Por que rimos no filme “Iron Sky – The Coming Race”?, por Wilson Ferreira

"Em 2012, o filme “Iron Sky” (em português “Deu a Louca nos Nazis”), produzido através de crowdfunding, foi um fenômeno cult"

Em 2012 o filme “Iron Sky” (em português “Deu a Louca nos Nazis”) foi um fenômeno cult: produzido através de crowdfunding, ganhou uma legião de fãs. Mais uma vez, com o financiamento coletivo dessa legião de adeptos, o diretor finlandês Timo Vuorensola fez a sequência “Iron Sky – The Coming Race” (2019) – um pastiche alucinado sobre uma base nazista secreta no lado oculto da Lua, Teoria da Terra Oca, Atlântida, Ocultismo Nazi, energia esotérica do Vril, conspirações reptilianas na política etc.  Um humor que chega às raias do non sense. Porém, o que torna tudo tragicômico é que a maioria das ideias inverossímeis de “Iron Sky” foram retiras das doutrinas que inspiraram grupos radicais políticos do início do século XX que culminaram no nazi-fascismo, Segunda Guerra Mundial e Holocausto. “Iron Sky” virou um cult imediato porque arranca seu humor da atual onda anti-intelectualista criada pela chamada “direita alternativa” (“alt-right”), na qual a Teoria da Terra Plana é o seu principal hit de sucesso.

“Rimos para o fato de que não há nada de que se rir”
(Adorno e Horkheimer)

 

Historicamente a extrema-direita nunca teve uma ideologia no sentido stricto sensu, isto é, como visão de mundo estruturada que orienta a teoria e práxis política e econômica. Muito diferente da direita liberal, cujas ações estão assentadas nos ditames clássicos do liberalismo econômico e político.

Visando a conquista imediata das massas, a extrema-direita sempre foi essencialmente anti-intelectualista, criando pastiches ou simulacros de ideologias. Por exemplo, na atualidade a extrema-direita se apega a mitos exóticos como a Terra Plana e a corrente esotérica moderna da chamada Magia do Caos – sobre isso, clique aqui.

Enquanto no passado, a doutrina nazista se baseou num pastiche de mitologias ocultistas e esotéricas como o mito da Terra Oca, os super-seres da Atlântida, o mito da energia Vril e uma amálgama resultante do crescimento explosivo de doutrinas espiritualistas e grupos radicais europeus no final do século XIX.

                  Daí para pular para as teorias pós-guerra como a existência de bases secretas nazistas na Antártida (onde haveria uma abertura para os mundos subterrâneos – Hiperbórea) de onde vem os discos voadores movidos pela misteriosa energia do Vril, foi um passo. Mais ainda: até a suposta existência de uma base secreta nazi no lado oculto da Lua…

Foi baseado nessas, por assim dizer, “teorias exóticas” que só ganharam força com a Internet, que o cineasta e ator finlandês Timo Vuorensola produziu em 2012 o filme Iron Sky (em português, “Deu a Louca nos Nazis”). Produzido através de crowdfunding, o filme criou uma legião de fãs e adquiriu a aura “cult” – filme já analisado pelo Cinegnoseclique aqui.

Um mix maluco de Independence Day, Star Wars Wag The Dog– “Mera Coincidência”, em português.

Sete anos depois, novamente pelo mesmo método de financiamento, Timo Vuorensola produziu a continuação: Iron Sky – The Coming Race (2019).

Os super-seres da Terra Oca

                  Em 2012, Iron Sky a companhava astronautas dos EUA (enviados para a Lua por uma hilária versão de Sarah Pallin como presidenta) para descobrirem uma base nazista no lado oculto, construída durante a Segunda Guerra Mundial e para onde fugiram Hitler e seu staff. Em busca da reeleição, Pallin terá que enfrentar o plano nazi de invasão da Terra. Os países tentam se reunir para enfrentar a ameaça (naves espaciais nazis que parecem gigantescos zepelins) mas tudo resulta em caos e guerra nuclear global – os nazis despertaram a cobiça de muitos países por possuírem uma rara fonte de energia inesgotável: o esotérico Vril.

Dessa vez, o diretor foi ainda mais fundo nas seminais origens das teorias do chamado “ocultismo nazi”: baseou-se no romance de 1871 “The Coming Race” do escritor Edward Bulwer-Lynton – um adepto do Rosacrucianismo, ocultismo e Teosofia de Madame Blavatsky. Uma espécie de “Viagem ao Centro da Terra” de Julio Verne com muito esoterismo.

No romance a terra é oca e seu interior é habitado pelos Vryl-ya, super-seres antediluvianos que viviam numa versão da Atlântida. Possuem o Vril, cujos poderes incluem a capacidade de curar qualquer coisa, criar seres e também com imenso poder destrutivo – não precisa ir muito longe para adivinhar que o ocultismo nazi acreditava que a raça ariana era descendente desses super-seres e que o Vril seria a energia que derrotaria os Aliados. Daí as teorias de que Himmler e a SS buscavam a todo custo ferramentas ocultistas (em expedições ao Egito e Himalaia, por exemplo) para poderem manipular essa energia.

                 Claro, nessa continuação de Iron Sky, os nazis remanescentes se protegeram da hecatombe nuclear escondendo-se no interior de Terra e, mais uma vez, ameaçam a todos com essa energia misteriosa e destrutiva.

O Filme

Como era previsto, essa continuação de Iron Sky está sendo massacrada pela crítica especializada. Principalmente pelo fato de que agora está difícil para o espectador suspender a incredulidade e embarcar na loucura. As situações são muito inverossímeis e superam o surrealismo da versão original.

Parece que a crítica não compreendeu o pressuposto do humor de Iron Sky: como superar ficcionalmente através do gênero comédia, teorias que fundamentaram (e, talvez, ainda fundamentam) grupos políticos radicais que, por si mesmas, já são inverossímeis e surreais?

No fundo é a mesma questão literária levantada pelo escritor underground Charles Bukowski – como a imaginação literária pode representar uma realidade que parece mais louca e surreal do que a própria ficção?

Para complicar, Iron Sky – The Coming Race conecta ainda tudo isso com a teoria dos “reptilianos”, supostos verdadeiros donos do poder mundial com a sinistra estratégia de colocar suas versões humanas em postos-chave dos governos.

Tudo ocorre em 2047. A Terra foi destruída pela guerra nuclear e milhares de humanos remanescentes conseguiram migrar para a base lunar nazi abandonada. São liderados por Renate (Julia Dietze), mas sua filha chamada Obi (Lara Rossi) é quem realmente governa. Além de narrar em voz over toda a trama.

                   O alimento está racionado e a base é ameaçada por constantes terremotos lunares. Até Obi se deparar com o Reichfüher Kortzfleicher (Udo Kier) que secretamente chegou à base. Ele revela a existência do Vril, fonte de energia que poderá ser a salvação da base lunar.

Então, formando uma equipe de personagens disfuncionais hilários, pegam um disco voador nazi caindo aos pedaços pilotada pelo russo Sasha (Vladimir Burlakov) para retornarem à Terra e penetrar no mundo interior – o lar de ferozes dinossauros e nazistas reptilianos – os “Vril-Ya do romance de Edward Bulwer-Lynton.

Lá encontrarão chocantes revelações: os Vril-Ya adquiriram poderes telepáticos para se comunicarem e adestrarem os dinossauros, além de secretamente alterarem os padrões da evolução humana na História ao colocarem versões reptilianas de importantes líderes como Margaret Thatcher, Hitler, Osama Bin Laden e Gengis Khan.

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Redação

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