Mamelucos, os fundadores de São Paulo, por Luiz Ferri de Barros

Do Empório do Direito

Fundadores de São Paulo: Os Mamelucos

Por Luiz Ferri de Barros

Ao longo da costa brasileira, basta ver, em muita entrada de baia, boca de canal, barra de rio; nos cantos de ilhas, promontórios e onde até não saiba eu aqui dizer, seja em posições estratégicas para a defesa de cidades ou de passagens náuticas, encontram-se fortes coloniais ou ruínas deles.

São testemunhos das guerras travadas pelos colonizadores para assenhorear-se da terra. Mesmo antes de fixarem-se por aqui, o que se daria com a fundação de São Vicente, em 1532, e a criação das Capitanias Hereditárias, os lusos guerreavam a todo tempo, pelo exclusivo domínio das feitorias que se iam estabelecendo na costa e para garantir a lusitana bandeira flanando soberana aos ventos.

De orelhada, que é de orelhada o jeito de o brasileiro saber das coisas, todos sabem que o feroz português saiu-se mais forte nas escaramuças. Travou batalhas contra índios, espanhóis, franceses, ingleses e holandeses – e a todos venceu.

E tem mais: se mais povos houvera, igual os venceria, pois assim disse Camões nos Lusíadas sobre a hercúlea determinação deste astuto e beligerante povo conquistador: “… e se mais mundo houvera lá chegara.”

Mas desde os primórdios criaram os brasileiros a mística do parto sem dor; da grande conquista colonial sem guerra que teria gerado um povo pacífico, esta brava gente brasileira cantada em verso e prosa.

Nos primórdios o português ancestral foi feito cativo da exuberante sensualidade tropical que emanava das índias, quando mais das princesas nuas que, sendo filhas de caciques amigos, lhes ofereciam os morubixabas para selar amizades e alianças.

Que mulheres lindas, jovens, cheirosas e banhadas a cada dia o tempo todo, os seios à mostra por baixo das tintas, as partes apenas encobertas; mal pensava o português na mulher européia que deixara na Corte, escondida em rezas e temente ao padre e ao papa, embrulhada em vestidos de mil panos fedidos, que se banhava somente nos dias santos, quando se.

Bartira, dada por Tibiriçá a João Ramalho, em São Paulo, foi uma das princesas desta guerra, uma das mães da raça, que engendrou uma nação de mestiços, a nossa pátria. Mas nesta mestiçagem, de início, antes que se fundisse o mulato, o cafuzo e outros, todos os filhos de Bartira e das outras índias com João Ramalho e outros portugueses, todos esses foram mamelucos, da mesma forma que mamelucos foram os filhos dos índios com as portuguesas aqui vindas por degredadas, de que noutra ora tratarei.

Os mamelucos, estes conheciam as artes da guerra e os ofícios como seus pais portugueses, e conheciam a terra, os costumes e os caminhos, como suas mães índias e seus ancestrais avós. Bravos e indômitos guerreiros, aos mamelucos se deve o povoamento e a defesa da cidade de São Paulo, em longa e sangrenta batalha, tendo como aliados os tupiniquins no confronto contra os tupinambás.

Nóbrega e Anchieta não vieram fundar a cidade no planalto em 1554 para ficarem mais perto do céu, diga-se, senão para posicionar-se a cavaleiro no campo de batalha, largando São Vicente à própria sorte, eis que não viam como garantir no litoral a proteção da colônia e da igreja.

Tibiriçá e João Ramalho – que, deixando Santo André da Borda do Campo, onde morava, agregara-se com suas esposas e descendência aos paulistas – ajudaram na escolha de um sítio em Piratininga, uma cabeça de morro elevada, tendo por divisa de um lado o rio Tamanduateí e por outro o rio Anhangabaú.

Nesta croa, os padres fundaram o colégio, e para defendê-lo, e ao território em torno do qual cresceria a vila, os portugueses e seus filhos mamelucos ajudados por seus meio-irmãos índios, fincaram alta estiva de pontiagudas aroeiras e outras madeiras de lei cercando todo o topo do morro com uma inexpugnável paliçada, sendo assim o páteo do colégio, na verdade, uma formidável cidadela defendida por impiedosos guerreiros, esta brava gente brasileira.

Mamelucos também foram os bandeirantes que expandiram as fronteiras brasileiras para abarcar três vezes mais terras do que o papa consignara aos portugueses nas escaramuças diplomáticas com os espanhóis.

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No Museu Anchieta, no Páteo do Colégio, há uma grande maquete representando a São Paulo do século 16. Ao examiná-la pode-se entender melhor nossas origens.

Redação

5 Comentários

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  1. Num site de questionamento científico um pesquisador …

    Num site de questionamento científico um pesquisador norte-americano colocou uma pergunta em que coloquei uma resposta que ele não gostou.

    A pergunta era sobre os motivos do fracasso da invasão francesa no Rio de Janeiro.

    Respondi que os franceses vieram ao Brasil sem trazerem suas mulheres e não tinham já o “espírito de integração” dos portugueses que se manifestou tanto no Brasil como na África (os países de colonização portuguesa na África, são os únicos com grande quantidade de mulatos).

    Cada português naufrago ou degradado, quando deixado ao seu próprio destino nas costas brasileiras, se não fossem comidos pelos índios, rapidamente criavam numerosas famílias que chegavam a atingir a centena de filhos, ou seja, o carnaval brasileiro não tem suas origens no século XIX ou XX, era bem anterior a isto.

    1. Eles não vieram aqui para pular carnaval

      O que o carnaval brasileiro tem a ver com a necessidade de sobrevivência dos antigos colonos?

      Os franceses vieram ao Brasil sem trazer suas mulheres? E por acaso os portugueses trouxeram as deles? Qualquer colono que se estabelece em uma terra desconhecida e hostil sente logo a necessidade imperiosa de produzir descendentes o mais rápido e em maior número possível, pois sem eles não terá sequer como sustentar-se quando lhe faltar forças para o trabalho. E os colonos portugueses só dispunham das mulheres índias para coabitar. Além do que, era imprescendível estabelecer alianças com as tribos, e os casamentos serviam para este propósito. Se os franceses houvesse vencido a guerra, logo se veriam obrigados a fazer o mesmo com as mulheres índias das tribos aliadas. E o mesmo fizeram os marinheiros do Bounty com as mulheres tahitianas na ilha de Pitcairn – você conhece a história do Grande Motim?

      Não há nenhuma dificuldade de se entender o porquê dos costumes de nossos primeiros colonos. O problema é que a partir daí se criou uma lenda que é repetida até hoje, e tornou-se um imenso “wishful thinking”: o mito o país fundado na sensualidade tropical. Não existe pecado do lado de baixo do equador, diziam os europeus na época do descobrimento, o Brasil era um lugar onde os recém-chegados estariam desobrigados das regras morais e da respeitabilidade que eram obrigados a manter em seus países de origem. No fundo esse mito é um grande deboche, pois endossa um antigo preconceito nutrido pelos povos do norte contra os povos sulistas, vistos como preguiçosos e sensuais. De acordo com essa crença, os portugueses, sendo um povo do sul da Europa, eram dados à fudelança, ao contrário dos franceses nortistas que eram cheios de pudor. Então os portugas caíram de boca em cima das índias, que sendo um povo ainda mais sulista, eram ainda mais “quentes” no sentido sexual. E dessa suruba nasceu o brasileiro. É difícil entender porque tantos brasileiros não só acreditam nessa patacoada como ainda a propagam com orgulho, talvez seja a necessidade de agradar o estrangeiro ao satisfazer-lhe as fantasias…

  2. a importancia dos

    a importancia dos bandieranrtes na historia do brasil é notória,

    mas é preciso deixar claro o preço pago por isso….

    o perigo é o tupiniquim virar tupinikim!!!

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