O mercado editorial brasileiro pode estar em risco

Jornal GGN – A Amazon anunciou o início da operação de vendas de livros físicos no Brasil e diversos autores, editores e leitores já comemoram a perspectiva de preços baixos. No entanto, o mercado nacional deveria estar atento às praticas comerciais da gigante americana, que muitas vezes sucateia os preços dos produtos para canibalizar a concorrência.

Enviado por Gilberto Cruvinel

Amazon no Brasil e nosso sorriso de desespero

Rodolfo Viana

Do Brasil Post

Ontem (21), quem entrou no site da Amazon foi recebido com a seguinte mensagem do CEO da empresa, Jeff Bezos:

Sim, a Amazon começou a vender livros físicos no Brasil, mercado que movimentou mais de R$ 5 bilhões em 2013, de acordo com O Estado de S.Paulo.

Seguindo a nota de Jeff Bezos, são mais de 150 mil títulos em português à disposição do leitor — “este número é praticamente o total de livros físicos brasileiros em catálogo”, ressalta o PublishNews. Todos com frete grátis para compras acima de R$ 69; muitos com superdescontos, como os próprios autores apresentaram em posts do Facebook.

Roberta Machado, diretora comercial do Grupo Editorial Record, comemorou o início da operação. Em declaração ao Brasil Post, ela afirmou:

“Estamos animados com a entrada da Amazon [no mercado de livros físicos] no Brasil. Acreditamos que o leitor brasileiro vai curtir todas as novidades e tecnologias que a Amazon está preparando para o lançamento, e nossa torcida é para que essa boa experiência de compra estimule mais leitura e maior bibliodiversidade”.

Autores felizes, editores felizes, leitores certamente felizes… Afinal, quem não sorriria diante da possibilidade da popularização da leitura que os baixos preços proporcionam?

Entretanto, este sorriso pode ser de desespero em algum tempo.

Durante a 24ª convenção da Associação Nacional de Livrarias, o vice-presidente da instituição, Augusto Mariotto Kater, mostrou preocupação. “Não somos contra a Amazon vir para cá. Somos contra a canibalização que a Amazon faz com mercados sem regulamentação”, disse, conforme reportagem da Folha de S.Paulo.

Essa canibalização pode ser traduzida em preços apelativos. É uma prática comum da Amazon ignorar até mesmo o lucro e baixar o preço de um livro ao extremo, a fim de destruir a concorrência. Assim, ao passo que desbanca livrarias (sejam elas grandes cadeias ou pequenas lojas de esquina), torna a editora cada vez mais sua refém. Em seguida, oferece à editora um contrato “draconiano” (palavras de um amigo que trabalha no mercado livreiro e pediu anonimato) e, se a editora não aceita os termos — que podem incluir descontos absurdos —, a Amazon usa táticas punitivas. Uma delas é se recusar a listar os livros da editora, como afirma o Boston Review.

Este comportamento tem feito muitos desafetos. Oren Teicher, presidente da American Booksellers Association, é um deles. De passagem pelo Brasil para participar do 5º Congresso Internacional do Livro Digital, promovido pela Câmara Brasileira do Livro, ele comentou a’O Globo o início das operações da Amazon:

“Eles têm uma longa história de pressão sobre os editores para fazê-los seguir seus termos de negócio. (…) Sei que os grandes descontos são atrativos para o consumidor. Mas a longo prazo eles têm um impacto bastante negativo no mercado. Ao pressionar o preço do livro, cria-se um ambiente editorial inviável. Fica até mais difícil para um novo autor se estabelecer no mercado. A Amazon mostrou se preocupar consigo própria e não com a economia do livro como um todo.”

Em suma, a Amazon não apenas aniquila a concorrência (o que é aceitável no mercado), mas também passa a controlar até mesmo a cadeia de produção — inclusive, em entrevista ao site da Veja, o diretor-geral da Amazon no Brasil, Alex Szapiro, já falou sobre “baixar os preços de produção”.

Esperam muita resistência das editoras brasileiras, que podem se sentir ameaçadas pelo impacto que a Amazon deve causar, algo que costuma dar início a novelas parecidas com a que ocorre agora com a francesa Hachette [grupo editorial com quem a Amazon travou uma batalha depois de exigir descontos impraticáveis e, diante da recusa, dificultar o acesso de consumidores aos produtos da empresa]?

Jogamos no mesmo lado das editoras. Queremos satisfazer os dois clientes do mercado editorial, os leitores e os escritores. O objetivo comum é dar ao primeiro a opção de ler como quiser, seja no digital ou não, e quando quiser, com facilidade. Somos agnósticos nesse mercado, pensamos que o leitor tem de ter todas as opções à sua frente. Para o escritor, ajudamos a distribuir a obra. É ainda vantajoso para a editora de outras formas. Além de baixar os preços de produção, ter, por exemplo, o e-book disponível a todo momento é uma forma de as empresas não sofrerem com estoques esgotados, ou com o retorno de exemplares não vendidos.

É um sinal preocupante, pois o cenário proposto por Szapiro não considera que, no País, os impostos diluídos na cadeia de produção representam aproximadamente 15% do valor final de um título — as gráficas nacionais, por exemplo, recolhem 9,25% na impressão de livros, e muitas editoras chegam a optar pela impressão fora do Brasil, em países da Ásia, conforme relatei no artigo Não há incentivo à leitura sem corte de impostos. Desta forma, como as editoras poderiam “baixar os preços de produção” continua um mistério.

Enquanto escritores e editores saúdam a Amazon no Brasil, lá fora existe um inferno em curso: na Alemanha, 1188 autores fazem abaixo-assinado contra a gigante de Jeff Bezos; antes disso, o mesmo aconteceu nos EUA, com mais de 900 escritorespara proteger o mercado local, o senado francês aprovou, em junho, a “lei anti-Amazon”, que proíbe o frete grátis e limita o desconto do varejista a 5%.

Será que devemos mesmo ficar felizes com a Amazon aqui?

 

Redação

13 Comentários

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  1. Interessante…

    Essa polêmica na França eu já ouvi falar… Desde que eles consigam quebrar as operações online da Saraiva, e sua péssima consideração para com seus clientes, dou-me por satisfeito.

      1. mural das lamentações da Tainara…

        … faz três semanas de saco cheio que aguardo retorno da Livraria Saraiva do livro Salazar – Biografia Definitiva, de Filipe Ribeiro de Meneses, Editora Leya, que comprei eletronicamente no site da Saraiva.com, na bacia d’almas por R$. 9,90 frete free, mas cadê? o livro no local de entrega logisticamente combinado com a Saraiva.com… (estive clandestinamente no ponto combinado, na hora combinada, com roupa e senha tudo combinando e nada do emissário portador da Livraria Saraiva aparecer na multidão do shopping…) cadê? noticia do livro comprado na confiança fio do bigode e cadê? notícias do próprio Salazar e família… solicitadas à Livraria Saraiva com ponto sem ponto do velho salazarista cartório livreiro nacional… busquei informação na Editora Leya que me garantiu que o livro existe fisicamente – eles, lá na Editora Leya, o conhecem de pegar nas mãos e vê-lo com os próprios olhos – , está em catálogo e que foi distribuido para estoque just in time da Livraria Saraiva.com… me garantiram também que o ditador Salazar existiu e existe ainda nas velhas lembranças do povo lusitano… por fim, Leya me garantiu que Portugal existe firme e forte no mesmo lugar na Península Ibérica espremido encurralado na “faixa de gaza europeia” entre o poderoso portentoso Império Espanhol e o Mar Tenebroso do Atlântico…já Saraiva.com, creio eu, só existe no espaço virtual publieditorial fake second life pega ladrão…já o meu rico dinheirinho já foi processado no cartão não tem comparação…

  2. A crise Brasileira está impossível

    Até no mercado de livros, considerado supérfluo, os gringos querem entrar. A mídia Porca está parecendo cachorro chupando manga!

  3. Socorro!

    Precisamos nos defender desses gringos que querem vender livro barato!

    Precisamos da lojinha da esquina que vende por 100 pilas um livro que na internet custa 50.

  4. Tesoura!

    Até que esta história termine numa Solange Hernandes digital?

    Revisitemos contextualizando, para muito além do mercado, este instrumento usado durante a ditadura civil-militar do Brasil.

    Os jornais, revistas  e demais meios de comunicação de  então são os dados que nos baseiam em tal reflexão.

    Quem nos garante que não?

  5. livros importados

    Compro na Amazon a mais de 15 anos.

    Livros técnicos que aqui chegam por preços absurdos. Lembrando que a importação de livros não paga impostos,  porque os importados são tão caros aqui?

  6. Tenho meu livro na Amazon

    Prezados,

    Minha experiência em escrever um livro (Nascer Várias Vezes) me levou a vendê-lo através da Amazon (ebook) e fazer uma autopublicação no livro físico.

    Sei o preço de cada fase de produção de um livro. E posso dizer: o preço cobrado é totalmente abusivo.

    Para quem quiser conhecer meu livro:

    Leia gratuitamente uma amostra do livro Nascer Várias Vezes:  http://www.amazon.com.br/dp/B009VIECAQ  Leia o sumário do livro. Clique aqui http://www.nascervariasvezes.com/p/o-livro.html att, Regis Mesquita

  7. A questão é que a Amazon vê

    A questão é que a Amazon vê sangue na água e ataca, simples assim, com toda a força que seu poder econômico, no quadro atual o que se vê é um série de publicações a preços exorbitantes, principalmente literatura tècnica, o que deixa o flanco aberto para a gigante.

    Sinceramente eu menos preços, assim como os consumidores em geral. E sim, isso vai custar o sangue de alguém… 

  8. Tudo como dantes

    Se ela for seguir cobrando a facada que cobra pelos livros digitais (por Deus, é um mero arquivo!!! – nenhum, absolutamente nenhum deles poderia superar o preço de dez reais), o mercado editorial brasileiro não precisa se preocupar muito.

  9. Tem gente que pode ficar
    Tem gente que pode ficar chocado mas a verdade é que este assunto é irrelevante pois o mercado de livros de papel está para acabar.

    Eu ainda os tenho. Estão tomando poeira.

    Já li 8 livros no meu smartphone. Posso dizer que com certeza, acabou!

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