Wilson Ferreira
Wilson Roberto Vieira Ferreira - Mestre em Comunição Contemporânea (Análises em Imagem e Som) pela Universidade Anhembi Morumbi.Doutorando em Meios e Processos Audiovisuais na ECA/USP. Jornalista e professor na Universidade Anhembi Morumbi nas áreas de Estudos da Semiótica e Comunicação Visual. Pesquisador e escritor, autor de verbetes no "Dicionário de Comunicação" pela editora Paulus, e dos livros "O Caos Semiótico" e "Cinegnose" pela Editora Livrus.
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“Guerra Total” na crise política com os filmes “Polícia Federal” e “Real”, por Wilson Ferreira

por Wilson Ferreira

Espera-se para esse ano o lançamento de dois filmes nacionais que aproveitam a atmosfera da atual crise política. O thriller judiciário “Polícia Federal: A Lei é Para Todos” e um “thriller econômico” – “Real: O Plano por Trás da História”, sobre o Plano Real e a derrota da hiperinflação. “Esculhambação da Polícia Federal e do Judiciário” (pelo fato da PF ter cedido equipamentos, gravações de vídeos e informações sigilosas para uma produção privada sobre uma investigação ainda em andamento) e “propaganda tucana” foram algumas reações das esquerdas. Qual é a surpresa? Como em toda a História, os conquistadores chegam ao poder determinados a exterminar os vencidos. Desde o nazi-fascismo esse extermínio tornou-se simbólico por meio da “Guerra Total”: a conquista de corações e mentes através do cinema e audiovisual. Assim como o Governo dos EUA fornece armas, aviões e soldados reais para as produções patrióticas hollywoodianas, a PF transforma sua sede de Curitiba em “laboratório de interpretação” para os atores. Dentro do espectro político, quanto mais nos dirigimos à direita vemos uma aplicação mais eficiente das armas da comunicação. Como demonstrou Donald Trump na semana passada em suas incursões pela Internet e redes sociais nas madrugadas.

Desde as grandes manifestações de 2013-14, os movimentos que resultaram no impeachment e a posse do desinterino Michel Temer funcionaram com a precisão de um relógio suíço ou como fosse uma tacada certeira num jogo de sinuca – uma bolinha bate na outra até todas caírem nas caçapas.

Começou com ondas de choque na opinião pública por meio de bombas semióticas detonadas pela grande mídia (sobre o conceito de bombas semióticas clique aqui), a crise econômica autorrealizável, o impeachment de Dilma, o “tic-tac” preciso das decisões do STF, a desconstrução do sistema partidário pela Operação Lava Jato deixando o poder vago para ser ocupado pela Polícia Federal, as reformas trabalhistas e previdenciárias a fórceps e o desmonte dos setores estratégicos do País como a engenharia, petróleo e energia nuclear. 

Esse grande arco golpista político-jurídico-midiático não está para brincadeira, cuja ação se assemelha a uma blitzkrieg planejada aqui e fora do País com tempos de antecedência – sobre isso clique aqui

Tanto é verdade que o próximo passo é o da própria legitimação através da narrativa ficcional cinematográfica. Tática com um claro ardil: toda narrativa ficcional é caracterizada pela suspensão da descrença, tornando irrelevante para roteiristas e espectadores saber se a história contada é real ou não. 

O que torna o filme uma perfeita peça de propaganda pela possibilidade de esconder por trás da ficção intenções políticas ou mercadológicas.

Cinema e percepção pública

É esperado para junho e julho desse ano duas produções nacionais, claramente ferramentas muito mais do que de engenharia de opinião pública, mas de percepção pública – reforçar predisposições anteriormente criadas pelas sucessivas ondas de choque no contínuo midiático dos últimos anos.

A  primeira produção é sobre investigações ainda em andamento pela Polícia e Justiça Federal no âmbito da Operação Lava Jato: Polícia Federal: a Lei é para Todos do diretor Marcelo Antunez; e a segunda, chamada Real: O Plano por trás da História, filme com o propósito de inventar, por assim dizer, uma “cosmogênese” – o marco inicial da história brasileira recente a partir da derrota da hiperinflação pelo Plano Real nos anos 1990, perpetrado pelos economistas da mesma banca financeira que atualmente é a eminência parda do golpe político.

“Real: O Plano por Trás da História”: super-heróis da banca financeira

E ainda é esperado para o ano que vem uma série Netflix sobre a Operação Lava Jato cujo diretor brasileiro José Padilha (Tropa de Elite e o seriado Narcos) já antecipa em entrevistas seu posicionamento: “Temer e Dilma foram eleitos com dinheiro de caixa dois e de corrupção, aportado na sua campanha por uma quadrilha que achacou o estado. Desde sempre estiveram ilegais na Presidência da República. Todos nós sabemos disso”. 

Pelo menos Padilha é sincero e não simula isenção e apartidarismo como os diretores das produções que serão lançadas nesse ano.

“Esculhambação”

As esquerdas vêm denunciando as circunstâncias das produções desses filmes como uma grave amostra da “esculhambação” em que se tornou a Polícia Federal e o Judiciário: como pode ser lançado um filme sobre investigações ainda em andamento no qual certamente a narrativa tomará partido? Como a Polícia Federal cede imagens gravadas sobre a condução coercitiva de Lula para a produção do filme Polícia Federal? E mais: como o juiz Sérgio Moro permite o livre acesso de atores e produtores aos cárceres de Curitiba e ainda entregando dados sigilosos do inquérito de Lula? 

Segundo o ator Ary Fontoura (que interpretará Lula), tudo aconteceu “para que pudesse trabalhar melhor o personagem”. Atores fazendo “laboratório de interpretação” nas carceragens e tendo acesso a processos supostamente sigilosos? Confraternizações entre produtores e atores com delegados da Polícia Federal e procuradores?

Ary Fontoura: fazendo “laboratório” na PF

Qual a surpresa?!?! Esse é mais um movimento calculado de uma estratégia sistemática que, parece, só o PT e os governos lulopetistas foram pegos de surpresa, resultado de anos de displicência em relação às políticas de comunicação social.

Se, como falam, o juiz Sérgio Moro é o “homem das camisas pretas”, numa referência às camisas pretas dos fascistas italianos e à inspiração de Moro na Operação Mãos Limpas italiana, deveriam saber que esse passo cinematográfico do golpe em andamento é uma histórica e conhecida tática de propaganda iniciada com o nazi-fascismo na Segunda Guerra Mundial. 

O consórcio formado pela mídia, judiciário, política e banca financeira (para ficar apenas dentro do Brasil) chegou ao Estado. E agora, procurará se legitimar por meio de uma narrativa audiovisual que o coloque em alguma lugar na História.

O gênio do nazi-fascismo no cinema

No passado os povos conquistadores sempre dominavam os vencidos seja através puro extermínio, pela “limpeza étnica” (estupros ou rapto de mulheres), pela escravização ou o domínio das almas através da sistemática destruição de todo traço cultural ou histórico – monumentos, arte, roubo de fortunas ou a apropriação de simbolismos religiosos ou pagãos.

O gênio do nazi-fascismo foi substituir tudo isso pela conquista de corações e mentes não só por meio das armas, mas também pelo cinema – a essência da noção de blitzkrieg ou “guerra total”. A guerra não é só travada no campo de batalha mas principalmente no campo do imaginário e da estetização da política.

Hitler e Mussolini: obcecados pelo cinema

Tanto Hitler como Mussolini eram obcecados por cinema. Depois de nazistas e fascistas promoverem e financiarem ativamente filmes americanos que promoviam valores arianos e fascistas como Capitain Courageous (1937) ou The Eternal City (1922, no qual o próprio Mussolini tinha participação) lançado no mesmo ano da Grande Marcha dos fascistas (com camisas pretas) sobre Roma, tanto Alemanha como Itália investiram nas  produções próprias.

Benito Mussolini inaugurando a versão hollywoodiana italiana, a Cinecittà – Mussolini afirmou na inauguração e lançamento do filme Camicia Nera (Camisa Negra) que “o cinema é a arma mais forte do regime fascista”; e Hitler estimulando financeiramente a produtora UFA (Universum Film Aktien Gesellschaft), com produção de filmes com temas nacionalistas, exaltação ao herói ariano, militarismo e anticomunismo.  

Como mostrou o filme Bastardos Inglórios (2009) de Tarantino, após cada invasão relâmpago nazista em países como a França, junto com os oficiais seguiam rolos de filmes alemães para serem assistidos compulsoriamente pelos vencidos. 

Da Cinecittà a Hollywood

A mundialização das produções hollywoodianas no pós-guerra foi a continuidade da estratégia nazifascista. Apenas que agora não temos mais oficiais levam rolos de filme para o front, mas empresas distribuidoras – apesar de ações no campo de batalha como ocorreu na cidade de Cabul ao ser invadida pelas tropas norte-americanas na guerra do Afeganistão pós-9/11: carros com autofalantes circulavam na cidade tocando músicas de FMs dos EUA.

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Wilson Ferreira

Wilson Roberto Vieira Ferreira - Mestre em Comunição Contemporânea (Análises em Imagem e Som) pela Universidade Anhembi Morumbi.Doutorando em Meios e Processos Audiovisuais na ECA/USP. Jornalista e professor na Universidade Anhembi Morumbi nas áreas de Estudos da Semiótica e Comunicação Visual. Pesquisador e escritor, autor de verbetes no "Dicionário de Comunicação" pela editora Paulus, e dos livros "O Caos Semiótico" e "Cinegnose" pela Editora Livrus.

11 Comentários

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  1. A Lei é para todos os pretos, pobres, putas e petistas

    As benesses da lei não é para todos, só para os da Casa Grande, para os de sangue azul.

    Se a lei é para todos, porque o Aécio, tendo praticado tantos crimes, está livre, leve e solto?

    Digam ratos?

    Hoje eu tirei para desrespeitar os ratos. Perdoeem-me, Hermanitos Ratos.

  2. Esse tipo de análise deve chegar aos partidos e mov. sociais

    As análise precisas de Wilson Ferreira precisam ser difundidas e discutidas, sobretudo pelos líderes políticos da Esquerda e dos movimentos sociais.

    O cinema e o audio-visual foram e são as armas mais eficientes da conquista e dominação cultural. Não é outra a razão da América Latina inteira ser colonizada culturalmente pelos EUA. Hitler Mussollini foram não apenas tolerados, mas apoiados e incentivados pelos EUA e pela Inglaterra; o fascismo  italiano e o nazismo alemão JAMAIS tomariam as propoções que tomaram sem o apoio dos ingleses e estadunidenses. O leitor deve se lembrar que o inimigo comum de todos eles era o comunismo e a URSS.

    Portanto, a Itália fascista e a Alemanha nazista (o caso do Japão é um pouco diferente) mais do que criadoras ou surgidas de ‘geração espontânea’ são criaturas. Apenas quando as criaturas ganharam força excessiva e ameaçaram parte do poder dos criadores (Inglaterra e EEUU), estes últimos se voltaram contra ela. Tanto Hitler como Mussolinni eram péssimos estrategistas. Notem os leitores que as ocupações, invasões e anexações de territórios e países pela Alemanha nazista (Áustria, França, Polônia, etc.) praticamente não enfrentaram resistência. Quem ofereceu resistência foi a URSS; Hitler ludibriou Stálin com o “Pacto de nãoagressão”  não porque fosse bom estrategista, mas porque o russo tinha inteligência e percepção ainda mais limitadas que o ditador austro-alemão.

    Não é mero acaso que os verdadeiros chefes e artífices do golpe de Estado em curso no Brasil sejam os mesmos EEUU e usem as mesmas técnicas, táticas e estratégias que se mostraram eficazes desde o inínio do século XX.

    A esquerda Brasileira precisa abandonar a ingenuidade e o republicanismo poliana. Análies como esta devem ser enviadas a parlamentares dos partidos de Esquerda, assim como a todas as lideranças de movimentos sociais.

    A arama da comunicação áudio-visual deve ser usada també por aqueles que sempre foram vítimas dela.

  3. Não há contraponto

    Bem , causa revolta. Afinal , fica a questão : mostrar meias verdades equivale a contar mentiras?

    Também fica  a questão da liberdade de expressão  : a expressão de uma versão dos fatos deve ser livre. 

    Mas o que me chateia mesmo é ver que os golpistas têm recursos para promover a sua “VERDADE”. 

    Enquanto entre a parcela mais crítica não se vê iniciativas para produzir um documentário amplo , mostrando todo o mecanismo e articulação dos eventos políticos recentes  no Brasil : o real papel do PT na corrupção , a antiga articulação de TEMER-CUNHA desde os tempos de FHC , o fator GILMAR MENDES , MORO e os americanos , a atuação do MP , a oligarquia da mídia e seus asseclas , os empresários , a destruição econômica e social pós golpe , a preservação dos velhos caciques . 

    Na verdade tudo isso já existe na blogosfera , mas de forma difusa. Necessário alguém reunir , dar forma e ampla divulgação a todo esse contexto . Essa é a melhor resposta a essas produções que têm por objetivo único consolidar a opinião pública a favor dos golpistas.

  4. Os brasileiros gostam de

    Os brasileiros gostam de filmes norte-americanos estilosos, tipo Ghost in the Shell que estreou recentemente.

    Ninguém vai tomar conhecimento destas merdas cheias de palavões “made in Rede Goebbels”.

    O problema dos nóias da direita brasileira é que eles não conseguem sair de suas concha.

    Eles pensam que são a elite. Mas o máximo que conseguem é ser vira-latas de um império moribundo. 

    1. Filmes

      Também acho que esses filmes terão pouca efatividade junto aos brasileiros, basta ver que a gigantesca campanha da mídia engajada na destruição de Lula não impede que aos poucos, mas com firmeza, o ex-presidente recupere seus índices históricos de popularidade, numa visível prova de que a população vai percebendo a farsa eleitoreira da perseguição a Lula. Acho que o cinema é um poderoso meio de comunicação e propaganda, matéria negligenciadas pelos governos de Lula e Dilma, mas existem inúmeros exemplos de grandiosos projetos cinematográficos que fracassaram.  A enorme rejeição ao golpe e suas políticas contra os interesses do povo brasileiro, suponho eu, não darão muita guarida a um filme que, hoje, estaria claramente vinculado aos objetivos de divulgação e sustentação do movimento golpista que está em franca oposição ao rumo para que sinaliza a opinião pública. Esse filme poderá ser  um gigantesco tiro no pé.

      1. Pois então… a única coisa

        Pois então… a única coisa relevante sobre este filme é a promoção do Professor Aristóbulo Camargo. 

        Ele era um pedante e insuportável professor interiorano e se tornou um líder carismático e mundialmente reconhecido.

  5. Wilson Robeto Vieira Ferreira

    Wilson Robeto Vieira Ferreira é um dos melhores analistas da atualidade. Mesmo porque os meios de comunicação estão no centro do poder mundial, como atesta a matéria. Denomino a rede globo de máquina de propaganda Nazi-Globista, porque ela sintetiza o que Wilson descreve no texto. Se um dia a esquerda voltar ao poder, e talvez leve muito tempo, não bastará fazer um bom ou ótimo governo, distribuindo a riqueza de forma mais justa, terá obrigatóriamente, que deter ao menos 50% da audiência na grande imprensa, na TV e no Cinema.  

  6. Perfeito, Wilson. O petismo

    Perfeito, Wilson. O petismo desprezou a comunicação, em sua concepção mais abrangente. Ausente nas redes sociais, displicente com uma TV pública, desdém pelos blogs ( a não ser nas eleições) e insuficiente no audio-visual. Só os Barreto, por inciativa própria, fizeram um filme a favor, o boicotado “Lula, filho do Brasil”.

    Lula tentou vender a “marca Brasil”, com Gilberto Gil no ministério. Esse foi o melhor momento do governo do PT. O Brasil “virou moda” e parecia despontar com uma nova potência economica, política e cultural no mundo. Ficou por aí. Logo o próprio Lula acabou contaminado pela acomodação que acometeu o partido.

    PS: Os blogueiros diziam dia sim e dia também que o PT e o governo precisava investir na comunicação. Possivelmente eram considerados chatos pelo burocratas do partido e do Planalto

  7. Creio que estes filmes serão

    Creio que estes filmes serão um sucesso retumbante na classe média.

    Veremos uma overdose de propaganda dos filmes em questão, os cartazes nos Shopping Centers serão imensos e os ingressos terão preços módicos (se não for entrada livre). 

    Coxinhas irão encarar o ato de “prestigiar” o filme da Lava-Jato como um muçulmano encara uma visita à Meca: um dever!

    Já em relação ao filme sobre o plano Real, creio que a classe média levará seus pimpolhos para aprenderem porque FHC é um Deus, o filme estará para a Classe Media assim como está o filme “A paixão de Cristo” para boa parte dos cristãos.

    Entretanto, o povão, a ralé, ignorará solenemente esses dois planfletos.

    Me pergunto se os atores que participam desta patranha, ops, filmes, ficarão estigmatizados no futuro.

    1. Eu acho que deveriam pensar

      Eu acho que deveriam pensar nisso a maioria deles…

      Se bem que por Ex: Flávia Alessandra, até a maré virar, a Beleza terá ido embora e ja não vai fazer nada !!

      Ary Fontoura a morte lhe virá antes da virada. Ele vai morrer coberto de Glória…

      E se tudo der certo, o que eles vão perder por serem estigmatizados ??? Não vai ter Globo pra os boicotarem mesmo…

       

  8. É uma pena ver atores

    É uma pena ver atores talentosos interpretando economistas canastrões que chuparam um plano alemão dos 20 (Plano Schacht); arregaçaram as portas para o neoliberalismo tosco e selvagem que infesta nossa sociedade há mais de 20 anos, e de quebra destruíram nossa indústria com essa idéia de jerico de câmbio valorizado.

    Pintar estes safados como heróis não é só má fé, é um insulto à nossa inteligência

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