Andre Motta Araujo
Advogado, foi dirigente do Sindicato Nacional da Indústria Elétrica, presidente da Emplasa-Empresa de Planejamento Urbano do Estado de S. Paulo
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O golpe alemão em Roma, em 1943, por André Araújo

Por André Araújo

A Segunda Guerra tem muitos capítulos especiais, nela inseridos como se fossem um drama dentro do evento maior da própria guerra mundial. Um desses episódios mais complicados e que mistura ação militar com diplomacia e alta política, se deu na disputa sobre o controle da capital italiana em setembro de 1943.

Em Julho de 1943 dois grandes acontecimentos chocam a Itália, a invasão da Sicília pelos americanos e a queda de Mussolini, deposto pelo Grande Conselho Fascista, numa trama que envolveu por trás da cortina o próprio Rei Vitor Emanuelle III. Com a queda de Mussolini, os italianos garantem aos alemães que prosseguirão na guerra ao lado dos alemães, que não acreditaram. A deposição de Mussolini foi orquestrada pelo fascista histórico Conde Dino Grandi, o mais alto hierarca do Partido Fascista depois de Mussolini, que tinha prestígio para conduzir os votos no Grande Conselho, de cuja sessão Mussolini já saiu preso em uma ambulância. Dino Grandi depois da guerra fugiu para São Paulo, onde morou de 1945 a 1951, um dos personagens mais importantes da história italiana daquele período.

Assume como Primeiro Ministro no lugar de Mussolini o Marechal Pietro Badoglio, de total confiança do Rei, anti-fascista e anti-alemão. O Embaixador alemão em Roma, Marechal Mackensen, com mais de 80 anos, pergunta a Badoglio “Vôces vão sair da guerra?” ao que Badoglio responde, “Mackensen, nós somos os dois marechais mais velhos da Europa, vc acha que vou traí-lo?”.  Já tinha traído, em Lisboa seu representante pessoal, General Castellano, estava negociando a mudança de lado com os Aliados. Em 3 de Setembro é assinado o Acordo pelo qual a Itália sai da aliança do Eixo com os alemães e passa a ser aliada dos anglo-americanos, manobra que já tinha feito na Primeira Grande Guerra.

Em 8 de setembro de 1943, a Radio de Algiers comunica ao mundo que a Itália agora era aliada dos americanos, o Rei e Badoglio fogem de Roma para Brindisi, já sob controle dos Aliados e passam a governar a Itália de lá.

Os alemães ficam furiosos e deslocam duas divisões para ocupar Roma, ficaram com o controle da cidade por 270 dias.

O Rei e Badoglio imploraram aos americanos para ocupar Roma antes dos alemães, havia tempo, duas semanas em que Roma ficou sem tropa alemã. Mas Eisenhower alegou que não havia condições, só o plaejamento dessa operação levaria dois meses. Os alemães eram ótimos improvisadores, ocuparam Roma sem planejamento.

Hitler pensou em ocupar também o Vaticano, mas foi alertado pelo Embaixador alemão junto ao Vaticano, Diego Von Bergen, que lá estava há 22 anos, que o custo não valeria a pena, o Vaticano não tinha valor estratégico e o preço moral que a Alemanha pagaria seria altíssimo. Os alemães então respeitaram a soberania do Estado do Vaticano e não transpuseram a risca no chão da Piazza San Pietro. Além disso o Papa Pio XII era um neutro ligeiramente pró-alemão e não seria lógico importuná-lo e perder sua simpatia.

Seguiu-se a libertação de Mussolini pelos alemães numa operação espetacular chefiada pelo lendário Coronel SS Otto Skozerny e com esse resgate do líder fascista, criou-se a República Social Italiana que governaria o Norte da Itália com Mussolini como Chefe de Estado de fachada mas sob total controle alemão, a chamada “República de Saló”.

Os Aliados conseguiram ocupar Roma sem batalhas, estrategia alemã na Itália era recuar em boa ordem sem perder tropas em batalhas frontais. Antes, em Julho de 43, os americanos bombardearam o bairro de San Lorenzo, onde havia grandes pátios ferroviários e armazéns, causando perdas de vidas de 1.500 e grande estrago, desrespeitando a convenção de manter Roma como cidade aberta.  Foi um erro, não havia valor estratégico e o Papa foi ao local para dar conforto aos habitantes.

 

A natureza das batalhas no teatro italiano foi muito diferente das lutas no Norte da Europa, a Alemanha terminou a guerra em Abril de 1945 com um milhão de homens em boa formação e com bastante equipamento no Norte da Itália, que renderam-se por um acordo muito bem negociado por Allen Dulles com o Comandante de todas as tropas alemãs no Norte da Itália, General SS Karl Wolff, visando evitar uma rendição alemã aos parteggiani comunistas o que daria muito poder no pós guerra ao Partido Comunista Italiano, o mais forte da Europa Ocidental. A rendição das tropas alemãs foi negociada na Suíça pessoalmente entre Dulles e Wolff, que recebeu garantias americanas de proteção, Wolff era o 2º homem na hierarquia da SS, depois de Heinrich Himmler e de fato não foi processado em Nuremberg, sobrevivendo até a década de 70 como prospero consultor empresarial. Todo esse episódio da rendição de Abril de 1945 já contei aqui em artigo.

O GENERAL CASTELLANO aperta a mão do General Eisenhower, Comandante Geral dos Aliados na Europa  ao fechar o acordo pelo qual a Itália muda de lado, atrás o General Walter Bedell Smith, chefe do Estado Maior do Comando Aliado na Europa.

Andre Motta Araujo

Advogado, foi dirigente do Sindicato Nacional da Indústria Elétrica, presidente da Emplasa-Empresa de Planejamento Urbano do Estado de S. Paulo

12 Comentários

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    1. É realmente incrivel mas

      É realmente incrivel mas foram circunstancias historicas diferentes em cada caso e que pela logica fez a Italia trocar de alianças.

  1. Podcast Hardcore History

    Sr. Araújo,

    textos sempre interessantes e bem escritos. Obrigado.

    O senhor conhece o podcast de história americano Hardcore History de Dan Carlin? Menos abrangente que um livro evidentemente mas muito empolgante como os programas antigos de rádio. Acabo de ouvir a série sobre a Frente Russa da Segunda Guerra que vale muito a pena.

    Feliz 2016!

  2. Sunrise and Guido Zimmer

       Caro AA, vc. deve conhecer estes textos, bastante interessantes sobre as operações da OSS, relativas a rendição italiana *, e os que não conhecem, não precisam ter “medinho” de acessar documentos desclassificados oriundos da CIA , são história apenas, não vão infectar seu computador.

        http://www.stephenhalbrook.com/law_review_articles/sunrise.pdf

       www.archives.gov/ing/declassified-records/rg-263-cia-records/rg-263-zimmer.html

        * rendição italiana : A segunda delas, a negociada por Wolff na Suiça, envolvendo as forças alemãs e remanescentes das de Saló a elas adidas, alem de representar a rendição do Norte da Italia, tambem tinha como parte importante, a liberação do todo o Grupo de Exércitos C alemão ( o Sudeste europeu ), que ocupava a Iugoslavia.

       

    1. Meu caro Junior, vc sempre

      Meu caro Junior, vc sempre presente e com contribuições valiosas aos meus artigos. De fato a rendição de 30 de abril de 1945 teve repercussões a longo prazo na politica italiana do pós guerra e foi o batisma de fogo de onde saiu a CIA.

      Abaixo meu artigo anterior sobre essa rendição. O Allen Dulles foi personagem central, um aventureiro de filme, amante da Rainha Frederica da Grecia e de muitas outras mulheres, completamente diferente de seu irmão carola, o Secretario de Estado de Eisenhower, John Forster Dulles. Eles tinham um primo Cardeal nos EUA que fez a fundamental ponte com o Vaticano e que no desdobramento financiou o Vaticano no pós guerra através da Arquidiocese de Chicago, que enviou a Roma o Bispo Marcinkus para abrir um banco visando receber o dinheiro, que viria a ser o Istituto della Opera Religiosi, o chamado “Banco do Vaticano”. Com esse financiamento criou-se a base politica do Partido Democrata Cristão para dar combate ao fortissimo Partido Comunista Italiano de Palmiro Togliatti.

      https://jornalggn.com.br/noticia/onde-nasceu-a-cia-a-rendicao-alema-na-italia-por-andre-araujo

      1. ” Uomini de fiducia ” und “Kirchensteuer”

           Carissimo,

           A grande maioria das pessoas, nunca ouviram falar destes ” principes ” italianos, os 3 sobrinhos de Pio XII : Carlo, Marcantonio e Giulio, ou do irmão do Papa Pio XII, o grande advogado, diplomata e politico, Francesco Pacelli, o qual junto com seu irmão, ainda Cardeal Pacelli ( Secretario de Estado do Vaticano ), teceu o Tratado de Latrão com Mussolini.

            ” Tutti uomini de fiducia “, mas nunca podemos esquecer, do maior de todos, perto do qual Marcinkus foi um mero aprendiz, comparavel a um mafioso –  o Cavaliere Comendadore Bernardino Nogara, o homem que fez a fortuna do Vaticano.

            Kirchensteuer : Trata-se de uma legislação alemã pós unificação ( 1870 ), a qual, ainda hoje, todo alemão que declare sua religião no imposto de renda – existe a opção ” sem religião ” – contribui diretamente a denominação a qual se declara, o dinheiro passa pelo Estado, mas reverte-se a Igreja/denominação, representa de 8 a 10% do total arrecadado pelo Estado Alemão.

             Durante a II GM, a arrecadação vaticana na Alemanha, pulou em 1939 de US$ 43 Milhões, para seu apice em 1943 de quase US$ 100 milhões.

  3. Fort Drum – NY

        Quando em qualquer comentario, artigo, noticia, referente ao Teatro do Mediterraneo na 2a GM, e nele incluido o sub-teatro italiano norte, o do 5o Exército, o teatro das “altas montanhas e do frio “, da escalada dos Apeninos, da emiglia-romagna até a fronteira austriaca ( Brenner ), nós brasileiros devemos lembrar da FEB – nossos “esquecidos” – cuja sede atual, no Rio de Janeiro, da Associação dos Veteranos da FEB ( Casa da FEB ), está para ser despejada, e todo acervo dela, ser destinado a Diretoria de Patrimonio Histórico do Exército, uma organização, que após a guerra, os colocou a parte, quase os denegriu, devido as condições da politica nacional dos anos 40 até 80.

         O porque do Fort Drum ?

         É a sede da 10th Divisão de Montanha do US Army, e se alguem quiser conhecer o que foi a Campanha do Norte dos Apeninos, e do Vale do Rio Pó, as dificuldades encontradas, por uma tropa especializada em montanha/frio/neve, nas condições do pior inverno já encontradas em combate, vá até o museu desta unidade, e nele irá encontrar, as “bandeiras” ( brasileiras* ), petrechos, flamulas, da  ” 1st Brazilian Infantry Division “, e principalmente : respeito

         * Dayton / Ohio : É a sede de uma das maiores bases aereas da USAF, onde fica seu museu ( Wright Patterson AFB/USAF Museum ), e nele se encontra o monumento ( americanos adoram monumentos ), dedicado ao 350 th FG ( Grupo de Caça ), que fez a Campanha da Itália na 2a GM, e do qual nosso esquadrão ( 1o Grupo de Aviação de Caça ), foi componente, como na terminologia americana, identificado como 1st Brazilian Fighter Squadron, um dos poucos esuqadrões não americanos ( acho que são 4 ), que receberam a maior condecoração coletiva americana, a ” Presidential Citation Order “. Portanto, neste monumento, obrigatoriamente – pela doutrina americana – tem que ter sempre uma bandeira brasileira. E as vezes, quase sempre, nosso embaixador, ou mesmo um consul, não enviou uma simples bandeira, e imaginem o que devia ser dificil conseguir uma bandeira brasileira em Ohio, ou no “cú” gelado de Nova York ( caso do museu montanhês da 10th ).  Americanos “adoram” alem de monumentos, bandeiras.

         Quem quiser colaborar com a “Casa da FEB ” : ( 021 ) 2262-3609 ( a unica unidade, tamanho de Divisão, multiétnica, a combater no Teatro Europeu e Asuático, a UNICA não segregada do 5o Exército Americano ).

  4. Meu avô Antonio me contou

    Meu avô Antonio me contou esse episódio e me revelou que Mussulini e a sua amante foram capturados pelos partisans que os enforcaram, ela inlcusive ficou pendurada de cabeça. Diz a lenda que uma senhora deu 5 tiros nele depois de enforcado, um para cada filho perdido na guerra.

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