Alimento orgânico ou agroecológico? Entenda a diferença entre os modos de produção

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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Produtores na Feira da Reforma Agrária / Divulgação

Produtores na Feira da Reforma Agrária - Créditos: Divulgação

do Brasil de Fato

Alimento orgânico ou agroecológico? Entenda a diferença entre os modos de produção

3ª Feira Nacional da Reforma Agrária oferece produtos variados e saudáveis; objetivo é fortalecer a agroecologia

Brasil de Fato | São Paulo (SP)

A 3ª Feira Nacional da Reforma Agrária, organizada pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e que acontece até domingo (6), em São Paulo, comercializa três tipos de produtos: agroecológicos, orgânicos e em transição. Mas qual a diferença entre essas classificações de alimentos?

Não se trata apenas das características do produto final, mas também da forma como está organizada cada etapa da produção, desde a escolha do local e das sementes até a condição dos trabalhadores do campo.

Para ser considerado orgânico, basta que não tenham sido utilizados agrotóxicos na plantação, sem levar em conta o envolvimento e as condições de trabalho dos agricultores, a compatibilidade das culturas em relação ao ecossistema local e o nível de industrialização de todo o processo.

O alimento orgânico, portanto, embora mais saudável que o modelo normal de produção do agronegócio, não envolve a mesma responsabilidade social e ambiental que o movimento da agroecologia, defendida pelo MST. 

Agroecologia

“O produto agroecológico, que é a produção que defendemos no Movimento Sem Terra, é um produto diferenciado desde a origem”, explica Milton Fornazieri, do setor de produção do MST. “Todo produto agroecológico é certificado, tanto pelos certificadores tradicionais, como o Instituto de Mercado Ecológico (IMO), como pela certificação comunitária, que é feita por organizações a partir da origem de onde é produzido”, completa.

Para conquistar o certificado de acordo com a legislação brasileira, a cadeia produtiva do alimento precisa seguir os critérios descritos na lei 10.831, sancionada em 2003 pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que, naquele mesmo ano, havia lançado o programa Fome Zero.

São critérios da lei, entre outros, que o processo de produção seja isento de contaminantes intencionais (agrotóxicos); que realize a preservação da diversidade biológica dos ecossistemas em que se insere o sistema de produção; o uso saudável do solo, da água e do ar; e a reciclagem de resíduos de origem orgânica, reduzindo ao mínimo o emprego de recursos não-renováveis.

Os assentamentos do MST considerados em transição, portanto, preparam-se para evoluir de um modo de produção similar ao do agronegócio industrial para o orgânico, e do orgânico em direção à produção agroecológica.

Ecossistema

Uma das principais diferenças entre o selo orgânico e o agroecológico é o fator humano: o primeiro já foi absorvido pelo agronegócio capitalista, e pode ser produzido inclusive em latifúndios quase completamente mecanizados, com pouco ou nenhum envolvimento dos trabalhadores e trabalhadoras do campo, transferidos, nesse sistema, para os centros de processamento dos produtos.

Já a agroecologia promove o resgate de técnicas pré-industriais que ainda vivem por meio da agricultura familiar e que são menos agressivas aos ecossistemas, aliados ao conhecimento científico moderno de análise das águas e do solo, assim como dos hábitos e necessidades da fauna local.

Na agroecologia, o rodízio de culturas, por exemplo, segue a lógica da alimentação da família produtora, e não o planejamento financeiro dos grandes fazendeiros; assim, a produção é mais diversificada e permite que o solo retenha nutrientes.

“O agronegócio diz que tem condições de resolver o problema de uso de veneno na agricultura, mas nós achamos que isso não é verdade. Quem consegue fazer realmente um produto agroecológico é quem está no dia a dia, na pequena propriedade, no lote da reforma agrária. Não é só um trator, uma máquina, que faz a agroecologia. É a sua relação com a terra e dar para a terra aquilo que ela precisa”, explica Fornazieri.

Preços

O agronegócio se aproveitou também do grande interesse despertado pelo debate público sobre alimentação saudável para encontrar forma de aumentar o lucro: embora a produção orgânica envolva um modo de produção diferente, não há necessidade de que o produto seja necessariamente mais caro. Os assentamentos da reforma agrária, por exemplo, se esforçam para equilibrar os custos e não pesar a mão no preço final do alimento.

“Ainda existe muita deturpação com relação à questão do preço do produto orgânico e agroecológico. Quem realmente produz para o mercado, para ter lucro, acha que só porque produz orgânico tem que cobrar mais e explorar o consumidor. Nós estamos em um processo de discussão grande de que o preço tem que ser justo tanto para quem produz quanto para quem consome. Se é necessário aumentar o custo com relação ao modelo convencional do agronegócio, não pode ser um processo de exploração como fazem essas grandes fazendas de orgânicos que estão espalhadas pelo Brasil”, disse Fornazieri.

Edição: Diego Sartorato

 

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

2 Comentários

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  1. A própria política de preços dos combustíveis favorecerá …….

    A própria política de preços dos combustíveis favorecerá a produção familiar contra a industrializada.

    Há um fator que poucos levam em conta, a produção familiar no campo é uma produção economizadora de energia, ou seja, substitui-se parte das atividades mecanizadas e agressivas aos próprios produtos, por atividades em que o próprio agricultor consegue através de trabalhos simples, mas com uso intensivo de mão de obra substituir o agronegócio.

  2. A ordem é matar
     

    Dia destes  estava assistindo  a  uma reportagem sobre alimentos orgânicos, seu cultivo e a carga de impostos que sobre eles incidem.

    Fiquei com uma sensação de surpresa e mal estar  quando fizeram a comparação.

    Não que a gente não saiba do favorecimento às grandes nacionais e às  multinacionais alimentícias,  mas carga tributária que o alimento orgânico sofre, comparativamente ao do plantio com agrotóxicos, ou com os alimentos processados, é assustadora.

    Cerca de 30 a 40% do preço do alimento orgânico é tributo (daí pra mais)

    Enquanto uma coca ou dolly pagam cinco por cento ou dois por cento, ou nada, assim como chips e essa lixaiada que o povo consome, o alimento saudável é cada vez mais caro porque seu cultivo é   deliberadamente dificultado, bem como sua distribuição.

    Tudo o que faz mal, engorda, adoece, é estrangeiro, contaminado, transgênico, recebe incentivos diretos ou indiretos do poder público, além de trazer enorme lucro para a cadeia produtiva alimento-doença, que envolve laboratórios, indústrias farmacêuticas,  hospitais, planos de saúde, verbas governamentais, propaganda, farmácias,  e outras vertentes no âmbito da psicologia e da estética.

    O pior disso tudo é a consequencia certa do desenvolvimento das doenças crônicas  causadas pelo consumo desse tipo de  alimentação, que vão desde a desnutrição, até ao câncer, passando pela obesidade, hipertensão, diabetes, doenças autoimunes, as quais  exigem o  uso contínuo de medicação, para  alegria dos “investidores da indústria alimenticia”, farmacêutica  e do agronegócio.

     

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