizeram muito sucesso no carnaval. Lembro dos bailes de carnaval que ficávamos dando voltas no salão.

    Máscara Negra de Zé Keti

    Quanto riso 

    Oh ! quanta alegria

    Mas de mil palhaços no Salão

    Alerquim está chorando pelo amor da Colombina

    Nomeio da multidão …

     

    A outra Bandeira Branca

    Bandeira branca, era quase um lamento, um pedido de socorro da artista. Um pedido de paz, que ela não aguentava mais.

    E ainda implorava ao seu grande amor ” Saudade mal de amor, saudade dor que dói demais, vem meu amor, bandeira branca eu peço paz”.  Mesmo assim, o sacana do Herivelto não atendeu o pedido de clemência da mulher

    Bandeira Branca, Amor

    Não Posso MaisPela SaudadeQue Me InvadeEu Peço Paz (Bis) Saudade Mal De Amor, De AmorSaudade Dor Que Dói DemaisVem Meu AmorBandeira BrancaEu Peço Paz

    //////////////////////

    O filho do casal, Pery Ribeiro, morreu em 2012 aos 74 anos, de infarto. Depois de ficar internado por 30 dias num Hospital Público Estadual, aqui no RJ. Hospital Pedro Ernesto, em Vila Isabel. 

    Que hoje está falido e quebrado.

     

  2. Eterna Dalva

    Eterna rainha do radio e o rouxinol do Brasil, como diz tio João, eterno apaixonado pela voz de Dalva de Oliveira. Eh bom lembrar que nos mulheres desde ha séculos lutamos para ser livres das amarras sociais e do machismo.

  3. Dalva de Oliveira

    Que beleza de resumo! Fiquei sabendo de  muita coisa que ignorava e olha que a rigor há uns 67 anos tenho a música e a voz de Dalva em minha vida. Minha primeira infância foi muito marcada por “Kalu” e “Ave Maria”,principalmente, sucessos que tocavam o dia inteiro no rádio (e olha que religioso eu nunca fui muito…)

    É porque vivemos neste pobre e desgraçado (e riquíssimo e cobiçadíssimo) país  que alguém como Dalva de Oliveira não é reverenciada constantemente como o são Edith Piaf,na França, e Carlos Gardel, na Argentina (por exemplo). Aliás, lembro-me de uma conversa com amigos, eu já homem madurão, e chegamos a uma conclusão, que tem forte possibilidade de se constituir na mais absoluta verdade, de que Dalva de Oliveira é legitimamente a nossa Edith Piaf.Mesmíssima grandeza. Um caso rigorosamente inconcebível que pudesse ser duplicado, ou replicado, em algum outro lugar fora da França. E no entanto, se examinarmos bem, há um forte paralelismo nas carreiras, nos infortúnios e no timbre de voz destas duas Estrelas/Étoiles.Com aquela descomunal originalidade de vozes, você só tem duas opções : ou amar desesperadamente Dalva/Edith ou odiá-las intensamente (e até hoje nunca ouvi falar de ninguém que as odiasse).

    Uma divindade, Dalva de Oliveira. “Ave Maria” é uma das maiores maravilhas que já ouvi, a começar pelo arranjo, que se não me engano é de Osvaldo Borba.”Kalu”, “Fim de Comédia”, o incrível “Calúnia” e a grande surpresa que tive quando, já adulto, e imaginando que já conhecia tudo de importante de Dalva, fiquei perplexo com a maravilha de interpretação (e arranjo) de “Olhos Verdes”, aí por volta de 1980 (Dona Gal, me desculpe, a senhora canta direitinho a canção, mas pelo amor de Deus, não chega aos pés…)

    Cheguei a vê-la por diversas vezes na velha TV Tupi, canal 6, do Rio de Janeiro em seus anos heróicos, quando a pioneira das tevês cariocas estava instalada nas dependências do antigo Cassino da Urca (Rua João Luis Alves 14, se não me engano, e agora fico sabendo que Dalva chegou a morar ali por perto).

    Só três observações finais, despretensiosas, que não acrescentam quase nada a este relato magnífico.

    1.Lila, irmã de Dalva, chegou a tentar carreira de cantora, e isso já no começo dos anos 60, tendo sido lançado um chamado Compacto Simples (um dos primeiros fabricados no Brasil, de 7 polegadas,33 rotações, com uma música de cada lado) em 1961, ainda em selo Columbia, que depois se transformaria em CBS.

    2.Ubiratã, irmão de Pery, era conhecido como câmera da TV Tupi no final dos anos 50 e possivelmente por grande parte dos anos seguintes.

    3. Uma espantosa omissão para a maravilha que é o “Rancho da Praça Onze”, de João Roberto Kelly e Chico Anísio, que foi um enorme sucesso por volta do Carnaval de 1965 e durante todo o resto do ano, no embalo do musical de televisão de grande audiência que foi “Praça Onze” (só não me lembro se na TV-Rio ou na TV-Excelsior).

    Muito obrigado, dona Mara pela maneira altamente informativa com que a senhora conduziu este informe.

    Conduz a Vós, Estrela Dalva, orai por nós.

     

     

     

     

     

     

  4. Estrela maravilhosa! Louve-se o trabalho magestoso de Adriana Esteves na mini série da Globo “Dalva e Herivelto”, interpetrando a Rainha da Voz, Dalva de Oliveira!

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