“Mulher tem que gemer só nas horas boas”, diz Elza Soares

Jornal GGN – A cantora Elza Soares abriu os desfiles do Bloco Afro Ilú Obá De Min, nessa sexta-feira (5), em São Paulo e disse para grande público: “Mulher tem que gemer só nas horas boas, não pode gemer de dor, não”.

Elza foi a grande homenageada da noite. Em frente ao palco, cerca de 250 mulheres da bateria, vestidas de vermelho e branco, marcavam o ritmo de suas canções. “Viva nossa carne negra, que é maioria”, disse.

Do Blog Alalaô, na Folha de S. Paulo

‘Mulher tem que gemer só nas horas boas’, diz Elza Soares em abertura de bloco afro em São Paulo

Por Juliana Gragnani

Ao abrir o desfile de um bloco afro feminino na noite desta sexta (5), a cantora Elza Soares arrematou: “Mulher tem que gemer só nas horas boas, não pode gemer de dor, não”.Elza usava um turbante e um vestido vermelho com uma enorme fenda, uma legging preta rasgada, colares de conchas e glitter dourado no rosto em sua apresentação na praça da República, parte do desfile carnavalesco do tradicional bloco Ilú Obá de Min.

Esse nome significa “mãos femininas que tocam o tambor para o Rei Xangô” –e são mesmo mãos femininas que compõem a bateria do bloco e que vibraram ao som de Elza, apesar da forte chuva, que enfraqueceu o movimento, segundo ambulantes — eles apostavam mais na venda de capas de chuva de que de cervejas.

“É essencial cultivar a cultura afro”, disse a professora Conceição Cabrini, 62.  Michelle Farias de Lima, 31, uma bailarina que se dizia a “garota prateada”, coberta de glitter, contou estar no desfile porque estuda dança africana.

Na parte de frente da praça, em frente ao palco, cerca de 250 mulheres da bateria, vestidas de vermelho e branco, tocavam no ritmo das canções da homenageada. “Viva nossa carne negra, que é maioria”, disse Elza, entre canções do último disco “A Mulher do Fim do Mundo” (2015).

“Nosso objetivo é empoderar as mulheres pretas. Temos que discutir o feminismo negro. As protagonistas do movimento ainda são mulheres brancas da elite”, afirma Beth Beli, fundadora do bloco, que existe há 12 anos, e mestre de bateria.Às 21h, Elza desceu do palco –aplaudida e com ajuda de dois produtores para ficar de pé– e entrou em um carrinho de golfe decorado com vinis para acompanhar o cortejo. “É o Elza Black Power”, explica o artista plástico Valter Nu, motorista do veículo e autor das intervenções artísticas que o modificaram. Vestido de Ogum (“porque a Elza é filha dele”), disse estar nervoso, minutos antes de ela entrar, porque é “fanático” pela cantora.

O bloco, que também tem participação da atriz e cantora Letícia Sabatella, sairá da praça da República, passará pela av. São Luís, a Xavier de Toledo e a Praça das Artes. No camarim de produção do show, a preocupação entre os presentes era “se o zika passa mesmo por saliva”.

Na praça da República, foliões buscavam refúgio nas barracas vazias de vendedores da feira de artesanato que ocorre ali de dia. De longe, ouvia-se um grupo cantando “vai desabar água”.

À frente do desfile, Elza Soares é levada no carro de golfe, cercada por representações de orixás –homens e mulheres com pernas de pau usando roupas para representar divindades africanas como Exu, Xangô, Iansã e Oxóssi. Músicas do bloco são cantadas em Yorubá, dos terreiros de Candomblé, e outras manifestações das culturas africana e brasileira.

Pós-chuva e já na av. São Luís, onde as mulheres percussionistas ocupavam uma via inteira e foliões a outra, a celebração parou, para ouvir, em silêncio, seu canto: “Quando a cigarra cantou / clareou, clareou / Choveu, choveu / Cheiro de terra molhada / Água que veio do céu, abençoada”. A música, adequada para a ocasião, é composição de Elza Soares e Letícia Sabatella.

Em um clima pacífico, o bloco reuniu famílias, crianças, mães amamentando, foliões de turbantes e até um grupo vendendo “sanduíches sobrenaturais” (nada de drogas ilícitas, só “saladas incríveis”, segundo a vendedora). A chuva do início não espantou os carnavalescos.

“O bloco é fundamental só por ter mulheres tocando percussão”, diz o arquiteto Victor Delaqua, 27, vestido com uma capa prateada e luvas vermelhas (nenhum herói específico, observa). “Essa minoria, aqui, se torna uma forte maioria.”

O bloco foi deixando vestígios de foliões animados em diferentes regiões do centro. Na Xavier de Toledo, começou a pegação, com cenas de beijos triplos e torcida organizada para paqueras de amigos.

Aos PMs que seguiam o bloco, abrindo espaço para os carros nas ruas já desocupadas pelos foliões, alguns pediam o fim da polícia militar, ecoando os protestos do MPL que tomaram o centro há poucas semanas.

Redação

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